Ele é discreto em tudo. O desempenho eleitoral é de menos de 1% de intenção de voto. A campanha no horário gratuito é curta e se limita a convidar o eleitor a visitar a sua home page. Mas nada disso impede que o candidato do PL à Prefeitura de São Paulo, Marcos Cintra, faça barulho, principalmente quando o assunto é debate na tevê e sua conturbada relação quando secretário do ex-prefeito Paulo Maluf. Pela primeira vez, Cintra conta a ISTOÉ por que brigou com o chefe e deixou o governo. Diz também por que entrou com uma representação na Justiça para impugnar o primeiro debate entre aqueles que disputam o Palácio das Indústrias. Sem sorteio, Cintra tinha ficado fora do primeiro bloco, formado pelos cinco mais bem votados e pelo ex-presidente Fernando Collor (PRTB), sétimo colocado nas pesquisas. A Justiça lhe deu razão e suspendeu na segunda-feira 21 o primeiro confronto entre os candidatos na tevê Bandeirantes. “Não estou bem posicionado, mas sou um candidato sério. Queria um debate digno. Ser humilhado eu não aceito”, explica Cintra.
Para o acadêmico que passou por Harvard e deputado federal atuante na comissão que analisa a reforma tributária, o único passaporte carimbado para o segundo turno é o de Marta Suplicy (PT). “Ela sustenta a primeira posição, tem uma campanha bonita. Por conta da sua origem e imagem entra na classe média”, avalia. Cintra, um liberal convicto, defende o polêmico projeto que restringe megacomércios para poder gerar empregos e está disposto a fazer valer sua tese do imposto único. Propõe ainda substituir todas as taxas municipais por um tributo a ser calculado em cima do uso do espaço urbano (R$ 5 por metro quadrado). Ele não descarta apoiar Marta, embora se mostre mais afinado com Luiza Erundina (PSB): “Não tenho acordo prévio, nem preconceitos.”

ISTOÉ – O sr. tem menos de 1% nas pesquisas e pouco tempo na tevê. Como espera crescer?
Marcos Cintra – É uma tarefa difícil, mas já houve candidaturas com poucas chances que cresceram muito em função da mensagem, do momento. A propaganda está começando, posso chegar a 6% e eu não represento a velha política.
ISTOÉ – O sr. já foi secretário de Planejamento de Maluf e líder de seu governo. Não teme o rótulo de malufista?
Cintra – Não me considero malufista. Desde 1994 estou no PL, um partido com vida própria. Em 1996, fui o vice do Rossi (PDT) contra o Pitta.
ISTOÉ – Por que o sr. saiu da Secretaria de Planejamento?
Cintra – Certas coisas que um prefeito pede não dá para fazer. Quando assumi a secretaria, em 1993, herdei um orçamento já aprovado. Existia uma inflação de 30% a 40% ao mês e a Lei de Diretrizes Orçamentárias dizia que a verba promocional era o equivalente a US$ 7,5 milhões. Era proibido o aumento desse valor. Na Lei Orgânica também não se podia suplementar essa verba. Maluf não tinha uma agência de publicidade e, na época, o secretário Edevaldo Alves da Silva foi quem orientou a licitação para a contratação. O edital demorou seis meses e a verba, devido à inflação, foi se corroendo. No meio do ano, estava em torno de US$ 2,2 milhões. Maluf não achava suficiente e queria que eu suplementasse essa verba para chegar a uns US$ 20 milhões. Por força desse desentendimento, saí da secretaria. Se tivesse feito isso, ele seria alvo de impeachment. Maluf deveria me agradecer por ter conseguido cumprir seu mandato.
ISTOÉ – Na sua opinião, quem vai para o segundo turno?
Cintra – A única com passaporte carimbado é Marta. O segundo nome está indefinido. Maluf disputa com Erundina. Romeu Tuma (PFL) e Alckmin (PSDB) cresceram após a propaganda. Mas quando a campanha apertar, o Tuma tem telhado de vidro e vai ficar numa situação difícil. O Alckmin tem o Covas atrelado à sua imagem e Maluf sofrerá ataques mais sérios.
ISTOÉ – O que fez o sr. impugnar o debate?
Cintra – A lei e a minha dignidade. Não houve sorteio. Concordei com dois blocos e eles disseram que eu iria para o segundo – que seria na terça-feira 22, num canal UHF, em outro horário e fora da programação – por estar numa segunda categoria. Não aceitei esse tratamento e a Justiça me deu razão. Encontrei com Erundina no avião e ela me parabenizou. Disse que nós candidatos temos que pôr um limite na prepotência da mídia.
ISTOÉ – O PL hoje é o braço político da Igreja Universal?
Cintra – O PL é um partido leigo. Recebemos em nossas fileiras gente de todas as religiões. O PL hoje tem dois deputados importantes da Universal: o bispo Rodrigues, do Rio, e o bispo Wanderval, meu vice. Podemos contar com o apoio deles sem ter a marca da Universal. O apoio da igreja é nos ajudar a montar a legenda em Estados onde a nossa estrutura é fraca.
ISTOÉ – O sr. disse que o próximo prefeito tem de fazer a cidade funcionar. De que forma?
Cintra – É fazer o arroz-com-feijão. Superar a limitação financeira e atacar o desemprego. Vivemos uma guerra civil com a crescente violência. O que assistimos é uma briga selvagem pela sobrevivência. Precisamos de uma abordagem emergencial para essa questão.
ISTOÉ – Qual seria essa ação?
Cintra – Na França existe a Lei Royer, criada em 1973, que obriga grandes comércios a detectar o impacto econômico que será causado na região antes de serem instalados. Temos em São Paulo megalojas, megacomércios, quase monopolizadores. Eles destroem a atividade econômica existente ao redor, principalmente o pequeno comerciante. Em Paris, o Carrefour só tem seis lojas. Poderemos até impor restrições à implantação dessas megalojas como um ataque à perda de empregos. Fazer isso não é ser atrasado ou retroceder no tempo. É defender o mercado e criar renda.
ISTOÉ – E a corrupção em São Paulo?
Cintra – Ela sempre existiu. A prefeitura sempre esteve envolvida em atividades de corrupção. Quanto à Câmara, é a mesma que esteve com Maluf e em gestões anteriores. Os escândalos apareceram porque Pitta perdeu o controle. A máquina ficou sem direção e cada um passou a usá-la em benefício próprio.