11/10/2013 - 11:12
Alfonso Cuarón contou certa vez que o cinema sempre fez parte de sua vida. "Nasci e cresci perto do estúdio Churubuscu, o maior do México, e sempre me senti atraído pelo universo misterioso por trás daqueles muros." Estudante de cinema, foi expulso do curso porque fez seu primeiro curta, "Vengeance Is Mine", em inglês. Já era uma carta de intenções, ou princípios. Cuarón fez filmes mexicanos ("E Sua Mamãe Também"), mas, com certeza, já vislumbrava a possibilidade de uma carreira hollywoodiana. Dirigiu o terceiro "Harry Potter" e deu um upgrade à série. Assina "Gravidade", que estreia nesta sexta-feira, 11, depois de abrir o Festival de Veneza.
É um grande filme – um dos maiores do ano. Encerra múltiplos desafios. Como ser intimista numa narrativa cheia de lances espetaculares? Como manter o público ligado o tempo todo em apenas dois personagens, e em suspenso? Digamos que ajuda bastante que esses personagens sejam interpretados por atores carismáticos, astros e estrelas como George Clooney e Sandra Bullock. Ela é a alma de "Gravidade". Toda a curva dramática, a ossatura do filme, converge para o desfecho. Num filme em que os personagens vivem o tempo todo fora do eixo, e sem gravidade – sem condições de se colocar de pé -, o desafio é justamente esse. O homem e a mulher foram feitos para ficar eretos. Para andar sobre os dois pés.
No material que a distribuidora Warner divulgou para a imprensa, Cuarón conta o deslumbramento que sentiu ao acompanhar a descida do homem na Lua. Queria ser astronauta, ou diretor de cinema. Realizou seu sonho. Existe uma história, muito sólida e sucinta, em "Gravidade". Um casal de astronautas perde-se no espaço. Todo o esforço dele e dela é para se manterem umbilicalmente ligados à nave e para voltar à Terra. Ela é uma cientista. No espaço, não existe som nem oxigênio. As temperaturas são extremas. A vida é impossível fora do casulo. A história é de uma luta extrema pela sobrevivência, narrada com rigor documentário. Cuarón já brincou dizendo que "Gravidade" é um documentário em Imax, com tecnologia de ponta, que não deu certo. Há um imenso voo poético, e é ele que faz a diferença.
Como reage, não só o físico, mas a mente humana, em condições extremas? É a pergunta que Cuarón se propõe em "Gravidade". E, a par do seu realismo, o filme comporta leituras metafóricas – a segunda chance e o retorno ao lar são temas hollywoodianos por excelência. À deriva no espaço, ela (Sandra) consegue verbalizar a dor causada pela morte da filha. Essa dor a paralisou, agora poderá inspirá-la. Quanto à volta ao lar, de "…E o Vento Levou" a "E.T. – O Extraterrestre" e "Apollo 13", o eterno retorno está na essência da produção de Hollywood. ‘Home’, lar. O extraterrestre de Steven Spielberg aponta o dedo para o espaço. Clooney e Sandra olham o maravilhoso espetáculo da Terra. A gigantesca bola azul os atrai, a atrai.
Tudo é simbólico e, ao mesmo tempo, só interessa a intensidade audiovisual. Exatamente 45 anos depois de Stanley Kubrick, Cuarón retoma e inverte a obra-prima "2001, Uma Odisseia no Espaço". Na aurora do mundo de Kubrick, logo no começo de 2001, o macaco põe-se de pé e brande o osso, iniciando um processo de desenvolvimento tecnológico que culminará, milhares de anos depois, na nave espacial. O corte monumental de Kubrick. A inversão de Cuarón até chegar ao seu homem erectus, à sua mulher. O mais interessante é que, gigantesco como é, esse é um filme que exige a participação do espectador para preencher os vazios do relato. Não é só a técnica, a dramaturgia também. Como visionário, Cuarón está vislumbrando o futuro do homem (e do cinema). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.