Era uma algazarra sem tamanho. O apresentador do programa, fantasiado de palhaço ou bufão, tinha uma buzina estridente pendurada no pescoço. Sem a menor cerimônia, jogava farinha e bacalhau no auditório. E o pessoal achava o máximo. A sonoplastia era hilariante – gritos histéricos, grunhidos de animais e o batuque de panelas em cima do fogão. Mal dava para ouvir o calouro exibir seus dotes artísticos. Se o pobre do cantor novato escorregasse na afinação ou no ritmo, levava na hora um buzinaço. Mas se ele galgava as notas musicais com talento e galhardia, bem, aí ganhava um abacaxi como prêmio. O patrono da bagunça, Abelardo Barbosa, o Chacrinha, era um "Charles Chaplin subdesenvolvido", segundo a definição do dramaturgo Nelson Rodrigues. Mas para muitos era um caso clássico de internação em hospício. A intelectualidade tupiniquim torcia o nariz e se espantou quando o sociólogo francês Edgar Morin, em visita ao País, na década de 60, elegeu o anárquico animador de platéias um fenômeno da comunicação de massa. Com o dom do improviso e senhor de uma alegria circense, Chacrinha comandou durante três décadas um picadeiro eletrônico. "Quem não se comunica se trumbica" era o lema preferido do apresentador. Outro bordão (quando julgava um calouro diante do público): "Vai para o trono ou não vai?" Ele foi. Onze anos depois de sua morte, Chacrinha, com 25 votos, é o primeiro da lista dos Comunicadores mais destacados do século XX. A relação de 30 nomes foi elaborada por um seleto júri especialmente para o projeto Brasileiros do Século de ISTOÉ. Agora, caberá ao leitor de ISTOÉ escolher aqueles que terão suas biografias publicadas no final de agosto em encarte especial.

Nas pegadas do Velho Guerreiro Chacrinha, estão jornalistas consagrados como Samuel Wainer e Mino Carta, ambos com 24 indicações. "Wainer foi um grande nacionalista e merece estar entre os destaques do século", afirma o comentarista político da Rede TV (ex-Manchete), Carlos Chagas, que integrou o júri. Em 1949, em entrevista histórica e exclusiva a Wainer, Getúlio Vargas rompeu um silêncio de quatro anos e anunciou, solenemente, direto de sua fazenda, em São Borja (RS), que voltaria ao palco da política brasileira – de onde sairia, quatro anos depois, dando um tiro no coração. A estreita cumplicidade entre Vargas e Wainer ajudou a tocar o jornal Última Hora, fundado pelo jornalista que nasceu na extinta Bessarábia e deixou seu nome registrado na história do País. Última Hora sobreviveu ao suicídio de Vargas, mas mudou de dono quando Wainer foi obrigado a deixar o Brasil com o movimento militar de 1964. Já Mino Carta, italiano de Gênova, é o responsável direto pela criação de algumas das mais bem-sucedidas publicações brasileiras da segunda metade do século, como Istoé, Jornal da Tarde e as revistas Veja, Senhor e CartaCapital. Entrou para o jornalismo porque desejava arrumar dinheiro suficiente para a compra de um bonito terno azul. Seu talento pode ser medido por algumas façanhas, entre elas, a de criar a revista Quatro Rodas, especializada em automóveis, sem jamais ter dirigido um carro.

A relação dos indicados ao prêmio inclui também os humoristas Aparício Torelli (o Barão de Itararé), Millôr Fernandes e Henfil. O leitor de ISTOÉ tem a ótima oportunidade de premiar uma categoria que, por sua própria natureza anárquica e avessa a rótulos, não tinha sido até agora contemplada. Pena que Chico Anysio e Jô Soares, cada qual com quatro votos dos jurados, não tenham alcançado o patamar mínimo (sete indicações) para figurar na lista de concorrentes ao prêmio. Também foram lembrados pelo júri os comediantes Mazzaropi, Ronald Golias, Dercy Gonçalves (esta já foi eleita na categoria Artes Cênicas) e Regina Casé. Outro nome que ganhou votos, mas não entrou na relação definitiva é o de Euclydes da Cunha, já eleito um dos Escritores do Século. "Os Sertões foi a maior reportagem da história da imprensa do Brasil", protesta Heródoto Barbeiro, apresentador do programa Opinião Nacional, da TV Cultura de São Paulo, e um dos jurados. A nominata inclui ainda empresários como Assis Chateaubriand, Roberto Marinho, Victor Civita e Júlio Mesquita, que poderão muito bem voltar a concorrer na eleição dos Empreendedores do Século. Bom de voto, sem dúvida, é Nelson Rodrigues. Eleito um dos Artistas Cênicos do século, ganhou também um lugar entre os destaques em Literatura e, agora, mesmo sem entrar na relação definitiva dos candidatos ao prêmio, foi lembrado pelo júri de Comunicação. Ao contrário do que ocorreu na eleição para o Cientista e Educador do Século, em que não havia concorrentes do sexo feminino, desta vez, pelo menos uma mulher está presente na lista de indicados – Hebe Camargo. "Ela tem uma carreira consolidada. É a nossa Chacrinha de saias", diz a colunista de política Dora Kramer, do Jornal do Brasil, que integrou o júri.

