O engenheiro civil coreano Ming Feng Hsueh e a esposa, Yen, ainda acordam no meio da noite assustados com pesadelos. "Eu vejo rostos de pessoas saindo de uma cesta e me dizendo coisas que eu não entendo. Meu filho está no meio delas", disse Yen. O filho que aparece no pesadelo é Edison Hsueh, encontrado morto, em 23 de fevereiro de 1999, na piscina da Associação Atlética Oswaldo Cruz, na manhã seguinte ao trote dos calouros da Faculdade de Medicina da USP, em São Paulo. O corpo do então calouro de 22 anos apresentava escoriações. Edison não sabia nadar. Talvez as perturbações de Ming e Yen acabem quando a polícia souber exatamente o que aconteceu no dia do trote. Um ano depois, as coisas não parecem caminhar nesta direção. O delegado Marcelo Damas, que investiga o caso, diz que já perdeu as contas do número de depoimentos que tomou. "Não sei mais quantas pessoas ouvi, mas ainda não sabemos de nada. Estamos investigando, mas não temos novidades", afirma, sem descartar a hipótese de que as conclusões podem demorar. A promotora Eliana Pasarelli também disse que não há nada de novo, mas continua acreditando na hipótese de assassinato. "Estou convencida de que foi um crime", disse.

Entre os rostos que a mãe de Edison vê nos sonhos, está também o de Frederico Carlos Jaña Neto, o Ceará. O aluno residente do Hospital das Clínicas passou cinco dias preso, em abril de 1999, depois que chegou às mãos da polícia uma fita de vídeo em que ele, embriagado numa festa, dizia ter matado o calouro afogado na piscina. Por falta de provas, Ceará foi liberado e nunca mais foi ouvido pela polícia. Mas os pais de Edison não acreditam na inocência dele. "Estava bêbado, a consciência pesou e ele se traiu nas palavras. Se não foi ele, tenho certeza de que sabe quem foi", disse Yen, queixando-se da falta de empenho nas investigações. Ceará e os demais responsáveis pela violência do trote não sofreram represália nenhuma da USP. O inquérito interno da faculdade concluiu que não houve um crime e, portanto, nenhum estudante deveria ser expulso. Para a USP, o afogamento de um estudante em circunstâncias que, segundo a própria polícia, envolvem alunos veteranos, como Ceará, pode não ser um crime, mas uma das mais importantes universidades do País quer ver seu nome longe das páginas policiais. Este ano, as come-morações dos calouros da Medicina não foram festivas. O trote foi proibido, mas a lei do silêncio ainda impera.


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