Quem consome adoçantes e navegou recentemente pela Internet pode ter levado um susto. Um e-mail difundido pela rede está fazendo denúncias sobre malefícios que seriam provocados pelo aspartame, uma das matérias-primas usadas na fabricação desses produtos. Assinado pela americana Nancy Marckle, que se identifica apenas como doutora, o artigo traz graves acusações. A mais alarmante é a de que existiria, nos Estados Unidos, uma epidemia de esclerose múltipla e lúpus sistêmico – doença do sistema de defesa do organismo que provoca manchas na pele – causada pelo consumo do aspartame. No caso da esclerose, a explicação dada é a de que o adoçante, ao chegar ao estômago, sofre um processo de degradação e libera metanol, substância tóxica para o sistema nervoso que provocaria sintomas parecidos com os da doença. Em relação ao lúpus, o artigo afirma que portadores do distúrbio pioram quando ingerem o adoçante. Outros efeitos são atribuídos ao aspartame. A substância causaria espasmos, dor de cabeça, depressão e ataques de ansiedade. “Se você está usando aspartame e sofre desses sintomas provavelmente tem a doença do aspartame!”, alerta um trecho do artigo.

Esse tipo de denúncia faz tremer não só o consumidor mas o próprio mercado de adoçantes, em crescimento vertiginoso. Para se ter uma idéia, 250 dos 300 produtos com adoçantes (refrigerantes, sobremesas, iogurtes) existentes no mercado hoje surgiram nos dois últimos anos. Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos Dietéticos (Abiad), em 1998 o faturamento no setor foi de US$ 224 milhões (em 1990, essa cifra era de US$ 55 milhões). “O valor corresponde ao consumo de 13 bilhões de doses de adoçante, o equivalente a 13 bilhões de xícaras adoçadas com o produto”, explica Ary Bucione, vice-presidente da Abiad.
Justamente por ser um mercado tão apetitoso é preciso olhar o artigo com cautela. Até porque o aspartame é o adoçante mais consumido no mundo (em segundo lugar vem o ciclamato) – preferido por cerca de 100 milhões de pessoas. No aspecto científico, o artigo traz pelo menos uma verdade. “O metanol é uma substância tóxica e também um dos subprodutos da quebra da molécula do aspartame no estômago (os outros dois são o ácido aspártico e a fenilalanina)”, explica o pediatra Sérgio Graff. Mas a substância também está presente em outros alimentos. O que se questiona é a partir de que quantidade ela teria efeitos nocivos. E ao que se sabe, o teor de metanol liberado no consumo de aspartame é ínfimo. “A quantidade de metanol em 300 ml de refrigerante adoçado com aspartame é cerca de dez vezes menor do que em 100 ml de suco de tomate natural”, garante Anthony Wong, diretor do Centro de Assistência Toxicológica do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Na verdade, trata-se de uma polêmica vazia. A não ser com gestantes, já que muitos médicos aconselham a se evitar qualquer produto químico (inclusive o adoçante), eventuais consequências ao consumidor aconteceriam se ele extrapolasse as dosagens determinadas por órgãos de saúde do calibre da Organização Mundial de Saúde (OMS) e cumpridos no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (leia quadro). Segundo a OMS, a ingestão diária aceitável de aspartame é de 40 mg por quilo de peso. Para atingir esse limite, uma pessoa de 70 quilos teria de tomar, por dia, 47 latas de refrigerante de 350 ml adoçado com aspartame ou consumir 73 sachês do produto. E mesmo assim, imaginando que uma pessoa atingisse esse nível, o que poderia acontecer é controverso. A única certeza é intoxicação. “Não existe nada que, em excesso, não seja tóxico”, afirma o endocrinologista Fadlo Fraige Filho. Alguns especialistas, no entanto, acreditam no risco de lesões neurológicas. “Neste caso o sistema nervoso pode ser atingido”, afirma Igor Vassilieff, da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

Polêmica – Essas controvérsias são compreensíveis quando se sabe que os adoçantes são um produto relativamente novo (a sacarina e o ciclamato foram os primeiros a surgir, há cerca de 40 anos). “Não ficamos inertes com uma denúncia dessas. Consultamos entidades reguladoras de alimentos internacionais e não encontramos indício de risco”, diz Cléber dos Santos, da Vigilância Sanitária. “A ressalva é que as pessoas podem estar ingerindo mais adoçantes. Afinal, não é só o cafezinho com adoçante, mas o refrigerante, o chocolate”, lembra Cléber.
É uma preocupação relevante. Mas mesmo quem consome uma boa dose de adoçantes não chega nem perto dos limites. O comerciante Ubiratan de Aguiar, 28 anos, 140 quilos, usa os produtos desde o começo do ano. Calculando tudo o que ingeriu num único dia, a quantidade foi de 840 mg. Bem abaixo dos 5,6 mil mg que poderia ingerir. “Com a ajuda dos produtos perdi 13 quilos e nunca tive nenhum problema”, diz. A apresentadora Marília Gabriela, 51 anos, é outra fiel consumidora há pelo menos 20. Ela se mostra incrédula em relação aos malefícios do aspartame. “Adoçantes são uma forma de controlar o peso. Não me amedronto com esse tipo de notícia”, afirma. Pelo menos enquanto a ciência não der a última palavra, Gabi está certa.
Colaborou Marina Caruso


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