Nos 50 anos de morte do presidente americano John Fitzgerald Kennedy, que acontece no próximo dia 22, um novo livro chega em meio à avalanche de lançamentos reunindo evidências, muitas delas inéditas, que mostram que a CIA e o FBI fizeram o que puderam para atrapalhar a descoberta do que seriam os verdadeiros motivos por trás da maior tragédia americana.

“Anatomia de um Assassinato – A História Secreta da Morte de JFK” (Companhia das Letras) vem sendo preparado pelo jornalista Philip Shenon há cinco anos.

Não o crime em si, mas uma intrincada parede de espelhos erguida para debelar e confundir as investigações que o sucederam costura as quase 700 páginas dessa grande reportagem. Integrante da turma de repórteres investigativos do jornal “The New York Times”, o autor deu de cara com dois grandes desafios: a escassez de fontes, uma vez que a maioria dos envolvidos já não vive, e a farta concorrência de teorias e versões sobre a morte de Kennedy, alvo de mais de 40 mil livros publicados, descontadas as ficções.

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ÚLTIMOS MOMENTOS
O presidente com sua mulher, Jacqueline,
momentos antes de ser alvejado: 50 anos de mistério 

Mas havia alguns vivos: James Hosty, agente do FBI responsável pela vigilância de Lee Harvey Oswald durante os meses que antecederam o crime, deu sua última entrevista ao jornalista, antes de morrer, em 2011.

E ao menos uma grande lacuna a ser preenchida no caso: a passagem de Oswald pelo México um pouco antes do assassinato, seu romance com uma mexicana e as ameaças que o atirador fez nesse momento à embaixada americana também nas vésperas do atentado – por escrito, inclusive.

Shenon foi atrás dos sobreviventes, da família de figuras centrais nas duas agências e no serviço diplomático da época e, cruzando esse material, mostra com detalhes que, se fosse mera teoria conspiratória achar que o assassino agiu em nome de interesses maiores, não haveria razão para as cúpulas do FBI e da CIA desaparecerem com cada um dos registros que atestavam os seus passos pouco antes do dia em que puxou o gatilho em direção à carreata, da janela do Depósito de Livros Escolares do Texas.

O relatório oficial da apuração comandada pelo então presidente da Suprema Corte dos EUA, Earl Warren, foi entregue ao novo presidente, Lyndon Johnson, sem nenhuma linha mostrando que Oswald era observado pelas agências antes do assassinato.

Para o jornalista, isso mostra, no mínimo, que a morte de JFK poderia ter sido evitada, uma vez que não se tratava de um anônimo escondido na multidão a apertar o gatilho, como consta do Relatório Warren, mas, sim, um homem na mira do FBI e da CIA.

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48 HORAS
O ex-presidente John Fitzgerald Kennedy, que governou os EUA de janeiro
de 1961 a novembro de 1963, quando foi assassinado. O médico da família
pediu que se omitisse a doença renal debilitante que escondia por trás
da maquiagem pesada. Abaixo, Lee Oswald, o atirador, minutos antes
de ser assassinado em Dallas, dois dias depois de sua vítima

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Desde o momento em que foi entregue, dez meses depois do assassinato, o relatório se tornou alvo de questionamentos e disparou uma contagem regressiva na popularidade de Johnson. Chegaram a ser suspeitos de mandantes o próprio vice-presidente (que, segundo as entrevistas colhidas pelo autor, estava tão apavorado nos dias posteriores que o leitor conclui por si por que a teoria não foi adiante), Fidel Castro e até Robert Kennedy, que a imprensa se referia como o Kennedy mais respeitado pela CIA.

Segundo o autor, essas especulações não levaram a qualquer conclusão devido ao desaparecimento de documentos como fotografias (queimadas e jogadas na privada de um motel) e bilhetes (rasgados e atirados na privada de um escritório da agência de espionagem). O afastamento de agentes como John Whitten, que deixou pistas de ter mais informações a dizer depois de ser demitido do alto de uma carreira brilhante na CIA, também continua intrigante. James Angleton, famoso caçador de espiões “que nunca achou um espião”, assinou uma carta que vetava qualquer investigação no México até a morte de todos os envolvidos.

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CASTELO DE CARTAS
Earl Warren entregou para Lyndon Johnson o documento que mobilizou toda a
inteligência americana. No relatório, que levou seu nome, não há menção aos passos
anteriores do assassino, sistematicamente acompanhados pela CIA e pelo FBI

Em 1977, o ex-embaixador americano no México Thomas Mann – em troca da promessa de Jimmy Carter de imunidade processual – confessou que recebera, nos dias seguintes ao crime, ordens de seus superiores para encerrar todas as investigações em curso no país. No relatório, afirmava que Silvia Duran, ex-castrista, era agente da CIA. E que Robert Kennedy “estava intensamente envolvido em atividade de contrainteligência em 1964.” Mann foi demitido pelo mesmo Angleton, alcoólatra famoso que teve sob seu controle todo o fluxo de informações do Relatório Warren.

Shenon conclui que a verdadeira razão da morte do JFK já não pode mais ser encontrada. Mas ter achado o que foi escondido deliberadamente pelas agências governamentais prova que teorias como o complô gay, a conspiração comunista e a motivação pessoal e solitária de Oswald (que, graças ao Relatório Warren, foi a que entrou para a história) não fazem sentido algum diante de documentos que encontrou e de outros que garante terem sido destruídos.

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