No crédito de homenagens ao compositor Antonio Carlos Jobim e ao cineasta François Truffaut, que Bruno Barreto faz no início de seu 14º filme, Bossa nova – estréia nacional na sexta-feira 31 –, ele omitiu a mais escancarada delas. Preferiu que sua declaração de amor ao Rio de Janeiro estivesse explícita ao longo de toda a fita, que, salvo algum engano, até agora é a que registrou as imagens mais esplendorosas daquela que, com justa causa, é chamada de Cidade Maravilhosa. Requintadamente maquiados pela fotografia do francês Pascal Rabaud, um simples alvorecer, crepúsculo ou todos os enfoques de cartão-postal explodem na tela com uma beleza insolente. E até mesmo falsa, como quando o diretor “carioca da gema” usa o truque da piscina para mostrar uma esguia Amy Irving nadando na limpidez mentirosa das águas do Arpoador. Não importa. Cinema é também fantasia e, mais uma vez, Bruno Barreto provou que entende da arte – de filmar e de ser diretamente compreendido por outras culturas.

Bossa nova tem sotaque internacional. Fala-se inglês o tempo todo. Mas, ao contrário de outros exemplos da cinematografia tupiniquim, em que a língua é colocada como recurso para atingir o mercado estrangeiro, Barreto escolheu uma história na qual o inglês é ponto obrigatório, inclusive ancorando vários momentos bem-humorados. Alguns deles inspirados na vivência do diretor de 45 anos, que há dez mora nos Estados Unidos. “Fazer este filme foi uma maneira de exorcizar uma saudade muito grande do Rio de Janeiro que eu tenho dentro do coração”, confessou Barreto, de Aspen, numa conversa por telefone com ISTOÉ, na semana passada. “Quando morava em Los Angeles e tocava Tom Jobim naquelas rádios americanas de jazz, eu chorava. Não poderia ter filmado Bossa nova se não morasse fora do Brasil.” Exatamente por causa dessa sensação é que toda a fita foi luxuosamente embalada pelas canções da geração João Gilberto ajudando no clima exato de romance-comédia aveludado, tal a delicadeza com que seus protagonistas falam e vivem o amor.

Baseado no romance Senhorita Simpson, de Sérgio Sant’Anna, Bossa nova conta a história de Mary Ann (Amy Irving), uma professora americana de Inglês, solitária na sua viuvez de exílio no Rio, que se apaixona pelo advogado Pedro Paulo (Antonio Fagundes), recém-separado de Tânia (Débora Bloch). Pedro Paulo – um conquistador a princípio mais interessado nas formas do que nas aulas de Mary Ann – protagoniza cenas divertidas com a confusão de línguas. Fagundes e Alexandre Borges, que faz Cássio, um jogador de futebol deslumbrado com a própria fama, na verdade não dominam o inglês. Amy também não tinha fluência em português, só agora domada depois de um curso intensivo feito com a determinação de divulgar o filme no Brasil. Então, várias das gags que acontecem na frente das câmeras foram reflexo das brincadeiras atrás delas, como conta Barreto.

A mescla de romance num fantasioso Rio atemporal com situações de comédia apoiada em boas interpretações faz de Bossa nova uma diversão muito agradável, tanto para brasileiros como para gringos. “Queria que este filme fosse para mim o que Manhattan foi para Woody Allen”, diz o diretor. Pelo menos no que depender da beleza, Bruno Barreto pode ficar tranquilo.