Uma história de família, narrada por um menino num romance de mistério, amor, morte e solidão. É uma boa trama, mas não o ponto mais forte de O ponto cego (Mandarim, 154 págs., R$ 18), da gaúcha Lya Luft, que tem como mola mestra a construção dos personagens através de um texto que começa suave e poético e aos poucos vai tomando o leitor. Lya desenha com refinada exatidão o menino que narra e tudo vê. Também assim são delineados os outros entes da família: a avó apavorada com as marcas do tempo, que faz plásticas até enlouquecer, a mãe medrosa e sonhadora, o pai com seu olho de vidro, o misterioso tio. O garoto espreita pelos cantos, à noite, para entender essa gente em quem não quer se transformar. Lidando com sentimentos de perda, amor e descoberta, a autora remexe com sensibilidade e ousadia num baú de família e tira de lá a inesperada visão de mundo de uma criança. Para não ser igual às pessoas que ele abomina, o Menino – assim mesmo, sem nome, porque ninguém no livro tem nome, a não ser o tio com quem ele se afina – decide parar de crescer. Da decisão desenrola-se o final da história em um texto carregado de mistério. Quando abre o ilimitado universo de pensamentos e fantasias infantis, Lya Luft também destampa as falsidades da vida adulta e sugere que o sonho pode ser perseguido, mesmo quando se perde a inocência.