Toda a badalação internacional em torno dos Mutantes – a banda brasileira mais revolucionária – fez com que a Universal Music encontrasse um disco inédito nos seus arquivos. O toque já havia sido dado pelo jornalista Carlos Calado em seu alentado ensaio-biografia A divina comédia dos Mutantes, lançado em 1995 pela editora 34. Num capítulo dedicado às peripécias do grupo em Paris, ele fala do álbum Tecnicolor, gravado na capital francesa, que, segundo o produtor Carl Holmes, não foi lançado porque “a mistura de títulos em inglês, português e francês” não o agradara. Assim, a fita master de Tecnicolor ficou empoeirando nos arquivos da PolyGram londrina, já que tampouco a então Philips brasileira se interessou pelo projeto. Total falta de sensibilidade da gravadora, porque com este CD bem-vindo a fãs antigos ou de primeira hora novamente se ratifica a importância do conjunto no pop-rock mundial. Tanto que Sean Lennon agregou-se à idéia. Há muito admirador dos Mutantes, o filho do ex-beatle John e de Yoko Ono fez questão de desenhar as ilustrações do encarte e escrever com uma caligrafia de professor os títulos das canções.

São 13 no total, todas anteriormente gravadas pela banda, mas aqui reconferidas com novos arranjos. Não é por nada não, mas ao se ouvir Bat macumba, canção tropicalista de Gilberto Gil em parceria com Caetano Veloso, mais uma vez dá para perceber que a “modernidade” do som eletrônico alardeada por clubbers e auto-representantes do gênero não passa de barulho contemporanizado pela tecnologia de ponta. O que os Mutantes fizeram, em 1970, é mais atual e criativo do que qualquer uma das interferências de DJs com pretensão a compositor – excetuando-se raríssimos casos em esfera internacional.

A versão de A minha menina, que em inglês ganhou o debochado título de She’s my shoo shoo, exibe a inegável explosão de alegria brasileira do grupo, com todos os toques antropofágicos que Rita Lee, Arnaldo Baptista, Sérgio Dias e trupe sabiam muito bem dominar. I feel a little spaced out (Ando meio desligado) trocou o tom psicodélico pela levada mais ritmada, unida à mistura de sons da época, chacoalhados no liquidificador mutante atemporal. O mesmo pode-se dizer de Baby, hino de Caetano Veloso, composto para Gal Costa se lançar como musa tropicalista. Tecnicolor é um disco para estudo, mesmo depois de nossa rainha do rock, Rita Lee, com todo o direito que o cetro lhe concede, ter dito estar cansada do revival Mutantes. Os fãs relevam. Afinal, ela foi a pop-história dos anos 60 e 70.


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