A primeira surpresa foi a redução em 300 metros das pistas do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, para aumentar a segurança dos pousos. De público, Nelson Jobim, ministro da Defesa, foi aplaudido. A segunda surpresa veio três dias úteis depois, na terça-feira 18, quando ele anunciou que vai nomear a economista Solange Paiva, sua assessora, para a presidência da Agência Nacional de Aviação Civil, a Anac – e para isso pretende destituir o atual presidente, Milton Zuanazzi, um dos protagonistas da crise aérea. Mais uma vez, Jobim foi aplaudido. Mas a terceira surpresa ainda está por vir – e desta vez o consumidor vai pagar o preço. Em reação aos atos do ministro, as companhias aéreas preparam um tarifaço. Os aumentos dos preços das passagens já começaram discretamente, na forma de redução das promoções. Mas o plano das companhias é tirar nos próximos meses pelo menos R$ 400 milhões extras do consumidor, com novos aumentos, em especial nos vôos para Congonhas, como forma de compensar os supostos prejuízos acumulados por meses de caos aéreo e pelos atos de Jobim. Atos como encurtar a pista de Congonhas. Para as companhias, Jobim tem sido um problema. Para Jobim, o problema são as companhias. Ele acha que o setor havia virado um caos (e virou mesmo), que a Anac trabalhava para favorecer as empresas (e trabalhava mesmo), e que ele foi chamado à Defesa para pôr ordem na casa. Ele avisa que vai fazer sua parte, ainda que seja preciso impor ordem-unida no velho estilo dos generais da linha-dura. “Daqui para a frente será assim”, disse Jobim a um interlocutor.

Assim como? Os bastidores que precederam seus dois atos nos últimos dias são exemplos cristalinos do estilo Jobim. Primeiro, a pista de Congonhas. Há duas semanas, o ministro foi visitado por José Afonso Assumpção, dono da Líder táxi aéreo. Desde que caiu o Airbus da TAM, em julho, os jatinhos executivos, proibidos de pousar em Congonhas, foram desviados para Jundiaí. Assumpção levou a Jobim um estudo técnico de dois engenheiros recomendando encurtar as pistas de Congonhas, 150 metros de cada lado, a fim de criar áreas de escape. Isso é essencial para a segurança. Jobim pegou o estudo e o mandou para o presidente da Anac. Detalhe: deu 48 horas de prazo para a Anac enviar parecer. Milton Zuanazzi devolveu o ofício no dia seguinte informando que a Anac não tinha condições de, naquele prazo, analisar assunto tão delicado. Nem sob o ponto de vista técnico, nem jurídico, nem econômico. E ainda avisou que o ministro não tinha poderes legais para decidir tal assunto. O oficio de Zuanazzi chegou a Jobim na manhã de quintafeira 13. Naquela tarde, Constantino Júnior, dono da Gol, foi ao Ministério tentar falar com Jobim sobre assuntos da companhia. O ministro não o recebeu. Mandou-o se entender com a assessora Solange Paiva. Enquanto os dois conversavam, Jobim entrou na sala e avisou de sopetão que encurtaria Congonhas. “Tem algum problema?”, indagou. “Se o senhor acha que é em prol da segurança, tudo bem, vamos cumprir”, respondeu Constantino. Jobim agradeceu, virou as costas e saiu. A conversa não durou dois minutos. Na seqüência, Solange ligou para Marco Bologna, presidente da TAM, a fim de comunicar a decisão. “Vamos cumprir”, respondeu o executivo. Zuanazzi soube da decisão naquela noite pelos telejornais.A troca de Zuanazzi por Solange também ilustra bem o estilo Jobim. Há dois meses Jobim e Zuanazzi andam às turras. O ministro já conseguiu levar quatro diretores da Anac a pedir demissão. Três já saíram e outro aguarda o substituto. Mas não consegue remover o presidente. Com mandato do Senado e protegido da ministra Dilma Rousseff, Zuanazzi resiste. Como Renan Calheiros, ele tem avisado a quem interessar possa que não se afasta do cargo em hipótese alguma. Dilma, é verdade, o estimula a resistir. Naquela quinta- feira 13, por exemplo, enquanto Jobim preparava-se para passar o trator, Zuanazzi almoçava com emissário do Palácio do Planalto. “Não vou sair”, disse. “E se lhe oferecerem a presidência da Embratur?”, indagou o interlocutor. Zuanazzi, egresso do setor de turismo, respondeu: “Nem que me ofereçam o Ministério do Turismo.” O mandato dos diretores das agências reguladoras é do Senado. Mas o cargo de presidente é escolha do presidente da República. O interlocutor insistiu: “Lula pode destituí- lo da presidência”. E Zuanazzi: “Não tem problema, não perco o mandato, posso ficar como diretor.” Jobim decidiu anunciar a ascensão de Solange na noite de terça-feira. Em paralelo, o relator da CPI do Apagão Aéreo da Câmara, deputado Marco Maia, do PT, anunciou que vai recomendar que Zuanazzi e a ex-diretora da Anac Denise Abreu sejam indiciados como responsáveis pelo acidente da TAM. “Não saio”, avisou Zuanazzi na mesma noite. No dia seguinte ele consultou Dilma e depois avisou: “Não saio.” E agora, Jobim? Aguardem pelo próximo trator.