MISSÃO Se convencer seus pares a aprovar a reforma tributária, o deputado Palocci poderá dar a volta por cima no escândalo do caseiro e assim se credenciar para vôos mais altos

A agenda do deputado federal Antônio Palocci está tão cheia quanto nos seus tempos de ministro da Fazenda. E por uma boa razão. Palocci assumiu a presidência da Comissão Especial da Reforma Tributária da Câmara. Cabe a ele, portanto, tornar real um sonho que teve início ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, em 1999: dar ao País uma estrutura tributária mais simples e equilibrada, em que não haja tratamento diferenciado entre os entes da Federação. Diante do desafio de aprovar ainda este ano a mais recente proposta do governo Lula, Palocci tem circulado pelo País, em contatos incontáveis com governadores, prefeitos, empresários e sindicalistas. Em Brasília, é difícil encontrá-lo em seu gabinete. Sua movimentação também é intensa pelos corredores do Congresso e na Esplanada dos Ministérios. O ex-ministro garante que, "apesar da correria nos últimos dias", está sendo bem-sucedido em sua missão. "Meu primeiro trabalho é dar credibilidade à aprovação da reforma. Tento convencer meus próprios colegas deputados de que essa é a oportunidade possível", explicou Palocci à ISTOÉ.

Sua tarefa é árdua. Além das experiências frustradas entre 1999 e 2003, acredita-se que o ano político, com eleições para prefeito, não é o ambiente ideal para votar uma reforma tributária. Mas Palocci está otimista. "Com um trabalho concentrado, é possível fazer a reforma andar. Vamos votar na Comissão e na Câmara o mais rápido possível", prevê. Na verdade, Palocci sabe que o que está em xeque não é só o projeto do governo Lula. Com a volta à luz dos holofotes, também está em jogo o próprio futuro político do ex-ministro, que deixou o governo num rumoroso caso que envolveu a quebra de sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. Enquanto aguarda o julgamento do caso pelo STF, Palocci investe na reconstrução de sua imagem, num projeto cercado de moderação. "Não quero me colocar para planos políticos mais à frente. Prefiro fazer meu trabalho no Congresso e deixar que eventuais novas posições possam aparecer com o tempo", afirma. Sem pressa, o ex-ministro pretende ser reconhecido pelo desempenho no Parlamento. O resto virá como conseqüência natural.

No curto prazo, sua estratégia é arregaçar as mangas e usar de todos os argumentos a favor da reforma tributária. E ele está afiado como nunca. "É uma construção complexa. Estou falando com todos os interessados. O que favorece a aprovação é que a proposta é simplificadora dos tributos." As propostas anteriores, na opinião de Palocci, pecavam pelos excessos. A reforma atual é relativamente ambiciosa, mas simplifica os tributos. O ICMS, por exemplo, era regido por 27 leis estaduais e agora seguirá uma única lei. Outro ponto positivo, segundo o ex-ministro: se a reforma for aprovada, haverá um longo período de transição. "As mudanças vão até 2015, o que favorece a aprovação, pois os governadores não ficarão com medo de perder recursos." Palocci acredita que, com o impacto diluído em vários anos, os governadores tendem a ser mais favoráveis.

ALAN MARQUES/FOLHA IMAGEM

O ARTICULADOR Palocci trava debate na Câmara

 

Uma das principais críticas à proposta oficial está no fato de sua prioridade não ser a redução da carga tributária. Palocci entende a preocupação dos empresários. Mas acredita que a simplificação dos tributos pode alargar a base de arrecadação, reduzindo a pressão sobre os setores mais onerados hoje em dia. "A tendência é concentrar a tributação nas empresas formais, que acabam pagando muito. Com a base mais larga, será possível trabalhar com alíquotas menores", prevê, confiante em que o setor econômico só tem a ganhar com a reforma. "Ela é o caminho para a carga tributária menor", resume Palocci. Sobre a possibilidade de adotar um único IVA, medida defendida pelo senador e também ex-ministro da Fazenda Francisco Dornelles, Palocci não a desconsidera, mas ressalta que é prematura. "O governo fez o possível dentro da negociação com os governadores. Uma primeira etapa, com um IVA federal e um IVA estadual. A unificação não é uma idéia ruim, mas fica para o futuro", explica.