No total, foram citados 263 nomes pelos jurados, entre eles, os radialistas Zé Bettio e Gil Gomes, o fotógrafo Sebastião Salgado e até o cantor Ney Matogrosso. O patamar mínimo para entrar na lista de indicados ao prêmio foi de sete votos. Foram os casos de Flávio Cavalcanti (apresentador de televisão líder de audiência nos anos 60 e início dos 70), Paulo Barreto (ou João do Rio, cronista do princípio do século que exaltou os costumes tipicamente cariocas), José Bonifácio Sobrinho (o Boni, que implantou o padrão de qualidade da Rede Globo) e Júlio Mesquita (fundador do jornal O Estado de S.Paulo). O leitor de ISTOÉ, já elegeu Ayrton Senna (categoria Esportista), Chico Buarque (Músico), Fernanda Montenegro (Artista Cênica), Machado de Assis (Escritor), Oscar Niemeyer (Arquiteto) e Irmã Dulce (Religiosa). Agora, tem a tarefa de escolher os brasileiros mais destacados em Comunicação. Só não vale buzinar no ouvido do candidato nem gritar: "Ele merece! Ele merece!"

 

Para todos os gostos …
De empresários de comunicação a humoristas

Chacrinha (1915-1988) Pernambucano de Surubim, Abelardo Barbosa popularizou a linguagem da mídia eletrônica. Animador de programas de auditório na televisão como o Cassino, a Discoteca e a Buzina do Chacrinha, cursou a Faculdade de Medicina no Recife, mas logo descobriu a verdadeira vocação. Inventou bordões que, 30 anos depois, ainda continuam como: "Quem não se comunica se trumbica." 25 votos

 

Samuel Wainer (1912-1980) Natural da extinta Bessarábia (hoje República da Moldova), chegou ao Brasil ainda bebê. Depois de cobrir a Segunda Guerra Mundial, consagrou-se ao entrevistar Getúlio Vargas. Após cinco anos de ostracismo, o ex-ditador anunciava a intenção de disputar a eleição presidencial de 1950. Wainer fundou Última Hora, que apoiou o segundo governo de Getúlio. 24 votos

Mino Carta (1934) Nasceu em Gênova, na Itália. Considerado um "príncipe" da imprensa brasileira, fundou e dirigiu as revistas ISTOÉ, Quatro Rodas, Veja, Senhor e CartaCapital. 24 votos

Assis Chateaubriand (1891-1968) Natural de Umbuzeiro (PB), foi jornalista e político. Fundou um dos mais poderosos impérios de comunicação do País, os Diários Associados, que exerceu influência na política durante quatro décadas. Foi senador pela Paraíba (1951) e pelo Maranhão (1955). Imortal da Academia Brasileira de Letras, criou o Museu de Arte de São Paulo (Masp). 19 votos

 

Cláudio Abramo (1923-1987) Ingressou em O Estado de S.Paulo, em 1948. Em 1952, reformulou o veículo tornando o noticiário mais objetivo. Em meados dos anos 60, passou para a Folha de S.Paulo, escrevendo artigos políticos e combatendo a ditadura militar. 19 votos

Roberto Marinho (1904) Presidente das Organizações Globo, é um dos mais influentes jornalistas do País. Em 1925, herdou o jornal O Globo. Comanda a Rede Globo de Televisão, a maior do Brasil, e ocupa a cadeira nº 39 da ABL. 19 votos

Paulo Francis (1930-1997) O carioca Franz Paulo Trannin da Matta Heilborn adotou pseudônimo de Paulo Francis nos anos 50. Tentou o teatro, mas destacou-se como crítico polêmico. A partir da década de 70 passou a viver em Nova York, tornando-se colunista dos jornais Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo. 17 votos

 

