Aos 78 anos, depois de governar o Rio duas vezes e sofrer três derrotas nacionais seguidas, o comandante do PDT, Leonel Brizola, frustrou quem torcia por sua aposentadoria. É o caso do governador Anthony Garotinho, também do PDT. Em 15 meses de governo, Garotinho teve confrontos públicos com o ex-governador, que foi mantido longe do Palácio Guanabara. Na última quinta-feira, um Brizola com ar de superioridade chefiava a reunião do Conselho Político do PDT para escolher os novos ocupantes das secretarias e das centenas de cargos vagos com a saída do PT e a exoneração de cinco integrantes do primeiro escalão suspeitos de corrupção. “Sou candidato potencial à prefeitura”, animava-se Brizola, sem esconder a satisfação por ter quebrado a independência que Garotinho vinha ostentando.
A saída do PT pôs fim ao mais importante governo composto pela união dos partidos de esquerda no País. E feriu gravemente a campanha precoce de Garotinho a presidente. Não foi à toa que o governador, a vice-governadora Benedita da Silva e o ex-secretário de Planejamento Jorge Bittar chegaram às lágrimas na reunião no Palácio Laranjeiras que sacramentou a separação, terça-feira 11. O apoio dos petistas, fundamental para a vitória sobre Cesar Maia em 1998, foi obtido com o compromisso de união em torno da candidatura de Benedita a prefeita. A relação entre o PT e o governador sempre teve mais tapas do que beijos. O comportamento dos petistas diante das denúncias tornou o divórcio inevitável. Seus deputados votaram por uma CPI – barrada pelo PMDB – para investigar corrupção na Companhia Estadual de Habitação (Cehab). Diante das evidências de irregularidades, Brizola cobrou a renúncia do secretariado e Garotinho teve de afastar cinco amigos: os secretários de Justiça, Antonio Oliboni, e Defesa Civil, coronel Paulo Gomes, e os presidentes da Cehab, Eduardo Cunha, Empresa de Obras Públicas, Carlos Augusto Siqueira, e Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos, Ranulfo Vidigal.

O mais íntimo dos amigos e chefe do Gabinete Civil, Jonas Lopes de Carvalho Júnior, foi mantido. Apesar de receber irregularmente dois salários por funções públicas (no governo e na prefeitura de Campos), Jonas deverá ser nomeado por Garotinho para uma vaga no Tribunal de Contas do Estado. Na semana passada, o TCE aprovou uma inspeção extraordinária nas contas do governo. A semana foi marcada por uma trégua nas denúncias, mas seus adversários guardam munição e investigam a informação de que Garotinho teria um esquema de compra de rádios e emissoras de tevê para servirem a seu projeto presidencial. Um empresário de Campos disse a ISTOÉ ter atuado como corretor na compra das emissoras. Na primeira reunião com Brizola, terça-feira 11, Garotinho fez mea-culpa, pediu ajuda, prometeu ser mais partidário e anunciou que exigiria apoio incondicional dos petistas. O PT, que já foi chamado de “partido da boquinha” pelo governador, reagiu e entregou três secretarias, seis subsecretarias e cerca de 350 cargos. “A lição da crise é que política não é para principiante. Garotinho se fiou na sua exuberância radiofônica e achou que poderia levar o PT, Brizola e até o Planalto no bico”, analisa a cientista política Lucia Hippolito. “Ele acreditou que Brizola fosse um pobre velhinho cuidando de ovelhinhas no Uruguai.”

Dúvidas – Com Brizola no páreo, dividindo ainda mais o eleitor pobre que oscila entre Benedita e Sérgio Cabral (PMDB), as chances do PT se reduzem. Sérgio, que se preparava para renunciar à presidência da Assembléia Legislativa para se dedicar à campanha, já encomendou pesquisas para medir a viabilidade de sua candidatura. Publicamente, ele rejeita a idéia de aderir ao governo, mas o PMDB já começou a cobrar espaços, cumprindo a tradição de apego a cargos que marca a trajetória do partido no Estado. “Não tenho vocação para herdeiro de crise conjugal”, diz Sérgio.
Os índices altíssimos de rejeição não inibem Brizola. Ele iniciou a corrida com toda a carga, chamando Benedita de “rainha de Sabá”, numa referência às mordomias e aos 42 cargos da vice-governadora. “Brincadeira de criança é bom, mas somos adultos. Sempre respeitei Brizola”, reclamou Benedita, dizendo-se ainda esperançosa no apoio do PDT. “Sem união, estaremos fadados à derrota.” Cesar Maia, que derrotou Benedita em 1992, se beneficiou com a crise e atingiu 30% das intenções de voto, o dobro do prefeito Luiz Paulo Conde (PFL). O favorito é visto pelo eleitorado como contraponto ao governador e acaba de ganhar um reforço ao seu discurso de que Garotinho é Brizola com roupa nova.