O BNDES está colocando em risco uma privatização de mais de US$ 1 bilhão. A queixa foi feita diretamente ao ministro da Fazenda, Pedro Malan, por Paulo Oscar França, vice-presidente do IRB Brasil-Resseguros, cuja venda está programada para agosto ou setembro deste ano. Com voz pausada, porém firme, França avisou que o banco estava cometendo sérios erros em relação à formatação do leilão da estatal responsável pelo resseguro no Brasil – um mercado que hoje gira em torno de R$ 1 bilhão e atende às grandes empresas brasileiras que compram o seguro do seguro para se proteger contra grandes riscos. As reclamações vêm se avolumando desde abril, quando os dados do IRB ficaram disponíveis aos interessados em arrematá-lo. Das dez empresas habilitadas a visitar virtualmente a empresa, quatro o fizeram e saíram frustradas. Listaram cerca de 500 itens sem resposta. "Esta privatização está sendo conduzida de forma equivocada e a culpa é do BNDES que contratou empresas de consultoria que não entendem de resseguro. Vender o IRB não é o mesmo que vender uma Vale do Rio Doce. Quem entende de resseguro no Brasil é o próprio IRB. E mais ninguém. Pois faz isso há 60 anos." Os dois consórcios contratados pelo governo foram a Ernst & Young Consultores/Máxima Consultoria e a N.M. Rothschild & Sons.

As desavenças entre o IRB e o BNDES são apenas uma parte do imbróglio. Os consumidores de resseguro também estão insatisfeitos com a idéia de abertura de mercado que vem sendo defendida pelo governo. Dez versões da regulamentação do setor já foram escritas. O ponto mais polêmico é a intenção de manter uma reserva de mercado para o IRB pós-privatização por um prazo de dois anos. Cerca de 60% do resseguro nacional continuaria passando pela autarquia. "Não temos interesse em comprar nenhuma reserva de mercado. Esta medida servirá apenas para atrair resseguradores de segunda linha", avalia o diretor da subsidiária brasileira da maior resseguradora mundial, a alemã Münchener do Brasil, Walter Polido. As reclamações são compartilhadas pelos executivos da Swiss Re – a segunda maior resseguradora no ranking mundial. "Estamos acostumados a trabalhar em mercados abertos, não temos intenção de investir um dinheirão no IRB para comprar reserva de mercado", comenta o diretor Henrique Abreu Oliveira. O preço mínimo do IRB ainda não foi anunciado, mas especula-se que poderia ficar em torno de R$ 1,6 bilhão. Este valor vem sendo considerado alto e há um consenso no mercado de que a privatização do IRB, assunto de responsabilidade do Ministério da Fazenda, está sendo vista como forma de atrair o máximo de recursos financeiros para o Brasil. E mais: dizem ainda que as empresas de consultoria contratadas estão sugerindo um preço alto porque vão ganhar um percentual sobre o valor de venda e não sobre o número de horas trabalhadas.

O disse-que-disse em torno da privatização do IRB cresce a cada dia, o que vem atrasando sua venda. Para que o leilão ocorra até setembro, a regulamentação do setor deveria ser anunciada até o final do mês – o que não está fácil. Nos últimos dois anos, o IRB vem sendo preparado para ser vendido. Paulo França, que é funcionário de carreira do Banco Central, foi convidado pelo próprio Malan para enxugar a empresa e prepará-la para a quebra do monopólio. A operação de limpeza reduziu o número de pessoal de 1.500 para 525 funcionários. Um encontro de contas com o Banco do Brasil resultou na extinção de US$ 600 milhões em débitos que pesavam sobre os resultados do IRB. "Quando cheguei aqui, o IRB era uma caixa-preta. Transformamos o órgão numa sociedade anônima para torná-lo mais transparente", comenta Paulo França. Segundo ele, o Brasil é um excelente mercado para resseguro já que, ao contrário de outros países, não tem catástrofes naturais – como furacões e maremotos – e poderá movimentar até R$ 10 bilhões após a privatização do IRB. Como homem de confiança do governo na sede do IRB, no Rio, França não está escapando às críticas em torno desta privatização. Executivos do mercado desconfiam que ele estaria torcendo para que o consórcio vencedor da privatização do IRB fosse aquele que tivesse a BrasilSeg – seguradora do Banco do Brasil. O interesse do BB no IRB não chega a ser uma novidade. Há cerca de dois anos, executivos do banco vêm anunciando que são potenciais candidatos.


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