O capitalismo moderno tem uma série de defeitos, mas também muitas virtudes. Talvez a principal delas seja a livre concorrência entre as empresas. Quanto maior a competição entre elas, mais os consumidores se beneficiam – com preços menores e serviços melhores oferecidos por companhias desesperadas para superar um rival. Essa lógica, porém, corre o risco de desaparecer no mercado brasileiro de telefonia móvel. Na semana passada, um negócio fechado no Exterior deu margem a inúmeras especulações sobre o futuro das operadoras que atuam no País. A espanhola Telefônica, dona da Vivo no Brasil, anunciou que vai aumentar sua participação na holding que controla a Telecom Itália, dona da TIM. Significa que, na prática, a Telefônica passaria a controlar as operações nacionais tanto da TIM quanto da Vivo. Os números dessa união impressionam. Juntas, Vivo e TIM dominariam 55,84% do mercado brasileiro, com 150 milhões dos 268,4 milhões de celulares existentes por aqui. Restariam, para concorrer com elas, a Claro (com 25% de participação) e a Oi (18%). O que aconteceria com os consumidores se uma gigante comandasse mais da metade do setor no Brasil?

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A resposta é preocupante. “As promoções serão reduzidas, o que aumentaria o preço da conta”, diz Paulo Furquim de Azevedo, doutor em economia pela Universidade de São Paulo e ex-integrante do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) entre 2006 e 2009. “Além disso, para baratear custos as empresas não se preocupariam com a deterioração do serviço, uma vez que os clientes não teriam muita opção para escapar.” Isso tudo aconteceria em um setor já altamente problemático. As operadoras de telefonia lideram os rankings de reclamações nos órgãos de defesa do consumidor (a queixa mais comum é cobrança indevida, seguida por problemas no contrato e atendimento ineficiente). Também é duvidoso o efeito positivo que uma fusão desse porte traria para a economia como um todo. “Juntas, TIM e Vivo provavelmente vão demitir funcionários”, diz Cidinha Campos, secretária de Proteção e Defesa do Consumidor do Rio de Janeiro. A Associação de Defesa do Consumidor Proteste enviou ofício ao governo brasileiro solicitando que barre a atuação conjunta das duas maiores operadoras. “Temos um histórico de problemas de má prestação de serviço nessa área”, diz Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Proteste. Seu prognóstico é desanimador: “Vai piorar.”

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CRÍTICA
O ministro Paulo Bernardo criticou a possível união de Vivo e TIM,
mas foi desautorizado pela presidenta Dilma

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As empresas ainda não informaram os planos para o Brasil. Pela lei, elas têm que comunicar ao Cade a intenção do acordo. “Obviamente, o Cade não pode vetar atos que ocorrem fora da jurisdição brasileira, mas tem plenos poderes sobre o que tem impacto no Brasil”, diz o professor Azevedo, da USP. “Pode, por exemplo, obrigar que a TIM seja vendida para outro player no Brasil, o que, na prática, seria um bloqueio da operação.” Eduardo Tude, presidente da Consultoria Teleco e um dos maiores especialistas do País nessa área, também acha improvável que o Cade autorize a junção das companhias. Na semana passada, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, disse que a legislação brasileira impede que a Telefônica detenha ao mesmo tempo a gestão de Vivo e TIM no mercado nacional. “Um grupo não pode ser controlador do outro e manter duas empresas”, declarou o ministro, que depois foi desautorizado pela presidenta Dilma Rousseff. Segundo Dilma, “essa não é a posição oficial do governo, ainda”. Uma saída interessante para os consumidores seria a compra da TIM por outra operadora, o que devolveria ao mercado nacional a competição mínima necessária para não prejudicar os consumidores. Na semana passada, surgiram os nomes da americana AT&T e da britânica Vodafone como possíveis interessadas em adquirir a TIM. Se isso realmente acontecer, as velhas leis que regem um mercado saudável seriam restabelecidas.

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