O rapaz correu tentando escapar de seus perseguidores. Um deles o atingiu com um golpe de fuzil, derrubando-o no chão. Quando ele tentou se levantar, foi alcançado por um tiro e os milicianos saltaram sobre ele. Uns deram-lhe violentas coronhadas enquanto outros, com seus machados e facões, golpearam várias vezes o corpo já inerte. O jovem tinha 19 anos." A cena tenebrosa, descrita pelo câmera Dan Furnard, da Associated Press Television News, ocorreu na quarta-feira 1º em Dili, capital do longínquo Timor Leste. Apenas dois dias antes houve um histórico plebiscito em que os timorenses foram decidir se queriam continuar fazendo parte da Indonésia – ganhando alguma autonomia –, ou se preferiam a independência.

As grandes expectativas geradas pelo impressionante comparecimento às urnas –mais de 98% dos 438 mil eleitores – e pela tranquilidade do pleito começaram a ser desfeitas nas horas seguintes pela ação violenta de paramilitares contrários à independência. Na quarta-feira 1º, grupos da milícia Aitarak (Espinha) armados com fuzis, facões e machetes ocuparam o centro de Dili e durante quatro horas e sitiaram o QG da Missão das Nações Unidas para o Timor Leste (Unamet), onde cerca de 300 timorenses tinham ido buscar refúgio. Vários edifícios foram incendiados.

Nos dias seguintes, as milícias ocuparam várias cidades, obrigando centenas de pessoas a abandonar o Timor, entre eles a equipe de jornalistas da BBC. "Eles estão incendiando tudo. Eles não respeitam ninguém, estão fora de controle. Eles estão enlouquecidos", disse um integrante da Unamet. Até sexta-feira 3, pelo menos dez pessoas tinham sido assassinadas pelas milícias, entre elas quatro funcionários locais da Unamet. Embora a Indonésia tenha destacado 15 mil policiais e soldados para manter a ordem durante o plebiscito, as forças de segurança se mostraram incapazes de controlar a violência, aumentando as suspeitas de que estariam fazendo causa comum com os paramilitares.

O resultado do plebiscito deve ser conhecido no início da semana, mas poucos duvidam que será amplamente favorável à independência. Tanto que a estratégia das forças pró-Indonésia está sendo a de subverter o resultado do plebiscito para provocar instabilidade no país. O Timor Leste foi um enclave português no arquipélago indonésio até 1975, quando Portugal, com o fim da ditadura salazarista, abandonou a colônia. A Frente Revolucionária do Timor Leste Independente (Fretilin) proclamou a independência. Com a conivência dos países ocidentais, tropas indonésias invadiram o país e, no ano seguinte, o Timor Leste foi anexado à Indonésia. Apesar do genocídio praticado pelos ocupantes – 200 mil mortos numa população de 800 mil –, o drama timorense foi ignorado pela opinião pública mundial até 1996, quando dois líderes da resistência – José Ramos Horta e o bispo Carlos Ximenes Belo – receberam o Prêmio Nobel da Paz. O líder da guerrilha, Xanana Gusmão, está preso em Jacarta desde 1992.