Numa rapidez que guarda desagradável semelhança com a prontidão da polícia alagoana e do deputado Augusto Farias (PPB-AL) em aceitar uma versão capenga para a morte de PC Farias, o secretário de Segurança do Estado do Rio de Janeiro, Josias Quintal, anunciava, ainda no dia do brutal assassinato do coronel PM Carlos Magno Nazareth Cerqueira, os primeiros resultados das investigações sobre o crime. Passava pouco das 16 horas de terça-feira 14 quando Cerqueira entrou no edifício Magnus, na avenida Beira-Mar, centro do Rio de Janeiro. Ia buscar o ex-governador Nilo Batista para jogar basquete. Depois de subir o primeiro vão de escadas do saguão, ouviu às suas costas alguém que o chamava pelo nome. Parou – próximo ao cartaz onde se lê "Sorria, você está sendo filmado!" – e virou-se. Naquele momento, foi alvejado no olho direito por um tiro. Outros três disparos foram feitos – um deles atingiu o sargento Sidney Rodrigues, que também estava no saguão. O coronel morreu instantaneamente e Rodrigues acabou levado para o hospital em estado grave.


A morte de Cerqueira, ex-comandante da Polícia Militar fluminense nos dois governos de Leonel Brizola, defensor ardoroso dos direitos humanos e inimigo da corrupção policial, causou enorme comoção. "Era um homem sério, generoso e disciplinador", disse um emocionado Brizola no enterro de Cerqueira. Na ausência do governador Anthony Garotinho, que estava nos Estados Unidos, a vice-governadora, Benedita da Silva, decretou luto oficial de três dias. "Não há dúvidas de que Rodrigues matou Cerqueira. Ao que parece tentou suicídio depois", afirmou Quintal. A tese vai de encontro à suspeita de que Cerqueira, que estava na reserva aos 61 anos, teria sido morto por represália de policiais militares corruptos punidos em sua gestão à frente da corporação. "O sargento Rodrigues tinha problemas psiquiátricos, era paranóico. Foi internado pelo menos uma vez e punido duas vezes", explicou o secretário de Segurança.


Pelo raciocínio, ele teria elegido aleatoriamente o coronel Cerqueira como um alvo a ser destruído. Testemunhas teriam, inclusive, dito aos policiais que o sargento reclamara do coronel por ter anulado há anos um concurso da PM em que estava inscrito. Apesar de tanta certeza, o comandante do Batalhão onde Rodrigues estava lotado disse que nunca soube que ele tivesse doença psiquiátrica. Sua mulher, Silvana, também afirma que ele era um homem normal. Mas, admitindo-se que o sargento Rodrigues seja mesmo um desequilibrado, é preciso saber: como o Estado permitia que ele trabalhasse normalmente, usando farda e armamento? Existe pelo menos outra grande dúvida. Por que o depoimento de um taxista que teria levado três homens do prédio para a rodoviária depois do crime foi descartado?


Mesmo diante da certeza exibida pelo secretário Quintal e sua polícia, o governador Anthony Garotinho destoou do subordinado. "Tudo leva a crer que foi um crime encomendado", afirmou. Mesmo que esteja correta a rápida conclusão a que chegou a polícia fluminense, é no mínimo estranha a velocidade como foram descartadas outras hipóteses. Cerqueira, aparentemente não temia inimigos. "Ele atualmente fazia trabalhos teóricos sobre criminalidade, não andava armado e nem usava seguranças", afirma Nilo Batista. "A grande obra do coronel foram suas idéias", disse Rubem César Fernandes, coordenador do Movimento Viva Rio. Outro amigo, o coronel Jorge da Silva, que ocupou a chefia do Estado-Maior da PM no tempo de Cerqueira, também lembrou o idealismo do coronel. "Ele lutou contra a discriminação e, numa sociedade preconceituosa como a nossa, sempre encontrou barreiras. Quem sabe sua morte não chama atenção para suas teorias?"