O mais famoso autor de contos de fadas, La Fontaine não faria melhor. O arquiteto francês Alain Raynaud, responsável pela construção dos encantadores palácios do estilista Valentino na Europa, em poucos dias transformou um terreno no nobre bairro do Morumbi, em São Paulo, em autêntico palácio neoclássico italiano. A decoração, marcada pela sofisticação e grandiosidade, ficou a cargo da designer e socialite nova-iorquina Mica Ertegun, casada com o fundador da gravadora Atlantic Records, nos Estados Unidos, e responsável pelo design interno do Hotel Carlyle, em Nova York, e dezenas de apartamentos em Southampton, o paraíso dos milionários americanos. No interior desse palácio cinematográfico, foram erguidas três grandes tendas. A primeira reproduzia com fidelidade uma sinagoga capaz de abrigar 1,5 mil pessoas confortavelmente sentadas. Em lugar das paredes de alvenaria, cortinas brancas drapeadas com altura de dez metros foram ornadas com dez vitrais de três metros de altura estampando motivos hebraicos. A chupá, local onde tradicionalmente os rabinos abençoam os noivos, foi toda forrada com delicadas heras, as plantas trepadeiras desejadas pelos reis. Na segunda tenda, as falsas paredes lembravam azulejos portugueses e reproduziam com perfeição um amplo terraço. Entre as mesas, foram espalhadas ilhas de plantas que transmitiam um sensação de amplitude e bem-estar absoluto. A terceira e última tenda remetia ao ambiente de uma ampla e sofisticada sala de refeições. Palmeiras gigantescas compunham uma rica decoração tropical.

Foi nesse cenário que na noite da terça-feira 14 realizaram-se a cerimônia e a festa do casamento de Alberto Safra, filho do banquiero Joseph e de Vicky Safra, com Maggy Candi. Uma celebração digna das famílias reais européias. Apenas 1,2 mil privilegiados tiveram a oportunidade de freqüentar por nove horas o palácio neoclássico dos Safra, agora já desmontado. Além de banqueiros, empresários, alguns poucos artistas e bem-sucedidos profissionais liberais do Brasil e do Exterior, a elite política do País foi agraciada com cartões magnéticos, que na recepção da festa eram substituídos pelo número da mesa que deveriam ocupar.

O evento foi marcado para às 19h30, mas uma hora antes já se formava uma fila de reluzentes carros importados conduzindo a nata do PIB brasileiro. Entre eles, algumas vans transportavam parentes e amigos dos Safra recém-chegados de Israel, México e Europa.
Uma delas era ocupada por médicos da família que vieram dos Estados Unidos. Cinqüenta manobristas se movimentavam freneticamente entre os 150 seguranças para agilizar a recepção. Vicky Safra, a mãe do noivo, cumprimentou um a um e, como de costume, impressionou pelo figurino e pelas jóias. Naquela noite, descrita como inesquecível por um dos convidados, trajava um Valentino tomara-que-caia em tom pastel com suaves bordados de prata, colar e brincos de diamantes.

Uma dezena de violinistas embalava os convidados que eram conduzidos até a sinagoga através de um túnel decorado com plantas postas sobre treliças. Seguindo os rituais judaicos, no interior da sinagoga os homens sentaram-se de um lado e as mulheres do outro. No lado masculino, os smokings negros e as gravatas-borboletas impunham um certo ar monotemático. Do outro lado, os colares e brincos da apresentadora Hebe Camargo, como costuma acontecer nas festas que reúnem a elite paulista, rivalizavam com as jóias da anfitriã. Nesse quesito, aliás, Chella Safra e Ana Feffer não deixaram nada a desejar. Havia muitos seguranças e muito para ser protegido. As preocupações com os seqüestros relâmpagos e a violência urbana certamente não eram vivenciadas no palácio montado pelo arquiteto Raynaud.

Exatamente às 20h chegou a noiva. Também com um sofisticado tomara-que-caia branco com rendas bordadas em dourado de Demi Queiroz, o exclusivíssimo estilista paulista que nada produz por menos de US$ 15 mil e que conhece como poucos o refinado gosto da família Safra. Em novembro do ano passado, foi ele o responsável pelo vestido de Alessandra Deweik em sua cerimônia de casamento com Azuri Safra. São vestidos realmente para poucas. Verdadeiras obras de arte que na melhor das hipóteses levam mais de três meses para ser confeccionadas. Tempo grande demais para quem não se importa com quanto terá que gastar para realizar um sonho, mas demasiadamente curto para a maior parte das noivas brasileiras que também sonham com o véu e a grinalda de uma noite inesquecível. Essas, com vencimentos normalmente inferiores a cinco salários mínimos, não têm outra alternativa que não seja o parcelamento do figurino em pelo menos 12 prestações, tempo que levam para pegar os seus vestidos.

