Os hobbits do mundo real, diferentemente das personagens criadas pelo escritor J.R.R. Tolkien em O Senhor dos Anéis, não viveram defendendo grandes fortalezas e, tampouco, foram heróis. Mas isso não torna menos interessante a história desses pequenos hominídeos que um dia foram de carne e osso. Desde que seus fósseis foram recentemente encontrados em uma ilha indonésia, eles se tornaram protagonistas de uma polêmica que parece sem fim. Enquanto alguns cientistas defendem a hipótese de que eles pertenceram a uma outra linhagem da espécie humana que não a nossa, outros pesquisadores afirmam que os hobbits integraram o grupo dos Homo sapiens (nossos ancestrais diretos, portanto), acrescentando que aquilo que os diferenciava de nós, sobretudo em tamanho, eram anomalias encefálicas que prejudicaram o seu desenvolvimento – ou seja, os hobbits foram hominídeos, só que doentes. Na semana passada, cientistas dos EUA lançaram um novo estudo que parece encerrar a questão: esses hominídeos pertenceram realmente a uma espécie humana distinta do homem moderno e que, até então, era desconhecida.

Para chegar a essa conclusão, a equipe do cientista Matthew Tocheri, um dos coordenadores do Programa de Origens Humanas da Instituição Smithsonian, nos EUA, debruçou-se sobre os fósseis dessa pequena criatura e focou a sua análise num ponto que até então nenhum outro pesquisador tinha focado: a formação dos punhos dos hobbits. Embora os ossos dessa parte do corpo pudessem, a princípio, se mostrar pouco reveladores, Tocheri percebeu que neles havia chance de se encontrar uma característica capaz de desvendar o mistério que envolve a origem desses seres. Eis a análise pontual: os ossos que saem dos punhos do homem moderno, assim como eram nos neandertais (nossos ancestrais mais próximos), têm um formato particular, sobretudo o osso trapezóide (logo atrás do dedo indicador) – o formato é de bota. Já no hobbit, esse osso tem a forma de cunha (a mesma presente nos grandes macacos atuais). Como não se conhece doença genética que transforme a bota em cunha, a conclusão é que o hobbit é uma versão própria de hominídeo e não um humano moderno que padecia de alguma doença. Ou seja: era de uma espécie humana, distinta da nossa espécie. “Isso fecha a discussão. Homens modernos não aparecem com uma mão de chimpanzé”, diz Tocheri.

Esses seres habitaram a ilha de Flores, na Indonésia, há cerca de 18 mil anos, e foi lá que os pesquisadores australianos e indonésios puderam localizar em 2004 os seus primeiros vestígios. No interior de uma caverna, num local conhecido como Liang Bua, eles encontraram um esqueleto quase intacto de uma fêmea e fragmentos de ossos que seriam de outros oito indivíduos, além de algumas ferramentas de pedra. O fóssil passou a ser chamado de LB1 e seu estudo constatou que esse hominídeo adulto não media muito mais que um metro de altura e pesava cerca de 25 quilos. Os pesquisadores acreditam que eles tenham chegado a essa estatura pela adaptação à escassez de alimento da ilha, onde permaneceram isolados. O que mais chama a atenção, porém, é a dimensão de seu crânio, pouco maior que a de uma laranja. Enquanto o volume mínimo do cérebro de um Homo sapiens é de 500 centímetros cúbicos, no fóssil encontrado esse volume não passa de 380. Apesar dessa diferença, o cérebro dos hobbits era bastante evoluído e lhes dava capacidade intelectual, sentimentos, emoções e habilidade suficiente para, por exemplo, tirar conclusões e construir instrumentos de caça. Ainda que a comunidade científica não fechasse uma conclusão sobre esse hominídeo, os pesquisadores o batizaram cientificamente de Homo floresiensis – considerando a hipótese de ele ser mesmo de outra espécie, embora humano. Agora, a hipótese está confirmada.


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