Durante quase 100 dias, a operação Camaquã foi planejada pela Polícia Federal para debelar três importantes focos do tráfico de drogas na fronteira entre o Brasil e a Bolívia. Mas na semana passada, antes mesmo de ser deflagrada, a Camaquã levou menos de 24 horas para derrubar um ministro e um secretário de Estado, além de revelar uma completa confusão administrativa no governo Fernando Henrique Cardoso. No meio da tarde da terça-feira 11, o ministro da Justiça, José Carlos Dias, foi instado por FHC a deixar o cargo por discutir publicamente suas divergências com o secretário Nacional Antidrogas, Wálter Fanganiello Maierovitch, a quem acusou de ter dado detalhes da operação. Na manhã da quarta-feira 12, foi a vez de Maierovitch pedir demissão.

Atônito com as baixas repentinas, Fernando Henrique escalou o secretário de Direitos Humanos, José Gregori, seu amigo pessoal, para ocupar a pasta. Também deu novo fôlego ao ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Alberto Cardoso, que tem reivindicado o comando da Polícia Federal. A rapidez do presidente em abafar a crise só não escondeu a desordem institucional no setor. “A confusão e a falta de uma política séria de combate ao crime provocam problemas como esses, que fizeram o governo perder dois excelentes quadros”, avalia o deputado federal José Genoíno (PT-SP).

A superposição de tarefas entre os ministérios da Justiça e da Segurança Institucional já havia provocado no ano passado a queda do ministro Renan Calheiros. Há um mês, José Carlos Dias foi levar ao Palácio do Planalto seu plano de segurança nacional, um alentado estudo que propunha um novo organograma de poder sobre o aparato de segurança do Estado. Sugeria que a coordenação desse plano fosse delegada a si mesmo. Em reuniões reservadas, o general Alberto Cardoso refez os planos e assumiu, no papel, o controle da segurança – portanto, daria as cartas na orientação e supervisão da Polícia Federal. Dias soube dos planos do general e não gostou. Foi ao presidente e conseguiu recuperar o comando. O resultado de toda essa briga não saiu do papel. Mas acirrou os ânimos.

Combustível suficiente para a batalha seguinte, há duas semanas, durante uma reunião entre Dias e o general Cardoso com os ministros Pedro Parente e Aloysio Nunes Ferreira. A avaliação das autoridades palacianas era de que as atribuições do Ministério da Justiça eram muito extensas e mesclavam assuntos judiciários e de segurança. Problemas bastantes para ocupar dois ministros. Dias não gostou. “Se fizerem essa mudança, não será comigo”, ameaçou. Antes mesmo de ser empossado na sexta-feira 14, Gregori já teve sua primeira escaramuça com a turma do general Cardoso. Declarou que o comando da repressão ao narcotráfico continuaria com a PF, e o porta-voz George Lamaziére disse que não era bem assim. Se FHC não definir claramente as funções da PF e da Senad, a briga certamente terá outros capítulos e novas cabeças deverão rolar.

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