O grande problema dos projetos de reforma tributária sempre foi a reação dos governadores. Desta vez, porém, Palocci acredita que as arestas serão aparadas. E está se mexendo exatamente nesse sentido. Em sua peregrinação, ele procura mostrar que, com os dois IVAs, os governos estaduais não vão perder o poder de definir a incidência dos tributos. Embora reconheça as dificuldades, ele tem certeza de que a reforma tributária será aprovada até dezembro. "A Câmara está empenhada na votação. Devemos votar se possível nesse primeiro semestre. E o Senado já está adiantado nas discussões, com o grupo do Dornelles e do Tasso Jereissatti. Vamos levar o ano todo, mas vamos aprovar a reforma", afirma Palocci.

Empresários e políticos ligados ao ex-ministro fazem uma aposta ousada. Sustentam que, se Palocci for absolvido no STF e sair vitorioso na reforma tributária, seu nome voltará a ser cogitado para postos de primeiríssimo escalão. Os mais exaltados dizem que Palocci é um dos fiéis conselheiros do presidente Lula e, por isso, pode despontar como uma alternativa à sucessão de 2010. Decidido a comer o mingau quente pelas bordas, Palocci é mais prudente ao falar de seu futuro: "Tenho boa relação com o presidente Lula, mas um projeto como esse não está na minha perspectiva em nenhuma hipótese."

"Até dezembro, a reforma tributária será aprovada"

ISTOÉ – Qual sua prioridade à frente da Comissão da Reforma Tributária?
Antônio Palocci –
A primeira coisa é dar credibilidade no sentido de que a reforma tributária vai andar. Muita gente duvida de que a reforma será aprovada. A reforma é tentada há dez anos no Congresso.

ISTOÉ – E agora há chance real de aprovar a reforma?
Palocci –
Tenho de convencer os deputados de que essa é a oportunidade possível. Depois seriam necessários muitos anos para retomar uma reforma. Todos acham que não vai sair, não vai andar em ano eleitoral. Meu primeiro trabalho é mostrar à Comissão que, com um trabalho concentrado, é possível fazer a reforma andar. E votar na Comissão e na Câmara o mais rápido possível.

ISTOÉ – Esse trabalho já começou?
Palocci –
Já. Estou falando com todos os interessados. Algo que favorece a aprovação é o fato de que o governo mandou uma proposta simples. É uma mudança relativamente ambiciosa, mas simplificadora dos tributos. O ICMS, regido por 27 leis, passa a ter uma única lei. Um segundo dado importante: há um longo período de transição. Se for aprovada hoje, não entra em vigor amanhã. As mudanças vão até 2015, o que favorece a aprovação.

ISTOÉ – A aprovação sai este ano?
Palocci –
Até dezembro, a reforma será aprovada. Primeiro, porque a Câmara está bem empenhada na aprovação. Devemos votar no primeiro semestre. No Senado, as discussões estão adiantadas. O fato de ter um prazo de implantação mais longo permite que os governadores não fiquem preocupados com a receita do ano que vem. O que segurava muito as propostas de reforma era seu impacto imediato.

ISTOÉ – Mas há críticas pela falta de prioridade à redução da carga tributária.
Palocci –
Acabou de ser feita uma redução da carga, em cima da CPMF. Foi uma redução razoável. Além disso, com os impostos mais simples do que hoje, a tendência é que se alargue a base de tributação e possa tirar pressão sobre os setores que mais pagam. Hoje, a tendência é concentrar nas empresas formais, que acabam pagando muito. Se você simplifica, alarga a base. E pode trabalhar com alíquotas menores de impostos. O setor econômico vai ganhar com a reforma. A reforma é o caminho para a carga tributária menor.