Heron Domingues (1924-1974) Lendário locutor de notícias. Era o apresentador do Repórter Esso e foi o primeiro a noticiar o final da Segunda Guerra Mundial, em 1945. 16 votos

Silvio Santos (1935) O carioca Senor Abravanel, com dez anos de idade, já exercia o talento da comunicação como camelô no Rio. Popularíssimo animador de programas de auditório, desde 1981 tem seu próprio canal, o SBT, a segunda maior rede de televisão do País. 16 votos

Millôr Fernandes (1924) Carioca, o papa do humorismo brasileiro adotou o pseudônimo de Vão Gogo, nos anos 50, e criou a seção O Pif-Paf na revista O Cruzeiro. Fundador de O Pasquim, trabalhou em Istoé até o início dos anos 90. Dramaturgo e escritor, é dono de um humor que não se prende a partidos ou ideologias. 16 votos

Barbosa Lima Sobrinho (1897) Natural do Recife (PE), formou-se em Direito (1917). Na década de 20, mudou-se para o Rio para trabalhar no Jornal do Brasil, no qual ainda mantém uma coluna. Foi proclamado Jornalista Emérito pelo Sindicato dos Jornalistas de São Paulo. 15 votos

Carlos Lacerda (1914-1977) Político e jornalista, o carioca Carlos Frederico Werneck de Lacerda militou no Partido Comunista e se tornou uma das principais lideranças conservadoras do País. Em 1949, fundou a Tribuna da Imprensa, que marcaria posição contra Getúlio Vargas. Tentou impedir a posse do presidente Juscelino Kubitschek. Eleito deputado federal pela UDN (1954) e governador da Guanabara (1960), foi um dos principais líderes civis do movimento que derrubou João Goulart em 1964. Em 1968, foi cassado pelos militares. 14 votos

David Nasser (1917-1980) Um dos melhores repórteres brasileiros de todos os tempos. Paulista de Jaú, trabalhou na época áurea da revista O Cruzeiro, que liderou o mercado de mídia impressa até a década de 60. 13 votos

 

Victor Civita (1907-1990) Fundador da Editora Abril, cuja primeira publicação foi o Pato Donald, em 1950. Em 1966, lançou a revista Realidade e, dois anos depois, Veja. De família italiana, nasceu em Nova York e veio para o Brasil em 1949, naturalizando-se. 12 votos

Roquette Pinto (1884-1954) Carioca, Edgard Roquette Pinto introduziu a radiodifusão no Brasil com a fundação da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, em 1923, atualmente a Rádio Roquette Pinto. 11 votos

 

Alberto Dines (1932) O carioca Dines foi o único jornalista brasileiro a cobrir a Guerra dos Seis Dias (1967). Foi criador da revista Fatos e Fotos, editor-chefe do Jornal do Brasil e colunista político da Folha de S.Paulo. 11 votos

 

Júlio Mesquita Filho (1892-1969) Como diretor de O Estado de S.Paulo, apoiou a Revolução de 1932 e combateu o Estado Novo de Getúlio Vargas. Manteve a linha liberal do jornal ao longo das décadas e teve problemas com o regime militar de 1964. 11 votos

 

Aparício Torelli (1895-1971) Suas sátiras políticas marcaram a primeira metade do século. Jornalista e humorista conhecido como Barão de Itararé, nasceu em São Leopoldo do Sul (RS). No Rio, lançou o periódico humorístico A Manha (1926). 10 votos

 

Sérgio Porto (1923-1968) Cronista e humorista carioca, era conhecido como Stanislaw Ponte Preta. Foi redator dos jornais Última Hora, O Jornal e Tribuna da Imprensa. Suas obras como Rosamundo e outros (1963) é uma bem-humorada crítica aos costumes brasileiros. 10 votos

 

Hebe Camargo (1929) A grande dama da tevê já completou 55 anos de vida artística e continua no auge do sucesso. Fez parte do elenco de radioteatro da Rádio Tupi e da TV Tupi nos anos 50. Está há 13 anos no SBT. 9 votos

 

Joel Silveira (1918) Sergipano, foi o primeiro repórter a cobrir as ações da Força Aérea Brasileira (FEB) na Itália durante a Segunda Guerra Mundial para os Diários Associados. 9 votos

Henfil (1944-1988) O humorista mineiro Henrique de Souza Filho criou os lendários personagens Zeferino e Graúna e direcionou seu humor contra a impunidade e a miséria. 9 votos

