Era para ser a volta triunfal. Mas o retorno de Ronaldo aos gramados após 144 dias parado acabou num drama que comoveu o mundo. Depois de estar por sete minutos no jogo entre sua Inter de Milão e a Lazio – partida da Copa da Itália, realizada em Roma –, o jogador foi ao chão. Ronaldo tinha sofrido um novo acidente no joelho direito. O tendão patelar, tecido que une a patela (ou rótula) à tíbia, se rompeu. Há cinco meses, a mesma estrutura tinha sofrido uma pequena ruptura, o que obrigou o atacante a se submeter a uma cirurgia de reparação e a um intenso trabalho de recuperação.

No momento do acidente, o estádio se calou. Ronaldo urrou de dor e saiu aos prantos. No dia seguinte, já em Paris, o jogador fez outra operação, conduzida pelo cirurgião responsável pela primeira intervenção. Gerard Saillant levou duas horas para restaurar o tendão partido e também as esperanças de que Ronaldo volte a jogar. “A cirurgia foi um sucesso e ele poderá retornar aos campos em 2001”, garantiu um comunicado da Inter. “Em oito meses, ele pode estar recuperado”, calcula Joaquim Grava, médico da Seleção Brasileira.

No entanto, pode não ser bem assim. Na sexta-feira 14, Saillant lançou a suspeita de que o jogador tenha de abandonar os campos. “Ninguém pode dizer com certeza se Ronaldo jogará novamente e se voltará 100%. Mas há argumentos que nos fazem pensar que em cerca de sete meses ele volte a jogar”, afirmou. A justificativa do médico para a cautela é simples. “Seu tendão é fraco. É congênito, como ser careca. Não existe remédio que fortaleça o tendão naturalmente.”

Além da suspeita de Saillant, o que não se sabe é se Ronaldo, ao voltar, terá capacidade de mostrar a mesma genialidade que lhe rendeu, por dois anos, o título de melhor jogador do mundo. Ao contrário, suspeita-se que o atacante não dará mais suas famosas arrancadas. “Os efeitos de duas cirurgias desse nível são devastadoras para um atleta. Ele deve sofrer perda de força no arranque, ter dificuldade para dar piques e problemas em manter a velocidade”, afirma Moisés Cohen, da Universidade Federal Paulista (Unifesp). Se a previsão se concretizar, será o fim do “fenômeno” Ronaldo. “Mas é prematuro pensar em sequelas”, ressalva Grava.
Ninguém tem resposta sobre as causas desse drama. Há apenas hipóteses. Uma delas seria a volta precoce aos campos. “Pode ser que o tempo de recuperação tenha sido menor do que o necessário”, afirma Paulo Zogaib, fisiologista do Palmeiras. “Desconfio que a pressão da vaidade dos médicos e fisioterapeutas, ansiosos para bater recordes de recuperação, tenha pesado”, acredita o ex-jogador Tostão. Outra razão: as estruturas nervosas da região não teriam se recuperado na mesma velocidade dos músculos e articulações. Existem na região proprioceptores, célula nervosa que informa ao corpo a situação das extremidades, ajudando a regular funções como o equilíbrio. Na cirurgia de Ronaldo, muitas dessas células foram destruídas ou ficaram ineficazes. Dependendo da intensidade da perda, pode ocorrer algum grau de descoordenação neuromuscular, provocando um movimento anômalo, um passo involuntário que teria gerado sobrecarga na patela já fragilizada do jogador.

A última justificativa seria a fraqueza dos tendões do jogador. Na construção da musculatura, o ritmo de desenvolvimento dos músculos é mais intenso do que o dos tendões. E, no caso de Ronaldo, o investimento numa massa muscular poderosa foi impressionante. “O excesso de desenvolvimento muscular que ele adquiriu nos últimos anos sobrecarregou a articulação do joelho”, afirma Cohen. “Se podemos tirar uma lição desse drama, é o alerta de que o corpo humano tem limites.”