Seguida por um cortejo de daminhas tão elegantes quanto a própria noiva, a noiva Maggy caminhou pelo túnel que levava à sinagoga ao som da Marcha nupcial. Na chupá, ao lado do noivo, se colocou diante de quatro rabinos. Três vieram de Israel especialmente para o casamento. O quarto pertence à sinagoga da rua Veiga Filho, em Higienópolis, bairro nobre paulistano. Terminada a cerimônia, um segundo túnel ornado com heras e chuvas-de-ouro na parede e mobiliado com diversos bustos de imperadores romanos em mármore levava os seletos convidados ao ambiente onde foi servido o coquetel. Ali, coqueiros com dez metros de altura sustentavam o salão. No teto branco e bem iluminado, desenhos de araras azuis e periquitos em árvores compunham um cenário tropical. Não houve sequer aglomeração, pois recepcionistas bem treinadas dispunham as pessoas pelas mesas divididas em setores azul, rosa, laranja e vermelho, regadas com saquê, champanhe, vinho, vodica e uísque.

O reeleito governador de Minas Gerais, Aécio Neves, acompanhado pela filha Gabriela e pela ex-mulher Andréa Falcão, é encaminhado para a mesma mesa onde estão o senador José Sarney e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e sua mulher, Ruth. Desinibido e acostumado a festas de pompa, Aécio se mostrou bem à vontade. Não permaneceu muito tempo sentado. O governador mineiro, segundo a colunista Mônica Bergamo, do jornal Folha de S. Paulo, ficou boa parte do tempo em um canto trocando silenciosas idéias com Geraldo Alckmin, o ex-governador de São Paulo, recém-derrotado na disputa presidencial. Um empresário e atento observador do cenário político brasileiro estava na mesa ao lado e comentou baixinho com a mulher: “Os dois estão tramando. Repare como conversam bem longe do Serra”, referindo-se ao governador eleito de São Paulo. Poderiam, é verdade, estar traçando os destinos do PSDB, mas com certeza não tinham na conversa, naquele momento, nenhuma preocupação com a cruel distribuição de renda no País. Também foi registrado pela colunista que, sempre muito preocupado com os rumos da política econômica brasileira, um banqueiro francês que dividia mesa com banqueiros brasileiros não deixou passar em branco a atenção que aquele refinado grupo de pessoas dedicava a Aécio e perguntou a Fernando Henrique quem era aquele cidadão tão cortejado. O ex-presidente respondeu bem a seu feitio: “É o futuro presidente do Brasil.” O banqueiro apenas sorriu.

Terminado o coquetel, novamente as recepcionistas entraram em ação. Agora para transferir os convidados ao salão onde foi servido o jantar. Na terceira e última tenda, todos foram distribuídos em mesas de 12 lugares dispersas ao redor de um enorme espelho d’água ornamentado com 30 pequenas fontes. Durante o jantar, uma orquestra com cerca de 40 músicos animou o ambiente com músicas da década de 60. Coeur de salmon defumado com ovas de peixe, atum, robalo e carnes nobres importadas da Argentina foram oferecidos com fartura. Na sobremesa, agrados para todos os gostos, com ênfase especial aos doces sírios. Entre eles, um dos mais apreciados foi o knefi, uma guloseima coberta com mel que lembra um caprichoso e delicado ninho. Massas folhadas e recheadas com damasco fizeram muito sucesso. Havia também os quitutes brasileiros, que ornavam com o cenário tropical. Desses, o mais procurado foi docinho feito à base de maracujá e coco. Os mais jovens, porém, não abriram mão do chocolate, servido em abundância, junto com noz-moscada. Toda a alimentação ficou a cargo do bufê França, que assegura ter preparado somente pratos kosher, seguindo rigorosamente a tradição judaica.

Enquanto os doces eram servidos, DJs de Saint Tropez responsabilizaram-se pela discotecagem que embalou a festa até as duas horas da madrugada. Quando muitos já se preparavam para sair e alguns já tinham ido embora, caso de Hebe Camargo e de seu sobrinho, a última supresa: um exclusivíssimo show de duas horas da baiana Ivete Sangalo. Um mimo ofertado pelos noivos aos convidados que custou R$ 350 mil, mais as despesas com jatinho executivo e hospedagem nobre para a cantora e sua equipe composta por 28 pessoas. Quanto aos presentes, o casal deixou lista em aberto na loja Mickey, uma das mais tradicionais da elite paulistana. No convite, no entanto, havia uma mensagem tranqüilizadora: “Gostaríamos de reverter seu carinho para uma instituição beneficente de sua confiança.” Só caridade não resolve. O atual governador de São Paulo, Claudio Lembo, referiu-se, em outros tempos, à rica fauna social que esteve presente em peso ao evento dos Safra como uma “elite branca que não conhece as carências do andar de baixo”. Em momentos como esse, a tal elite certamente está com preocupações de outra natureza.