Parece que somos realmente abençoados por alguma força divina, seja ela uma expressão cósmica ou uma entidade onipresente. Pelo menos essa é, por mais paradoxal que pareça, a conclusão a que chegaram dois proeminentes cientistas americanos. Ao contrário do que diziam há até pouco tempo vários de seus colegas do meio científico, eles tentam provar agora que a vida inteligente que existe na Terra é um fenômeno raríssimo, senão único. Em suma, é muito provável que estejamos sós no Universo. Todo o raciocínio dos cientistas Peter Ward e Donald Brownlee, ambos da Universidade americana de Washington, está detalhadamente exposto em livro recém-lançado nos EUA, Rare Earth (Terra rara) que já é objeto de grande polêmica nos mais renomados centros acadêmicos do Hemisfério Norte.

Pode-se dizer que o trabalho destes dois pesquisadores avança contra a maré de suposições e teorias colecionadas nas últimas décadas a partir do trabalho da chamada exobiologia. Eles não negam, porém, a possibilidade de que exista vida fora da Terra. Argumentam, no entanto, que as condições para que algum tipo de vida evolua a ponto de se transformar num ser inteligente são tão complexas e raras que não há sinais de que isso tenha acontecido em outras partes do Universo, a não ser na Terra. Para chegar a tal conclusão eles reuniram descobertas recentes de diversos campos da ciência, desde a astronomia e a geologia, passando pela paleontologia. "O que estamos fazendo é finalmente afirmar alto-e-em-bom-som o que muitos já pensavam há muito tempo", diz Ward, um paleontólogo especializado em extinções em massa. Ele e seu colega, o astrônomo Brownlee, afirmam no livro: "Quase todos os ambientes do Universo são terríveis para a evolução da vida. Ela só pode se desenvolver em Jardins do Éden como a Terra."

Bom, não é o que pensava uma comunidade de astrônomos que ganhou notoriedade nas últimas décadas. E que não mediu esforços para divulgar sua visão de um cosmo coalhado de civilizações alienígenas. Dois exemplos notáveis foram os dos americanos Frank Drake e Carl Sagan. Drake foi o primeiro a buscar nos céus ainda nos anos 60 sinais de rádio que pudessem conter alguma mensagem alienígena inteligente. Também foi o primeiro a elaborar uma equação matemática (que acabou recebendo seu nome) que determinava quantas dessas civilizações existiriam por aí: só a nossa galáxia, a Via Láctea, abrigaria cerca de dez mil raças alienígenas com inteligência suficiente para estabelecer uma comunicação interestelar. Um dos seus seguidores mais notáveis foi justamente Carl Sagan (falecido em 1996), que, além de astrônomo respeitável, foi um dos maiores divulgadores da astronomia para o público leigo – com o programa de tevê dos anos 70 Cosmos e, mais recentemente, autor da ficção que virou filme de sucesso, Contato.

Raridades
Mas, segundo as conclusões de Ward e Brownlee, a equação Dra-ke é otimista demais. "Mesmo sendo desarticulada, tal equação e as teorias que dela surgiram acabaram encontrando adeptos em um número cada vez maior de astrobiólogos", dizem os autores a respeito dos colegas que buscam evidências de vida extraterrestre. No livro, eles citam uma por uma várias características tão raras que precisam estar reunidas em um planeta para que ele passe a ser um Paraíso nos céus para a formação de uma vida tão complexa como a que desenvolve inteligência. Entre elas:

  • Uma órbita que mantenha o planeta a uma distância de sua estrela que garanta que sua água se mantenha líquida.
  • Uma lua com tamanho suficiente e órbita a uma distância que minimize qualquer mudança na inclinação do eixo do planeta, garantindo assim estabilidade no clima.
  • Carbono em quantidade necessária para o desenvolvimento da vida, mas que não ultrapasse o limite que começa a favorecer o chamado efeito estufa, como acontece no superaquecido planeta Vênus.

Além disso, a Terra se beneficia de uma posição no sistema solar e na galáxia onde os níveis de radiação cósmica não são altos. Mais: conta com a proteção de um planeta como Júpiter, o maior de nosso sistema solar, com tamanho que lhe dá uma gravidade que acaba atraindo para si – e impedindo uma trajetória que atinja a Terra – cometas e asteróides que poderiam destruir nosso planeta.

Nas considerações finais do livro, os dois cientistas não deixam de encorajar os necessários testes para confirmar sua teoria. Lembram que a nova geração de poderosos telescópios que estão sendo enviados à órbita terrestre podem ajudar nesse sentido, os dois autores concluem com um pensamento filosoficamente importante para toda a humanidade: "Tal hipótese aumenta o peso de nossa responsabilidade toda vez que uma planta ou animal é levado à extinção." Ward acrescenta: "Se somos tão raros como acho que somos, talvez seja nosso destino colonizar as estrelas, com a vantagem de que não encontraremos hordas ou legiões de civilizações hostis." Bom, poderia se dizer também que, se a ciência alimenta a ficção, é provável que os filmes de ETs estejam assim com os dias contados.

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