Na noite do domingo 25 de julho do ano passado, o todo-poderoso secretário de Ensino Superior do Ministério da Educação, Abílio Afonso Baeta Neves, promoveu uma reunião com donos de faculdades privadas no Hotel das Pedras, na cidade portuguesa de Coimbra, para dar alguns recados. Depois de falar sobre as metas do MEC para o segundo semestre, criticou o relacionamento da diretoria da Associação Nacional das Universidades Privadas (Anup) com o Ministério, numa velada campanha pela chapa de oposição que, um mês depois, disputou e perdeu a eleição pelo comando da entidade. Durante os três dias do Seminário de Verão, promovido em conjunto pela Universidade de Coimbra e pela Universidade Cidade de São Paulo (Unicid), Baeta, segundo vários reitores, aproveitou as conversas informais para cabalar votos para a chapa encabeçada por Rubens Lopes da Cruz. Nessa tarefa, ele foi ajudado pelo presidente da Comissão de Ensino Jurídico do MEC, Silvino Lopes. "Nego peremptoriamente qualquer envolvimento com o processo eleitoral da Anup", defende-se Baeta em carta enviada a ISTOÉ e que será publicada na íntegra na semana que vem. Patrocinador do seminário e pró-reitor da Unicid, Rubens Lopes bancou as despesas da viagem a Portugal de alguns convidados, entre eles duas secretárias do professor Edson Machado de Souza, o chefe de gabinete do ministro Paulo Renato Souza. Elas viajaram à revelia do chefe e, ao retornarem, foram punidas e afastadas do gabinete do ministro, mas continuam trabalhando no MEC.

A atuação de Abílio Baeta no MEC também é colocada em xeque em outra história muito estranha. Em agosto do ano passado, uma comissão de avaliação designada por Silvino Lopes foi verificar se o curso de Direito da Universidade de Guarulhos atendia aos requisitos para continuar funcionando. Durante a visita, o avaliador Alexandre Luiz Ramos sugeriu à coordenadora do curso de Direito, professora Miriam Freire Pereira, a contratação como consultor de Edmundo Lima de Arruda Júnior, seu orientador de tese de mestrado. Quatro dias depois, Arruda Júnior enviou uma correspondência à universidade oferecendo seus serviços por R$ 100 mil. Ele já havia feito o mesmo trabalho para outras 11 instituições de ensino. O reitor Antonio Veronesi levou o caso ao Conselho Nacional de Educação (CNE), que recomendou à Secretaria de Ensino Superior a imediata instalação de sindicância para apurar a denúncia. Abílio Baeta preferiu, porém, enviar uma nova comissão de avaliação. "A instituição não confirmou à nova comissão que teria havido envolvimento de qualquer um dos membros da comissão anterior na indicação de consultores para melhoria do curso", assegurou. ISTOÉ teve acesso ao relatório da segunda comissão que afirma ter o diretor do Centro de Ciências Humanas e Sociais da Universidade de Guarulhos, Paulo Rolim Rosa, confirmado a acusação contra Alexandre Luiz Ramos.

No forno
Mesmo com essa confirmação, a segunda comissão do MEC, em vez de recomendar a abertura de um inquérito, optou por transformar a denúncia em pizza. "Não houve dolo ou má-fé por parte do professor Alexandre, embora essa comissão recomende que as comissões de avaliação devem se omitir de oferecer sugestões desse jaez", conclui o relatório. Essa omissão tem uma explicação. Afonso Baeta e Silvino Lopes escalaram para investigar a denúncia o professor Paulo Luiz Netto Lobo, um velho conhecido do consultor Edmundo Arruda. Na época em que presidiu a Comissão de Especialistas da Ordem dos Advogados do Brasil, Paulo Lobo indicou justamente Arruda ao reitor Pedro Chaves dos Santos Filho para dar consultoria à Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região Pantanal. Pedro Chaves é sócio, no Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb), da professora Eda Machado, mulher do chefe de Gabinete do ministro da Educação.

Em conversa com ISTOÉ, o ministro Paulo Renato classificou as denúncias publicadas pela revista na edição 1584 de "fofocas", que seriam esclarecidas por Abílio Baeta: No ofício 1375, enviado a ISTOÉ na quinta-feira 10, Baeta praticamente repete as explicações que havia dado, por intermédio de um fax, uma semana antes. Faz também uma correção acertada. Diferentemente do que publicou ISTOÉ, disputam o mercado universitário brasileiro mais de 12 mil cursos. Em relação a Silvino Lopes, o ministro lavou as mãos: "Não foi uma escolha minha, ele foi indicado por uma entidade e em março sairá da Comissão de Ensino Jurídico." De acordo com o ministro, a forma de escolha dos integrantes do Conselho Nacional de Educação é definida em lei, que ele não pretende mudar. Apesar disso, a Comissão de Educação da Câmara vota nesta quarta-feira 16 requerimento de convocação do ministro. "A gravidade das denúncias publicadas por ISTOÉ faz com que pairem dúvidas sobre a lisura dos processos para a abertura de cursos no ensino superior, envolvendo o Conselho Nacional de Educação e a Secretaria de Ensino Superior do MEC", afirma o deputado Gilmar Machado (PT-MG), na justificativa para a convocação de Paulo Renato.

Falta de ética
A revelação por ISTOÉ da promiscuidade de entidades de ensino particulares com vários conselheiros repercutiu muito mal no Congresso. "Do jeito que está, não dá para continuar. Não me parece ético que façam parte do conselho representantes de empresas privadas que têm interesse direto nas decisões do CNE", diz o deputado Ubiratan Aguiar (PSDB-CE), primeiro secretário da Câmara e um dos principais especialistas em educação no partido do ministro. Membro da Comissão de Educação na Câmara, Gilmar Machado saiu à frente. Na última sexta-feira, ele e o deputado Walter Pinheiro (PT-BA) apresentaram projeto de lei que submete a nomeação de conselheiros à aprovação prévia da Comissão de Educação da Câmara. Enquanto a legislação não muda, metade do CNE será renovada no dia 21 de fevereiro, com a recondução de vários dos atuais conselheiros.