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Na rara foto retirada do álbum de família, Ruben Feffer ao piano acompanha o pai, Max (à esq.) e o avô Leon (centro) 

Um filme de animação brasileiro tem chamado a atenção do mundo para um setor da economia criativa nacional que parece estar avançando a passadas muito largas. “O Menino e o Mundo” tem conseguido algo raro na indústria cinematográfica: unanimidade absoluta de críticas altamente positivas. O filme concebido e dirigido por Alê Abreu é mesmo uma obra que transborda o carinho com que foi produzido. Não há falas. Ao menos que se consiga entender. Por conta disso e da sensibilidade do roteiro e da obra, a trilha, os efeitos sonoros e a música que emolduram as imagens têm um papel ainda mais central do que normalmente já teriam em qualquer filme.

Numa primeira olhada, chamam a atenção nomes já consagrados como os de Naná Vasconcelos e do rapper Emicida, convidados especiais que dão brilho extra ao trabalho. Mas quem observa com atenção os créditos verá assinando a trilha (ao lado do parceiro Gustavo Kurlat) um sobrenome normalmente associado ao noticiário empresarial e ao mundo dos grandes negócios.

Ruben Feffer é o mais novo dos quatro irmãos que respondem por boa parte das ações de uma das mais conhecidas empresas nacionais, a companhia Suzano de Papel e Celulose.

Filho de Max Feffer, que por sua vez é filho do fundador da empresa, Leon, Binho (como Ruben é chamado desde moleque) chegou a trabalhar em vários setores da Suzano ao lado dos irmãos e do pai. Mas sua vocação absoluta para a música o fez deixar as funções na companhia para mergulhar completamente nas composições e nos sons de todos os tipos. Sua produtora musical, a Ultrassom, é hoje uma das boas fontes das músicas especiais que embalam filmes no Brasil. É dela, por exemplo, a trilha e o desenho de som do comentado filme do diretor Fernando Andrade, “Quebrando o Tabu”, no qual Fernando Henrique Cardoso conduz uma longa reflexão sobre as questões em torno da descriminação da maconha. Publicidade e design de som para séries de tevê estão também entre as atividades da empresa que Binho comanda ao lado da esposa, Flavia.

O fato já seria interessante por si, mas se revela ainda mais peculiar quando se descobre que a música perpassa a trajetória da família e corre paralela a uma das mais representativas histórias do empreendedorismo brasileiro que sai do zero e constrói ao longo de três gerações a segunda maior produtora de celulose de eucalipto do mundo e a líder no mercado de papel da América Latina. 

Leon Feffer, o patriarca, trouxe um violino na bagagem quando imigrou da Ucrânia para o Brasil em 1920. Tocar canções folclóricas judaicas nas horas vagas o distraía e animava enquanto se estabelecia como fabricante de artefatos de papel no Brasil. Mais tarde, ensinou seu filho Max a tocar o instrumento. Mas Max preferiu o trompete, que aprendera a tocar sozinho na adolescência, atraído pela rebeldia e pela vida boêmia que o jazz preconizava. Na juventude, ocasionalmente se apresentava em bares da noite paulistana. Quando a Segunda Guerra Mundial terminou, foi para os Estados Unidos estudar na Juilliard School, uma das mais conceituadas escolas de música do mundo. Algum tempo depois, voltou para as atividades empresariais e familiares e juntou-se ao grupo de cientistas contratados pela empresa que buscava encontrar uma maneira de produzir celulose no Brasil. Descobriram que o eucalipto seria a planta que se adaptaria por aqui e assim determinou-se o rumo da fabricação de papel no País.

Max e Betty Feffer tiveram quatro filhos: David, Daniel, Jorge e Ruben. Todos seguiram os passos do pai e foram trabalhar na Suzano. Deles, o que sempre demonstrou uma relação mais especial com a música foi o caçula, Ruben, que aos 28 anos tomou a decisão de se dedicar intregralmente a ela, deixando o cargo na equipe de tecnologia da companhia para criar, em 2001, a sua própria empresa. Desde então, já recebeu alguns prêmios importantes, como o Shell, em 2003, pela trilha sonora da peça teatral “Pequeno Sonho em Vermelho”, da Companhia Linhas Aéreas, composta com o parceiro Gustavo Kurlat, e, também com ele, o de melhor trilha sonora no Festival Internacional de Pernambuco, em 2008, criada para a animação “O Garoto Cósmico”, também de Alê Abreu. Seu prêmio mais recente foi em 2013, pela trilha do longa “Angie”, de Marcio Garcia, no Los Angeles Brazilian Film Festival.

Reportagem Fausto Salvadori Filho 
A coluna de Paulo Lima, fundador da editora Trip, é publicada quinzenalmente