Um grande passo foi dado na semana passada para revitalizar o centro velho de São Paulo. Entre os ruídos estridentes do trânsito da metrópole existe agora um oásis da mais pura harmonia musical. Inaugurada na sexta-feira 9, a Sala São Paulo de Concertos é a nova sede da Orquestra Sinfônica do Estado e ocupa o que foi o jardim interno da estação de trem Júlio Prestes. Construída entre 1926 e 1938, ela é um dos principais monumentos históricos de São Paulo e, ainda hoje, é ponto de partida e chegada de trens metropolitanos. Pelas plataformas de embarque,circulam diariamente 32 mil pessoas e elas estão a apenas 50 metros do palco onde, na inauguração, o maestro John Neschling regeu a Sinfônica de São Paulo. "A sala é tão importante para a orquestra quanto um estádio é para um time de futebol. Só com o campo bem cuidado é possível jogar bem", explica o maestro. Nesta semana de inauguração, a sala recebe uma série de concertos, entre eles o do maestro Roberto Minczuk (leia entrevista à pág. 118). Os amantes da música podem estranhar, mas o som dos trilhos não vai ferir o das tubas ou dos violinos.

Sob a batuta do arquiteto Nelson Dupré e do engenheiro Ismael Solé, a obra foi realizada em dois anos e transformou a Júlio Prestes na primeira sala sinfônica da América Latina. Toda a acústica do local ficou sob responsabilidade de um dos maiores especialistas no assunto em todo o mundo, o arquiteto americano Russel Johnson. "Nosso maior desafio foi isolar o interior dos barulhos externos num prédio já existente. Posso dizer que o resultado foi o melhor possível", diz Johnson. Ele ressalva, contudo, que o trabalho ainda não acabou. "Pode levar ainda um ano ou mais para ficar pronto. Faltam pequenos ajustes." A sofisticação da sala é tanta que há um forro móvel, construído abaixo do teto, que pode ser movimentado verticalmente 24,5 metros, adequando-se a diversos tipos de concertos. "É como poder colocar um aparelho de som na sala, ou no banheiro, de acordo com a música tocada", compara o engenheiro Solé. Desse modo, a sala se torna quase um outro instrumento. Os camarotes e as cadeiras da platéia são de madeira, para funcionar como uma caixa acústica, e são apoiados em pastilhas de neoprene, uma espécie de borracha, num sistema de suspensão que evita a vibração vinda dos trilhos. A principal preocupação do arquiteto Nelson Dupré era manter o estilo clássico do prédio. "O paulistano é autofágico, por isso tínhamos que fazer uma intervenção feroz preservando a arquitetura original." A Júlio Prestes, estação tombada pelo Patrimônio Histórico de São Paulo, pouco foi alterada. Os olhos do público, e agora também os ouvidos, agradecem.