Fênix é a capital do Estado do Arizona, representado no Congresso americano pelo senador John McCain. Deveria também ser o animal símbolo da campanha que o mesmo senador move para alcançar a indicação do Partido Republicano à disputa presidencial. Considere-se: no intervalo de três dias, McCain deixou de ser considerado cinzas de um fogo de palha para retomar a liderança no arregimentar de delegados para a convenção do partido. Na mais empolgante rodada de eleições primárias para a escolha de pré-candidatos republicanos, McCain voltou à liderança na disputa contra o governador texano George Bush. O rebarbativo senador fora torrado nas primárias da Carolina do Sul, onde no fim de semana havia perdido por diferença de 11% dos votos. Mas já na terça-feira 22, no Arizona, junto à base eleitoral do Estado que representa, McCain arrematou 60% das preferências. No mesmo dia, em Michigan, o maior colégio eleitoral a votar até agora, o senador impôs estonteante derrota a seu rival, que sempre foi considerado o preferido pelo establishment republicano e contava com o apoio e recursos do governador local. Campanhas eleitorais americanas costumam ser como prolongados tratamentos com Valium. É difícil manter os olhos abertos até que se declarem vencedores. John McCain mudou este cenário e tem energizado um eleitorado que comparece em níveis recordes às urnas. Em todos os Estados onde o Partido Republicano realizou primárias, a procura por cédulas tem sido a maior de todos os tempos. E o que é mais importante: nem só republicanos de carteirinha estão cravando sua preferência pelo senador do Arizona. “A grande base eleitoral de John McCain, já se sabe, são os independentes e democratas, que em alguns Estados também podem votar na escolha de pré-candidatos republicanos”, diz Marin Fitzgerald, assessor e analista político do Partido Republicano em Nova York. “Os democratas estão ajudando a derrotar George W. Bush. Das duas uma: ou pretendem sequestrar o processo decisório republicano ou McCain está ressuscitando a rede de suporte montada pelo ex-presidente Reagan, com os chamados democratas de Reagan”, completa Fitzgerald.

Semelhança com Reagan – Deste modo, não é à toa que o senador já adotou como lema de campanha o slogan “A maioria de McCain”. Tem procurado também convencer o eleitorado de que ele é a imagem e semelhança de Ronald Reagan e suas credenciais têm as mesmas tendências conservadoras do ex-presidente. Até agora parece que o consenso intrapartidário procurado vem acontecendo. No dia seguinte às derrotas de Michigan e Arizona, o governador Bush se declarava vitorioso entre os republicanos e tentava mostrar que o processo de primárias do partido havia sido sequestrado por independentes e democratas. Estes últimos, de acordo com sua teoria, teriam como meta o coroamento de McCain, considerado um candidato mais fraco para fazer frente a Al Gore. A análise, porém, não condiz com os fatos, pesquisas recentes mostram que George W. Bush hoje em dia tem apenas 5% a mais das preferências de eleitores contra Gore, enquanto McCain já estaria com uma vantagem de 24% no confronto com o democrata. Mas é verdade que para receber a indicação de seu partido o senador ainda precisa aglutinar a sua volta mais republicanos de carteirinha. Na Carolina do Sul, no momento mais baixo de todo processo, Bush centrou baterias contra seu oponente usando os argumentos da extrema direita e da direita religiosa, dos quais ele havia prometido distância ao começar sua corrida à Casa Branca. A opção de cair nos braços dos conservadores sociais e da direita religiosa fez parte de uma tática desesperada. Bush sabia que se perdesse na Carolina do Sul sua candidatura estaria praticamente aniquilada. O clima de fim de festa depois da surpreendente derrota em New Hampshire era palpável no comitê do texano. Para reverter este quadro ele usou boa fatia de seu fabuloso cofre em anúncios de rádio e televisão pintando McCain como um esquerdista mais de acordo com o feitio dos democratas do que dos republicanos. Enquanto esta barragem de lama era erguida para descarrilar o senador, militantes de organizações como grupos antiaborto, a Coalizão Cristã e a National Rifle Association trabalhavam as bancadas de telefone em conversas ao pé do ouvido com os eleitores daquele que é um dos Estados mais conservadores da União. McCain procurou agir de modo presidencial e retirou sua publicidade mais ácida do ar. A manobra da ala Bush deu resultado e os republicanos foram em peso às urnas em seu apoio. Os analistas políticos esperavam que aquela tivesse sido a grande virada no jogo, e praticamente chegaram a anunciar o coma da candidatura McCain. O governador John Eglar, de Michigan, fora um dos primeiros a subir naquilo que se imaginava ser uma irresistível caravana da vitória de George W. Bush. “Em Michigan estamos construindo uma barreira de fogo contra insurgentes. Daqui não passa ninguém que não seja Bush”, dizia há meses o governador local, e repetiu o mantra no fim de semana anterior à votação. Mas o ambiente parecia estar mesmo carregado para o candidato do governador. Um eleitor, ao ser entrevistado saindo da votação, resumia a ópera: “Não votei em Bush, pois não quero que se crie aqui uma dinastia. Este país fez uma revolução em 1776 exatamente para se livrar de aristocracias e dos direitos hereditários ao poder”, disse, referindo-se ao parentesco entre George Bush, o ex-presidente, e seu filho candidato de agora. Quando as urnas foram abertas no Estado, McCain havia amealhado 50% dos votos, contra 45% de Bush.

Superterça – Os analistas políticos do país, mais uma vez surpreendidos, tentam agora novos prognósticos. Eles lembram que um candidato republicano dificilmente conseguirá receber a indicação do partido escudado apenas em votos de independentes e democratas nas primárias. É o caso de McCain, até agora. Já em campanha no Estado da Virgínia, palco das próximas primárias na terça-feira 29, McCain pretende colocar algumas de suas fichas até que chegue o momento da verdade na chamada “Superterça”, em 7 de março, quando 13 Estados – inclusive a Califórnia e Nova York, os maiores colégios eleitorais do país – vão as urnas. Naquela ocasião, nada menos do que 613 delegados – cerca de 60% dos 1.034 republicanos que vão escolher o candidato do partido na convenção – devem decidir de uma vez por todas se John McCain é mesmo fênix.