Elio Gaspari (1944) Ex-editor da revista Veja (1969-1973; 1993-1994), Gaspari nasceu em Nápoles, na Itália, e veio ao Brasil com cinco anos. Naturalizou-se em 1985. Atualmente, é colunista dos jornais O Globo, Folha de S.Paulo e Zero Hora. 8 votos

 

Carlos Castello Branco (1920-1993) Um dos mais importantes cronistas políticos de sua época, Castelinho, como era conhecido, manteve de 1949 até sua morte a Coluna do Castello, no Jornal do Brasil. Nasceu no Piauí. 8 votos

Péricles (1924-1961) O caricaturista pernambucano Péricles de Andrade Maranhão criou na revista O Cruzeiro o Amigo da Onça, figura irreverente que fez grande sucesso nos anos 50. 8 votos

Ibrahim Sued (1924-1995) Um dos maiores colunistas sociais, tornou famosos vários socialites e inventou expressões como "Em sociedade, tudo se sabe". 8 votos

Júlio Mesquita (1862-1927) Fundou O Estado de S. Paulo, em 1875, e o dirigiu até morrer. Natural de Campinas (SP), participou do governo provisório de Prudente de Morais, mas se opôs ao de Rodrigues Alves. 7 votos

 

Paulo Barreto (1881-1921) Cronista que assinava com o pseudônimo de João do Rio, tinha como matéria-prima a vida tipicamente carioca do início do século. Em 1920 fundou A Pátria, no qual fez campanha contra a candidatura de Epitácio Pessoa. 7 votos

 

Flávio Cavalcanti (1923-1986) Era o "senhor dos domingos" na televisão da década de 60 com o programa Flávio Cavalcanti, exibido pela TV Tupi, do Rio. Criou o bordão "um instante, maestro". 7 votos

José Bonifácio de Oliveira Sobrinho (1936) Durante três décadas, Boni foi o responsável pela programação da Rede Globo e criou o famoso padrão Globo de qualidade. Nascido em Osasco, deixou a vice-presidência de operações da emissora em 1997. 7 votos

 

Júri privilegiado
Um time com nomes também consagrados

Wagner Carelli Diretor de redação da revista República

 

Graça Caldas Jornalista, professora do Programa de Pós-graduação e coordenadora do curso de Jornalismo da Universidade Metodista de São Paulo

 

Augusto Nunes Diretor de redação da revista Época

 

Moacir Japiassu Colunista da revista Jornal dos Jornais

 

Ricardo Kotscho Diretor de jornalismo local (Rede Bandeirantes/SP)

 

Dora Kramer Colunista do Jornal do Brasil

 

Mônica Teixeira Apresentadora do programa Opinião Nacional (TV Cultura)

 

Tão Gomes Pinto Diretor de redação da revista Imprensa

 

Roberto Elísio de Castro Silva Diretor de redação dos jornais Estado de Minas e Diário da Tarde

 

Ricardo Noblat Diretor de redação do Correio Braziliense

 

Ricardo Boechat Colunista do jornal O Globo

 

Jacques A. Wainberg Professor de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio Grande do Sul

 

Luis Fernando Gomes Editor-executivo do jornal O Dia

 

Francisco Camargo Chefe de redação do jornal Gazeta do Povo / Curitiba

 

Raimundo Lima Diretor de redação do jornal Tribuna da Bahia

 

José Marques de Melo Titular da Cátedra da Unesco de Comunicação do Brasil (Universidade Metodista de São Paulo), co-fundador e ex-diretor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (USP)

 

Florestan Fernandes Júnior Apresentador do Jornal da Rede TV

 

Sandro Vaia Diretor de redação da Agência Estado

 

Carlos Chagas Comentarista político da Rede TV

 

Delmo Moreira Editor-executivo do jornal Gazeta Mercantil

 

Marcelo Parada Diretor de jornalismo da Rádio Bandeirantes AM

 

Luiz Gonzaga Mineiro Diretor de jornalismo da Rede Record

 

Heródoto Barbeiro Apresentador do Opinião Nacional (TV Cultura) e do Jornal da CBN

 

Márcia Benetti Machado Chefe do departamento de Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

 

Marcos Cardoso Diretor de redação do Jornal da Cidade / Aracaju (SE)

 

Caco Barcellos Repórter especial da Rede Globo

 

Marco Antonio Araujo Coordenador do curso de Jornalismo da Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero e diretor de redação das revistas Educação e Ensino Superior

 

Ali Kamel Editor-chefe do jornal O Globo

 

Oliveiros Ferreira Jornalista de O Estado de S.Paulo

 

Boris Casoy Âncora do Jornal da Record, da Rede Record