Um jogo que, ao final do primeiro tempo, já mostra uma goleada de quatro a zero, dificilmente comporta uma virada. E é bom que assim seja. A partida em questão é a votação, pelo STF, de uma ação proposta pela OAB, questionando as doações de empresas em campanhas políticas. Até agora, já votaram pelo fim da promiscuidade entre o público e o privado o presidente Joaquim Barbosa, o relator Luiz Fux e os ministros Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso. A partida será retomada em breve, depois que Teori Zavascki, que pediu vista, devolver o processo à sua tramitação normal.

Dos sete votos pendentes, apenas um já é conhecido: o do ministro Gilmar Mendes, que afirmou que o projeto atende, sobretudo, aos interesses do PT e do governo federal. Segundo Gilmar, quem já está no poder leva vantagem, num sistema onde potenciais adversários não teriam acesso a outras fontes de financiamento. No entanto, é possível argumentar também na direção contrária. Que dificuldade teria hoje o PT, que tem todos os instrumentos de governo, como o BNDES e as empresas estatais, para arrecadar bem mais do que seus oponentes? Além disso, a ação da OAB foi proposta pelo ex-presidente Ophir Cavalcante, que se notabilizou pelo discurso oposicionista.
O que importa, porém, não é julgar se o processo interessa ao partido A, B ou C. Ele responde aos anseios da sociedade e também dos que foram às ruas em junho. A onda de protestos, que exigia serviços públicos de qualidade e pedia transportes e hospitais com “padrão Fifa”, tem relação direta com a discussão travada no STF. O principal fator de distorção da agenda pública é justamente o financiamento privado da política, que inverte as prioridades dos governos. Quem paga antes, naturalmente, espera retribuição. Não por acaso, os maiores doadores são justamente as empreiteiras. E se hoje o Brasil tem mais estádios suntuosos do que hospitais públicos de qualidade, a resposta talvez esteja aí.

Também não adianta argumentar que, nos Estados Unidos, as doações privadas são permitidas. Lá, como já escreveu o repórter Greg Palast num best-seller político, tem-se “a melhor democracia que o dinheiro pode comprar” (“The Best Democracy Money Can Buy”, lançado em 2004). Mas a sociedade aceita com mais naturalidade esse tipo de relação entre empresas e governos. Republicanos, por exemplo, são mais propensos a guerras e mais financiados pelos setores de defesa e do petróleo. Democratas obtêm mais apoio de indústrias tradicionais e até do setor financeiro.

O Brasil, no entanto, é um país traumatizado por escândalos que têm a mesma origem: o financiamento privado de campanha. É preciso eliminar esse tumor e agir para que as campanhas sejam mais baratas, sem tanta interferência do marketing político. Com a palavra, o STF, que tem a oportunidade de encerrar de vez a “República das empreiteiras”. 


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