Não basta ensinar. Os pais de hoje, que mal arranjam tempo para fazer uma refeição junto dos filhos, procuram uma escola que vá muito além do ABC e da tabuada. Precisam encontrar nela uma parceira forte para educar no sentido mais amplo da palavra. E é nesta época do ano, quando a maioria dos colégios abre as matrículas, que as famílias começam a investigação. Diante da infinidade de métodos e propostas pedagógicas, os pais de primeira viagem se sentem confusos e angustiados com a possibilidade de errar na escolha. O que funciona melhor: uma escola grande e impessoal ou uma menor, com bastante atenção individual? Disciplina é mais importante do que criatividade? Como saber se uma escola é o que promete? Gente do ramo e, sobretudo, os acertos e erros de quem já viveu a situação podem ser fontes esclarecedoras – não para apontar escolas, mas para ajudar a definir expectativas. Saber o que se procura é o primeiro passo para encontrar.

A psicopedagoga Raquel Caruso Lopes, do Centro de Aprendizagem e Desenvolvimento (CAD), de São Paulo, que vai realizar dia 13 o workshop "Escolhendo uma escola para meu filho", lembra que não existe a escola ideal para todos, mas a mais adequada aos valores de cada família e ao que ela espera da educação. "Queríamos um colégio com disciplina, mas com um método aberto", diz a psicóloga Rosely Claro, que matriculou o filho, Alan, três anos, numa escola grande e tradicional. Para a psicóloga, a diversidade de relações e a organização de uma escola com muitos alunos propiciarão ao seu filho a experiência que lhe falta em casa. "Alan é filho único. Acho que vai ser bom para ele dividir atenções", considera. A arquiteta Suzana Caltabiano quer encontrar para o filho João, um ano e dez meses, uma escola onde ele viva a infância da forma mais natural possível. "Já fui a várias, mas estou perdida. Umas têm regras demais outras, de menos. Visitei uma em que a criança nunca se sujava. O tanque de areia estava cheio de arroz e a grama era sintética. Quero que meu filho possa andar na terra se quiser", diz ela.

À primeira vista, o projeto pedagógico é um tema misterioso, diante do qual os pais não sabem o que perguntar. A maioria das instituições adota um mix das teorias de aprendizagem. Em tese, todas garantem estar voltadas para o desenvolvimento global do aluno, prometem a formação de um adulto apto a enfrentar a diversidade do mundo moderno. Ótimo, mas como saber se o discurso bate com o dia-a-dia? Para Cleide Rita de Almeida, doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP), visitar a escola em horários diferentes é uma boa forma de perceber detalhes. Tudo é importante. Desde o modo como o guarda ou a recepcionista atendem as pessoas até o jeito como as crianças são tratadas na lanchonete. O procedimento dos funcionários – incluídos aí faxineiros, bedéis e atendentes – e dos alunos é um termômetro do grau de equilíbrio entre o que se promete e o que se cumpre. "As relações dentro da escola são um bom retrato do que ela proporciona", aponta a psicopedagoga Márcia Lágoa, de São Paulo. Brigas entre os alunos ou entre eles e os funcionários, episódios de depredação e vandalismo indicam descontentamento. Não se destrói algo que se ama. Ouvir alunos e ex-alunos também fornece informações confiáveis.

Direito – Questionar a qualidade do quadro de professores é algo que, muitas vezes, acanha os pais. Indevidamente. É um direito saber se os professores são exclusivos da escola, se o quadro é estável e se há investimento em capacitação. A entrevista com a coordenação é uma boa oportunidade para isso. Outra questão importante é saber como a escola trata a questão das drogas. A conduta mais comum nas boas escolas hoje é dedicar-se à prevenção e ao acolhimento e orientação de alunos com problemas. A participação da família na escola é também fator de qualidade. "No mundo todo, essa integração tem efeitos muito positivos", afirma Noely Wefford Almeida, chefe do Departamento de Fundamentos da Educação da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP). A família funciona como fiscal e colaborador, ao apontar problemas e dar sugestões. A parceria ajuda a eliminar descontentamento futuro.

Com o passar do tempo, novas circunstâncias podem trazer a necessidade de repensar a escolha inicial. Não é obrigatório que uma mesma escola satisfaça por toda a vida. A geógrafa Maria Ângela Marques, mãe de Pedro, sete anos, e Paula, dez anos, estava feliz com o colégio dos filhos até a garota chegar à pré-adolescência. Desde então, surgiram conflitos entre a educação em casa e o modo de vida dos amiguinhos de sua filha. "Foi mais uma divergência com a clientela da escola do que com a escola", relata ela. Este tipo de conflito é comum. "As crianças dividem o lazer com os amigos, vão dormir na casa deles. Se não há afinidades entre as famílias, os conflitos são inevitáveis", explica Lino de Macedo, diretor do Instituto de Psicologia da USP. É bom que a escola não esteja muito acima do nível socioeconômico da família. Sentir-se excluído dos programas da turma pode gerar problemas de auto-estima.

 

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Sem stress – Poupar a criança do desgaste de congestionamentos diários também é uma das medidas a se considerar. Uma escola perto de casa permite treinar a liberdade e a independência de ir e vir, importante principalmente na adolescência. Facilita a convivência com os colegas e a participação dos pais na escola. A produtora Annick Arnoult crê nisso. Tanto é que, ao mudar de endereço, providenciou nova escola para Thiago, nove anos, e para Isabella, cinco anos. E bem no meio do ano. Para iniciar, lançou mão da lista telefônica para ver quais as escolas do bairro. "Não dá para aprender se elas já entram na sala de aula cansadas pelo trânsito", diz. Claro que Annick não restringiu sua escolha à distância. Fez questão de checar tudo, inclusive se a utilização do espaço físico era bom. Afinal, de nada adianta um laboratório de Ciências bem-equipado ou uma biblioteca recheada de bons títulos que ninguém usa.

Para fugir da dificuldade de analisar a linha pedagógica, muitos pais optam direto pelas escolas mais famosas e concorridas, onde, desde a pré-escola, as crianças são submetidas a testes para obter uma vaga. É recomendável, nesses casos, que a família não viva a eventual reprovação como um fracasso da criança, que num momento tenso como um teste dificilmente pode mostrar todo o seu potencial. É desejável ainda que, se o stress for inevitável, que ele seja vivido em nome de uma escolha clara e não de um medo de escolher.

Colaborou Eliana Castro (SP)


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