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COM QUE ROUPA EU VOU
Marina Silva decidiu que irá participar do processo
político em 2014. Falta definir o figurino

Na noite de quinta-feira 3, quando o Tribunal Superior Eleitoral rejeitou, por 6 votos a 1, o pedido de registro da Rede Sustentabilidade, teve início uma nova etapa na carreira de Marina Silva, ex-senadora, ex-ministra, titular de 19,6 milhões de votos na eleição presidencial de 2010 e segundo lugar em todas pesquisas de intenção de voto para 2014. Sempre capaz de reconhecer a diferença entre ganhar perdendo e perder ganhando,  Marina Silva despediu-se com palavras de ânimo do grupo de aliados que fez questão de acompanhar a decisão do tribunal ao vivo e a cores. “Não posso estar decepcionada. Hoje nessa corte disseram que nós temos requisitos para um partido: programa, representação social e ética. Temos o registro moral.”

Na sexta-feira 4, Marina decidiu prolongar a agonia de aliados  que esperavam uma decisão sobre seu futuro. “Amanhã eu darei uma resposta,” disse. “Eu ainda tenho uma noite e um dia.” Mesmo assim, deu sinais de que pretende ser candidata. “Quero mudar a polarização na disputa presidencial e contribuir para a política no Brasil”. A postura de Marina produziu reações exasperadas entre seus aliados, em particular parlamentares que necessitavam desesperadamente de uma definição até o sábado 5, para saber que rumo tomar antes do prazo legal para filiar-se a um partido político. Mas é um movimento que tem sua razão de ser.

Depois de receber a medalha de bronze em 2010, Marina passou os últimos anos ocupada em reforçar seu mito político particular. Mantendo-se longe de articulações obscuras que o eleitor identifica com um sistema político que rejeita, ela cresceu junto a cidadãos, especialmente jovens, que procuram “o novo” – aquilo que ninguém consegue definir direito o que é, mas  que todos acreditam identificar quando vêm. Com essa atitude, ganhou terreno junto aos brasileiros que estiveram na liderança dos protestos de junho e logo confirmou  primeira posição entre oposicionistas. Nessa situação, seria muita imprudência, menos de 24 horas depois da decisão no TSE, correr para buscar abrigo num dos diversos partidos que abriram as portas para abrigar sua candidatura. Seria difícil escapar da acusação de oportunismo, que pode ser amenizada após uma espera um pouco mais, quando devem chover apelos favoráveis a sua candidatura.

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CONCORRENTES
Sem a Rede, Eduardo Campos (PSB) e Aécio Neves (PSDB) tentam atrair a ex-senadora 

Quando falta exatamente um ano para a votação, os dados são preocupantes para a oposição. Com 38% das intenções de voto, Dilma Rousseff tem, em teoria, condições de liquidar a fatura já no primeiro turno. Seus adversários – Marina Silva, Aécio Neves, e Eduardo Campos – somam 32% dos votos. O detalhe é que Marina, sozinha, reúne a metade dessa votação. Caso uma candidata com essa estatura ficasse fora da disputa, Dilma poderia solidar a vantagem atual em bases ainda maiores. Segundo uma pesquisa do Ibope, divulgada na sexta-feira, destinada a levantar o destino dos eleitores que ficariam órfãos de Marina, a partilha seria favorável a Dilma, em quase 60%.  

Entre a candidata atual  e aquela que ficou com a medalha de bronze, em 2010, há uma diferença notável. Na campanha passada, Marina fez o papel de madrinha de José Serra. Seu crescimento garantiu o segundo turno na reta final, quando recebeu uma massa de eleitores evangélicos, permitindo a passagem de Serra na rodada final. A pergunta de 2014, que já provoca um  franzir de sobrancelhas entre estrategistas do palanque ao lado, é saber se, caso venha concorrer,  ela irá cumprir essa função de alavanca de candidaturas alheias, ou se terá oxigênio e musculatura para participar de um eletrizante segundo turno entre duas candidatas-mulheres e toda carga simbólica que isso significa.

O fator adverso para Marina manter uma boa saúde ao longo de toda campanha é um obstáculo de natureza semelhante ao que enfrentou para registrar a Rede. Sua candidatura tem um caráter essencialmente individual, sem apoio em articulações  orgânicas, que costumam cumprir um papel essencial na luta pelo voto em cada estado, cada cidade, cada periferia. “O partido de Marina não tem organograma mas personograma,” critica o deputado José Luiz Penna, presidente do PV, com quem a candidata rompeu antes de formar a Rede.  

Em 2013  Marina permanece fiel ao discurso ambiental, bandeira que teve o mérito de empunhar quando estava longe de ser uma moda ideológica. Mas seu mundo atual está longe do universo alternativo. Numa expressão do novo desenho político produzido no país uma década depois da chegada de Luiz Inácio Lula da Silva ao Planalto, Marina é hoje uma candidata que coleciona apoios entre personalidades acima de qualquer suspeita no universo da economia, das finanças e mesmo da Justiça. É sintomático que tenha cabido ao ministro Gilmar Mendes, do STF, dar o único voto favorável a Rede no TSE. “Estamos contando uma história que enche o Brasil de constrangimento,” disse o ministro, referindo-se à decisão da maioria de seus pares.

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No primeiro escalão dos conselheiros de Marina, encontra-se o economista André Lara Resende, um dos principais responsáveis pela política econômica do Fernando Henrique Cardoso, arquiteto do Plano Real e dos programas de privatização. Companhia de todas as horas – estava ao lado da candidata na sessão do TSE – a banqueira Maria Alice Setúbal é  uma das herdeiras do grupo Itaú, que teve um lucro líquido de R$ 7 bilhões no primeiro semestre de 2013. 

Assim que a rejeição ficou definida, por 4 votos a 0,  assistiu-se a uma debandada de deputados no plenário do TSE. Confiando no sucesso da empreitada, eles haviam esvaziado as gavetas nas legendas de origem. Já fora do PT, o maranhense Domingos Dutra, chegou a engasgar ao admitir que teria de filiar-se a Solidariedade, de Paulinho da Força, um antigo adversário, para seguir na carreira parlamentar. Queixando-se que haviam sido deixados num ambiente de “salve-se quem puder,” outros aliados tiveram uma conversa tensa e dura com Marina, que se prolongou até as cinco da madrugada. Um dos mais inconformados era um de seus aliados mais firmes e antigos, Alfredo Sirkis. Ele acusou Marina de lançar os parceiros numa situação de “salve-se quem puder” depois da rejeição do TSE.  

Créditos:Adriano Machado/divulgação