23/12/2009 - 17:00
VIDA REAL
Após sete meses de tratamento, ministra aparece em público sem peruca
Cansada de seguir as recomendações dos gurus do marketing para que se mostre uma pessoa mais simpática e afável, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, pré-candidata do PT a presidente, decidiu aparecer para o público como ela mesma. O primeiro passo foi tirar a peruca, depois de sete meses. Ela usava o acessório desde maio, quando o cabelo começou a cair por causa da quimioterapia para o tratamento de um câncer linfático. Em solenidade no Itamaraty na segunda-feira 21, Dilma estreou, em público, seus cabelos naturais, de fios curtos e castanho-escuro. O novo visual é também um gesto de afirmação da forte personalidade da ex-guerrilheira. Em conversas com assessores nos últimos dias, a ministra decidiu que não se deixará mais moldar pelos mandamentos do marketing político. “Cansei de tentar ser outra pessoa. Vou ser quem eu sou”, disse ela.
Em vez de repetir o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, em 2002, passou a adotar o estilo “Paz e Amor”, Dilma quer transmitir a imagem de quem faz valer sua autoridade. E disseminar a ideia de que o êxito do segundo mandato do presidente Lula se deve, em parte, ao seu pulso firme à frente da Casa Civil. Para o cientista político Antonio Lavareda, a nova estratégia da campanha oficial é uma faca de dois gumes. “Dilma ser ela mesma é sempre positivo. O marketing que tenta ocultar as características do candidato tem grande risco de dar com os burros n’água”, disse à ISTOÉ. O problema, segundo Lavareda, é que o jeitão de durona pode não agradar à maioria dos eleitores.
“O marketing que tenta ocultar as características do candidato tem grande risco de dar com os burros n’água”
Antonio Lavareda, cientista político
Da mesma forma, o gesto de retirar a peruca pode ter dois efeitos. “Um ato como esse gera, em algumas pessoas, solidariedade. É uma postura corajosa evocar a doença que teve. Mas, para outras pessoas, menos informadas, pode gerar um ruído, pois Dilma foi vista de peruca em vários programas de tevê. Qual o efeito desse ruído de percepção visual na mente das pessoas é algo a ser investigado”. Antes de tomar a decisão de ser mais coerente com ela mesma, Dilma teve uma longa conversa com o marqueteiro Duda Mendonça, a quem confidenciou sua insatisfação com o processo de construção de sua imagem pública. No encontro, Duda mais ouviu do que falou. E ela saiu da reunião convencida de que está no caminho certo, ao decidir não mais interpretar uma personagem adocicada. Já a adoção dos cabelos naturais, sem a peruca, foi tema de uma conversa de Dilma com Lula há um mês. “Dilma me perguntou e eu falei que ela tinha mesmo que aposentar a peruca logo que o cabelo crescesse um pouco mais”, confirmou o presidente em evento no Itamaraty.
A partir dessa nova estratégia, com um perfil mais coerente, Dilma sabe que tem um desafio grande pela frente do ponto de vista eleitoral. Em São Paulo, o maior colégio de eleitores do País, o PSDB domina com folga as recentes pesquisas de opinião, que dão ao governador José Serra (PSDB) uma vantagem de até 12 milhões de votos sobre a pré-candidata petista no Estado. Isso significa 10% de todo o eleitorado nacional. Segundo a última pesquisa Datafolha, Serra tem 37% das intenções de voto dos paulistas, contra apenas 23% de Dilma, num cenário com a presença do deputado Ciro Gomes (PSB-CE) na disputa. Uma diferença que a ministra dificilmente conseguirá compensar no resto do País. Ciente do desafio que tem pela frente, Dilma se prepara para pisar com força em terras paulistas no início de 2010. Segundo o cientista político Marcos Coimbra, diretor do Vox Populi, os índices que Dilma alcançou até agora – ela saiu de 3% há um ano – foram fruto da transferência de votos do presidente Lula. “Agora ela tem que mostrar que pode mudar de patamar”, disse Coimbra à ISTOÉ.
A estratégia para alavancar o apoio do eleitorado paulista se baseará em três frentes: colar a imagem de Dilma às realizações do governo Lula no Estado, destacando as obras e projetos sociais que receberam recursos federais, costurar uma ampla aliança partidária, e explorar o que o PT considera “problemas graves” da gestão tucana. “São Paulo é o centro das atenções. Lá não podemos errar”, alerta o deputado federal Cândido Vaccarezza (SP), líder do PT na Câmara e um dos articuladores da campanha de Dilma ao Planalto. O líder petista reforça o recado do presidente Lula para as bases de que o partido terá que compor com outras forças políticas para montar um palanque local forte e ajudar a dar a visibilidade que Dilma requer em São Paulo. Segundo ele, o PT deve buscar o apoio de partidos de centro, como o PR e o PMDB, em vez de se concentrar apenas nas forças de esquerda. “O PT precisa entender que, se 30% elegessem, não precisava de aliados. Se precisa de 50% mais um, precisa procurar os outros 20%”, disse.
Para ajudar Dilma, o governo criou uma espécie de força-tarefa com a participação de sete ministros, entre eles Guido Mantega, da Fazenda, Alexandre Padilha, de Relações Institucionais, e Marcio Fortes, das Cidades. “A vinculação da ministra a todos os programas federais importantes é uma coisa natural”, diz o presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP). “Vamos destacar que há 100 mil jovens beneficiados em São Paulo pelo ProUni. Além disso, três importantes rodovias estão em construção”, diz. Com o foco concentrado em São Paulo e sua imagem realista, Dilma aposta que a diferença para Serra cairá ainda mais nos próximos meses.