Ao ser convidado para dirigir a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp), o maestro John Neschling (brasileiro, filho de austríacos) fez uma única exigência: a construção de uma sala própria, para ele e seus músicos. “Todo time de futebol necessita de um estádio onde possa treinar e receber seus torcedores”, disse Neschling. Uma orquestra também tem de treinar e tocar para ganhar. Ele ganhou o seu Maracanã no bairro paulistano da Luz. Alguns resultados obtidos por esse príncipe regente: a Sinfônica acaba de ser ovacionada nos EUA, foi premiada na França com o Diapasão de Ouro (uma das principais láureas européias) e recebeu o Disco do Mês, na Inglaterra, pelo CD Francisco Mignone (homenagem ao compositor brasileiro falecido em 1986).

ISTOÉ – Essa é a segunda vez que a Osesp se apresenta nos EUA.
John Neschling
– Sim. Foram 14 concertos em 13 cidades, entre elas Nova York, e uma turnê pelo interior da Flórida. O repertório foi basicamente de compositores latino-americanos e russos.

ISTOÉ – A sua programação é de 130 concertos anuais. É um número alto?
Neschling
– Enorme, dá uma média mensal de 12 concertos. A segunda grande turnê pela Europa, em março de 2007, terá 18 concertos em grandes salas. Será a mais importante da história da Osesp.

ISTOÉ – Quem cuida dessa logística?
Neschling
– No princípio eu cuidava de tudo. Com a criação da Fundação Osesp, fiquei como diretor da orquestra. Eu li uma pesquisa que diz que os regentes têm a profissão mais longeva do mundo. Seguidos pelos açougueiros.

ISTOÉ – O que se passou realmente no I Concurso Internacional de Piano Villa-Lobos, promovido pela Osesp?
Neschling
– Foi uma tempestade em copo d’água, uma história inventada pelo pianista israelense Ilan Rechtman que dirigiu o concurso. Ele não é mau músico, mas é maluco. Tentou fraudar o concurso e foi afastado. Mas não há dúvida de que a desonestidade arranhou o festival.

ISTOÉ – O que está errado com a formação de músicos no Brasil?
Neschling
– Achar que só se começa a fazer música na universidade. O Brasil
não investe em educação musical e ninguém pode começar em violino quando já tem 17 anos.

ISTOÉ – Com que idade o sr. começou no piano?
Neschling
– Comecei aos quatro anos. Aos 15 já tinha decidido fazer regência e fui estudar em Viena. Voltei para o Brasil dez anos depois, mas fiquei dando aulas e compondo para cinema e teatro. Viajei de novo, dessa vez foram 15 anos na Europa.

ISTOÉ – Qual foi a primeira trilha que o sr. fez?
Neschling
– Foi para Os condenados, de Zelito Viana, em 1973. Ele disse que eu só era um bom regente porque sabia tocar Carinhoso. Para o Hector Babenco fiz Lúcio Flávio, Pixote e O beijo da mulher-aranha. Meu filme mais recente é Desmundo, do Alan Fresnot.

ISTOÉ – Fale da Sala São Paulo.
Neschling
– Esse é o verdadeiro milagre brasileiro. Isso aqui levaria talvez 15 anos para se fazer na Europa e aqui fizemos em dois. Tenho muito orgulho do “Maracanã” da Osesp, que foi considerada pelo jornal parisiense Le Monde uma das “catedrais da música” espalhadas pelo mundo.