João e Kim nasceram em 21 de junho de 1970, dia em que o Brasil ganhou a Copa do México. Os pais de Kim eram professores; os de João também. Kim sempre estudou em escola pública; João também. Kim ama futebol; João adora. Kim é da classe média de seu país; João também. Os pais de Kim já se aposentaram; os de João também. Kim e João trabalham na mesma empresa, uma multinacional líder mundial em tecnologia. Kim é engenheiro e ganha R$ 7.100,00 por mês. João não chegou a terminar o ensino médio, ganha R$ 1.900,00 por mês. Kim trabalha na sede da multinacional e é chefe do chefe de João, que trabalha aqui no Brasil.

Onde os caminhos de Kim e João se separaram?
A cegonha deixou Kim na Coreia do Sul, João no Brasil. Em 1960, a renda per capita na Coreia era metade da brasileira. Em 1970, eram parecidas. Hoje, na Coreia, ela é três vezes maior do que a nossa.

Como as vidas de centenas de milhões de Kims e Joãos tomaram destinos tão diferentes em poucas décadas? Educação, educação e educação.

O país dos Kims investiu no ensino público básico, de qualidade e acessível a todos. O governo coreano gasta quase seis vezes mais do que o brasileiro por aluno do ensino médio. Na Coreia, um professor de ensino médio ganha o dobro da renda média local; no Brasil, menos do que a renda média. Com isso, os Kims estão sempre entre os primeiros lugares nos exames internacionais de estudantes de ensino fundamental e médio – muitas vezes, em primeiro lugar. Os Joãos, melhor nem falar.

Só após garantirem uma boa formação básica e bom ensino técnico, os coreanos investiram em ensino universitário. Ainda assim, a Coreia tem três universidades entre as 70 melhores do mundo. O Brasil não tem nenhuma entre as 150 primeiras. Hoje, a Coreia do Sul é, em todo o mundo, o país com maior percentual de jovens que chegam à universidade – mais de 70%, contra 13% no Brasil. De quebra, o país dos Kims forma oito vezes mais engenheiros do que nós em relação ao tamanho da população de cada um. Tudo isso com um detalhe: a Coreia gasta menos com cada universitário do que o Brasil, mas forma quatro vezes mais Ph.Ds. per capita do que nós.

Para cada won gasto com a aposentadoria do pai de Kim, o governo coreano gasta 1,2 won com a escola do seu filho. No Brasil, para cada real gasto pelo governo com a aposentadoria do pai de João, ele gasta apenas R$ 0,10 com a escola do Joãozinho.

No ano que vem, os pais de Kim virão para a Copa do Mundo no Brasil. A mãe de João já tinha falecido, mas seu pai quis muito ir à Copa da Coreia e do Japão em 2002, mas não tinha dinheiro para isso. Há um ano, ele está fazendo uma poupancinha e ainda está esperançoso em ser sorteado para um dos ingressos com desconto para idosos para ver um jogo da Copa de 2014, nem que seja Coreia do Sul x Argélia. Como os ingressos com descontos são poucos e concorridos, as chances de seu João são baixas. Se conseguir, quem sabe ele não se senta ao lado do sr. e da sra. Kim. Pena que seu João não teve a chance de estudar inglês. Eles poderiam conversar sobre os filhos…

Ricardo Amorim é economista, apresentador do programa “Manhattan Connection”, da Globonews, e presidente da Ricam Consultoria