Na terça-feira 14, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, desceu o terceiro andar do Palácio do Planalto como se tivesse a obrigação de calçar as botas, vestir as roupas e colocar sobre a cabeça o gorro vermelho de Papai Noel para oferecer um presente de Natal ao País. Ele carregava em sua pasta várias propostas de mudanças na economia que tinham acabado de ser rejeitadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “O presidente Lula acha que temos que ser ousados”, afirmou Mantega. “Para não corrermos o risco de não crescermos efetivamente a taxas elevadas.” De fato, o pacote foi considerado um fiasco por Lula e sua equipe, insuficiente para garantir a prometida retomada do crescimento. Ainda embalado pelos 58 milhões de votos que o reelegeram, o presidente pediu que o ministro retorne ao Palácio esta semana com algo mais profundo, que garanta um crescimento de 5% ao ano. Noutras palavras, com uma sacola de presente e não apenas um embrulho tecnicista. Mantega entendeu o recado e prometeu encomendar as surpresas aos seus técnicos. Desde já, muitos empresários esfregam as mãos à espera das novidades. “Só o fato de o presidente e seu ministro da Fazenda terem a compreensão do problema do crescimento já é um avanço”, comemorou o presidente da Confederação Nacional da Indústria, Armando Monteiro Filho. “Está na hora de começarmos a andar. Esperamos um plano consistente.” A CNI defende uma “agenda inteligente”, que combine desoneração de investimento, redução dos impostos e desburocratização. A frieza demonstrada por Lula ao receber o pacote de Mantega tem sua razão de ser. O ministro apresentou um conjunto de medidas que garantem aumento da arrecadação, mas nada que aponte para a retomada do crescimento. O plano apresentado por Mantega inclui oito sugestões. Na lista, imposição de gastos de pessoal para controlar a sanha dos Três Poderes por aumentos salariais, criação de um redutor para despesas correntes e medidas de desoneração tributária. Para a indústria, há medidas que, se aprofundadas, sinalizam para o crescimento da economia, exemplo da ampliação da lista de bens de capital com isenção de IPI, Cofins e PIS. Mantega falou em “redução” da CPMF para setores que impulsionam o crescimento. Nada de extinção, ainda, de um imposto que tem a palavra provisório no nome. O presidente Lula quer em sua mesa medidas que não apenas sinalizem para o crescimento de 5%. Ele quer medidas que efetivamente garantam os 5%. Por isso, pediu a Mantega que encontre medidas que garantam investimentos em grandes obras de infra-estrutura. O ministro tem ficado acordado até mais tarde para aprofundar as medidas de seu pacote. Lula quer o envolvimento não apenas dos Três Poderes em torno do ajuste fiscal e do crescimento. O presidente quer um pacto geral com o Congresso e com os Estados, rumo ao crescimento. Ao longo da semana, Mantega começou uma costura de articulações com governadores, para tentar aumentar a capacidade financeira dos Estados e aprofundar a reforma tributária. É bom que o governo apresente mesmo uma proposta de reforma tributária consistente. A oposição promete reagir a quaisquer mudanças rasas. “Toda reforma tributária que apresentaram até agora é paliativo para resolver o problema da arrecadação”, diz o líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ). “Reforma paliativa só para ter a CPMF e a DRU não terá apoio do PFL.” A oposição costura apoio para acabar de vez com a CPMF. Rodrigo acha que é hora de o governo parar de apresentar um cardápio vasto de medidas, algumas até boas – como a ampliação da lista de bens de capital com isenção –, mas sem mexer na estrutura econômica de um país com uma das maiores cargas tributárias do mundo. “O governo sempre coloca docinho para enganar”, reclama o deputado. Mantega terá de convencer também os estudiosos pagos pelo Ministério do Planejamento que é possível crescer 5% ao ano. Esta semana, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) desengavetou um estudo feito antes da campanha eleitoral, mas guardado a sete chaves para não atrapalhar a arrancada de Lula. O calhamaço mostra as duas principais restrições para o crescimento. Em primeiro lugar, a falta de investimento no setor elétrico. Hoje, o setor garante uma expansão anual da economia de no máximo 4%, até o fim do segundo mandato de Lula, em 2010. O outro entrave é a taxa de investimento de 19,5% do PIB. Ela impede taxa de crescimento acima de 3,5% ao ano, diz o Ipea. A Coréia do Sul, para atingir um crescimento anual de 4,4%, contou com uma taxa de investimento de 32%. Vale a pena ouvir o depoimento do economista Flávio Castelo Branco, coordenador de política econômica da CNI: “Quando comecei a estudar economia nos anos 70, o Brasil era o país do futuro, crescia de 8% a 10% ao ano. A nossa renda per capita era o dobro da renda da Coréia. Hoje, a renda per capita da Coréia é o dobro da do Brasil”. Um país assim realmente merece um bom presente.


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