Nos seus bons tempos, Ratinho costumava fazer um gesto obsceno a cada instante em que seu programa no SBT batia a Rede Globo em audiência. Mais educado, Gugu Liberato preferia exibir um bonequinho saltitando na tela. A apresentadora Eliana Michaelichen, da Rede Record, cada vez mais em ascensão na simpatia dos telespectadores mirins, não se permite tais arroubos. Não só porque o Ibope aconselha que eles sejam evitados, como atitudes provocadoras não combinam com seu temperamento de moça bem-comportada. Atualmente, quando é avisada através do ponto eletrônico que seu Eliana & alegria está na liderança das manhãs, à frente do Angel mix de Angélica, ela esboça apenas um sorriso. “A sensação é ótima”, confessa ela, certa de que, no fundo, tem agravado um problema já crônico na programação infantil da Globo, que em breve deverá sofrer vários ajustes. Desde que retornou das férias em 26 de janeiro, Eliana vem sistematicamente ultrapassando a emissora carioca em momentos picados, mas ainda insuficientes para que ela seja considerada líder no horário.
 

Quase sempre nocauteia a novelinha Flora encantada, protagonizada por Angélica, que, coincidência ou não, está com os dias contados. Ainda que a vitória ocorra por uma margem pequena, Eliana comprova que não depende apenas da performance do viciante desenho japonês Pokémon, um dos trunfos de seu programa. Sua boa situação no Ibope acontece antes e depois do desenho sair do ar, quando está em cena. Aliás, uma das diferenças entre a apresentadora e as concorrentes é que nas quase três horas do infantil ela não se limita a ancorar desenhos animados. Mantém-se no vídeo durante mais de duas horas, com a façanha de ser a única a apresentar um infantil inteiramente ao vivo – um recurso precioso, já que pode esticar ou reduzir as atrações de acordo com a oscilação da audiência. Eliana aprendeu muito bem a trabalhar com estes números. Na segunda-feira 28, por exemplo, não se conformava com a fraca pontuação do desenho Pocket dragon. Insistia com a equipe que algo estava muito errado. Minutos depois, constatou-se que em alguns lugares de São Paulo a atração estava sendo exibida sem áudio, o que, lógico, dispersou os pequenos espectadores.
 

Aos 26 anos, Eliana vive seu melhor momento em 12 anos de carreira, contando o tempo em que cantava nos grupos A Patotinha e Banana Split. E progressivamente parece predestinada a ampliar as cifras tilintantes que têm sonorizado sua biografia. Desde que desembarcou em outubro de 1998 na Record – uma emissora sem a tradição de programas infantis no seu passado recente –, ela alavancou sua audiência em mais de 100%. Ou seja, começou derrapando nos três pontos e hoje atinge médias de sete e picos de 12, excelentes para o horário. Seus lucros cresceram na mesma proporção. Eliana desfruta de um salário mensal que, engordado pelos merchandisings, costuma ultrapassar os R$ 250 mil mensais. O que é uma ninharia em se tratando de Eliana. Seu nome movimenta R$ 40 milhões anuais. Hoje, é a maior vendedora de brinquedos no Brasil, segundo Synésio Batista da Costa, presidente da Associação Brasileira de Fabricantes de Brinquedos (Abrinq). “Em cerca de três anos, Eliana saiu do zero para se equiparar a Xuxa e Angélica na venda de brinquedos”, atesta ele. Entre suas proezas aritméticas ainda constam os lançamentos de oito CDs, todos com vendagens em torno de 250 mil cópias.
 

Mais famosa do que na época em que emprestava sua imagem ao SBT, na fase Record Eliana desfruta uma história bem diferente. O espaço no vídeo aumentou e a silhueta, antes à beira do rechonchudo, agora é esguia. Para tal, esculpiu a barriguinha sempre à mostra ao custo de muita ginástica e espartanas 300 abdominais diárias. Rotina que a mantém inalterável nos 50 quilos distribuídos em 1,62m. Com belas formas, fora da tevê adora os flashes fazendo par com o altivo publicitário Roberto Justus. “Quando me encontram na rua, meus fãs mandam beijinhos para o Roberto”, conta Eliana, cuja vida pública parece ser sempre cor-de-rosa e protegida de fatos mais picantes. Ainda mora com os pais e, entre seus sonhos de estrela em momentos de pessoa comum, quer ter filhos daqui a três anos. “Sou tranquila e não vai haver um escândalo a meu respeito”, garante. “Mas não quero ser perfeita. Faço programa ao vivo justamente para as crianças verem que sou um ser humano passível de erros.” Eliana, no entanto, não fala gírias e esforça-se para não fazer colocações gramaticais incorretas. Como não poderia deixar de ser, personifica o certo. Para mostrar o que é errado utiliza um parceiro de cena, o humorista Edilson Oliveira, que de manhã interpreta com eficiência o aparvalhado repórter Chiquinho e à noite comanda o nada recomendável Ed Banana, na mesma emissora.

Ecologia – Como criança, a apresentadora teve boas influências. Cresceu assistindo à A turma do lambe-lambe, programa de cunho educativo comandado pelo artista gráfico Daniel Azulay (leia quadro). A exemplo de seu guru, apela para o lado didático. Ensina trabalhos manuais e semanalmente traz o biólogo Sérgio Rangel para dar dicas sobre bichos e noções de ecologia que diz praticar no cotidiano em São Paulo. “Jamais jogo um papel na rua, e fico com raiva de quem faz isso.” Não se deve pensar, porém, que seu programa é todo educativo, ou seja, um novo Castelo Rá-Tim-Bum. Está muito distante da consagrada série exibida pela Rede Cultura. José Amâncio, diretor de Eliana & alegria, tem uma explicação pronta. “Televisão é para entreter, divertir e informar, não para ensinar tabuada ou substituir a escola ou os pais.” Eliana sabe disso. Tanto que, entre um e outro quadro mais didático, faz os mesmos merchandisings das concorrentes e convida os mesmos pagodeiros para contarem “intimidades”. Também traz crianças que rebolam ao som do axé. “Se elas querem dançar pode, mas desde que seja de forma decente, com um shortinho por baixo da saia. A graça não está na sensualidade precoce, e sim na ingenuidade da criança em imitar o artista”, justifica. Eliana faz sucesso, mas como se vê seu estilo loiro difere das outras apenas na questão semântica.

Professor Pardal
Sem nunca abandonar as indefectíveis gravatas borboletas coloridas e os suspensórios, Daniel Azulay sobreviveu nos últimos 25 anos a todos os fenômenos e modismos infantis na televisão – de Xuxa a bobagens como o seriado Power rangers. Azulay tornou-se famoso nos anos 70 comandando A turma do lambe-lambe, que consagrou personagens divertidos como a galinha Xicória, a coruja Dr. Pirajá ou a vaquinha Gilda, que foram, inclusive, atrações de um badalado musical infantil no Canecão, nos anos 80. Além dos tipos marcantes, o programa tinha um lado didático forte, com crianças aprendendo a desenhar e a fazer brinquedos com sucata doméstica. “Era uma forma de tirá-las da passividade”, lembra ele. Há dois meses, a Rede Bandeirantes transmite para todo o País o Oficina de desenho, com um Daniel Azulay em plena forma, aos 52 anos. “Nunca me considerei um produto da moda”, diz o apresentador, que continua entretendo com a mesma eficácia, recorrendo à tesoura, cola e papel e divertidas aulas de história. A produção peca pela modéstia, mas o resultado é excelente, como nos velhos tempos.