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 Vai longe o tempo em que os brasileiros podiam chamar seus carros de carroça. Nos últimos 23 anos, a indústria automobilística instalada no Brasil se modernizou, o País passou a disputar com a Alemanha o posto de quarto maior mercado mundial de automóveis, recebeu uma enxurrada de novos fabricantes de todas as partes do mundo e estava a duas semanas de completar a última parte de uma lei que vigora desde 1º de janeiro de 2010: a de que, a partir de 1º de janeiro de 2014, todos os carros produzidos no Brasil já saiam das linhas de montagem equipados com airbags e ABS (sistema antitravamento dos freios). Com isso, a segurança ativa e passiva dos carros iria melhorar muito, quase 500 vidas seriam poupadas anualmente e o governo deixaria de gastar cerca de R$ 315 milhões por ano com os mais de dez mil feridos em acidentes, cujo tratamento é sustentado pelos impostos pagos pelos cidadãos.

Desde 2009, quando a lei foi aprovada, depois de alguns anos de intenso debate, a indústria automobilística se preparou, passou a equipar seus carros com airbags para motorista e passageiro e veio cumprindo as metas estabelecidas – que partiu de 8% em 2010 e estava em 60% em 2013. Alguns carros ficaram até marcados para morrer, como a VW Kombi e o Fiat Mille, porque seus projetos antigos não sustentariam o investimento necessário para receber os airbags e o ABS. O airbag, que nada mais é que um saco de ar, infla em milésimos de segundo quando ocorre uma batida forte, servindo de barreira entre o rosto do motorista e o vidro do carro. Modelos mais caros já possuem airbags laterais, de cortina e até de joelhos. Quanto ao ABS, sigla para Anti-locking Braking System, permite que o carro mantenha a tração em pista molhada, mesmo se o motorista precisar frear e virar o volante para evitar uma colisão – sem ele, o carro derrapa e a batida é inevitável.

Essa preocupação com a segurança com foi tão importante que o Ford EcoSport acaba de ganhar cinco estrelas no rigoroso crash test realizado pelo instituto Latin Ncap. Pela primeira vez, um carro produzido no Brasil conseguiu a nota máxima num teste de impacto.

Mas (no Brasil nunca é tarde para surgir esse “mas”) a menos de vinte dias do início da fabricação de todos os carros com airbags e ABS, o ministro Guido Mantega surpreendeu a indústria automobilística ao dizer que a lei pode ser adiada para 2016, porque teme um aumento de até R$ 1.500 no preço dos carros e seu impacto na inflação. Também teria sido pressionado pelo sindicato dos metalúrgicos do ABC paulista, de que o fim da Kombi levaria à demissão de quatro mil trabalhadores na Volkswagen. Mas a Volks utiliza apenas 700 funcionários na montagem da Kombi e todos eles seriam realocados para outras linhas.

Agora estamos diante de uma nova canetada – que também pode ser entendida como uma quebra de contrato, pois várias empresas, principalmente as de autopeças, investiram para enfrentar o novo panorama que estava decidido para 2014. Além disso, o mercado está muito competitivo, com excesso de estoque, e nenhuma montadora cogitou repassar o custo dos airbags e do ABS para o preço final. Todas têm medo de perder clientes. Agora imagina o mico que terão nas mãos os consumidores que pagaram R$ 85 mil pela Kombi “Last Edition” se ela continuar sendo fabricada.

Então é assim: final de 2013 e a segurança de milhares de pessoas é ignorada para que o ministro atenda à reivindicação estapafúrdia de um sindicato paulista. Em resumo: provavelmente não teremos 100% dos carros “padrão Fifa” em 2014. Quem sabe na próxima Copa.