Em 26 de março de 1999, um programador cheio de más intenções enviou um e-mail a um fórum de discussão na Internet. Anexado, havia um programa simples e letal chamado Melissa, que se ativou quando usuários incautos copiaram mensagem para seus PCs. O agente infeccioso vasculhou-os à procura do programa de correio eletrônico Outlook, da Microsoft. Ao achá-lo, Melissa se replicou, enviando cópias de si mesmo via e-mail a 50 nomes da lista de endereços do Outlook. Processo idêntico se repetiu nos destinatários, realimentando uma corrente de progressão geométrica. Uma semana depois, a epidemia era global. Embora quase inofensivo – Melissa não destrói dados dos PCs que atinge –, infectou 100 mil máquinas e paralisou os servidores de correio eletrônico da Microsoft e da Intel. Nunca se viu um estrago tão rápido. Seu método automático de multiplicação, diferente dos vírus que precisam ser ativados por uma ação do usuário – como a abertura de um arquivo – tornou Melissa o primeiro espécime de uma nova categoria infozoológica, a dos vermes.

Um mês depois, em 26 de abril completaram-se 13 anos da explosão do reator nuclear de Chernobyl, na Ucrânia. Programado para agir nessa data, um vírus homônimo que havia contaminado computadores da Ásia acordou, apagando as memórias de 600 mil PCs coreanos e 100 mil de Taiwan. Enquanto o FBI e a Interpol prendiam os autores do Melissa (um americano de Nova Jersey) e do Chernobyl (um estudante de Taiwan), em 6 de junho eclodiu a terceira epidemia. Cepas de um agente desconhecido chegaram aos laboratórios das empresas produtoras de antivírus nos EUA e no Japão. Soou o alerta vermelho. Centenas de especialistas mergulharam numa corrida contra o relógio para achar a cura do bicho, batizado de Explorer.zip. Mutante, aliava características de verme, como a transmissão por e-mail do Melissa, com o poder virulento-destrutivo do Chernobyl. A vacina saiu em 18 horas. Mas o contágio estava fora de controle. Até 11 de junho, o Explorer.zip paralisou os servidores da Microsoft, Intel, Boeing e AT&T, deletando todos os arquivos dos programas Word, Excel e PowerPoint (da Microsoft) à sua frente.

Ainda não se identificou o autor do Explorer.zip, mas três pandemias em 70 dias comprovam que os vírus estão mais frequentes – e perigosos. "Há 12 meses, havia 13 mil vírus", diz Fernando Silva, da Symantec, que faz o antivírus Norton. "Hoje, são 41,9 mil." Segundo a Associação Internacional de Segurança em Computadores (Icsa), a cada mês emergem mil novos vírus. Já a consultoria IDC estima que, em 1998, eles causaram perdas globais de US$ 6,5 bilhões em equipamentos e horas de trabalho. Não houve grande empresa ou banco que escapassem ilesos – embora ninguém o admita.

Igual a seus homônimos biológicos que evoluem para despistar os antibióticos, os infovírus mutam para sobreviver. "Um dia após a detecção do Melissa, havia 18 variações", diz José Roberto do Valle, da Trend Micro. Essa mutação acelerada é razão direta da explosão da Internet, conectando 200 milhões de computadores. "Em 40 milhões de lares dos EUA com PCs, existem adolescentes. Se 0,1% produzir vírus, são 40 mil autores", diz Valle. Mas não são apenas os moleques americanos que soltam essas feras. "Muitos vírus vêm da Escandinávia, Rússia, Japão e Israel. Uns 200 são brasileiros, como o Leandro e Kelly", revela Silva, da Symantec, para quem esses garotos são os melhores programadores que há. Em questão de minutos, pegam um vírus na rede, adicionam um dado qualquer e passam a mutação à frente. Rebeldes sem causa, não se confundem com o hacker, o pirata do ciberespaço ladrão de cartões de crédito. "O hacker quer lucro. O criador de vírus é um vândalo virtual", diz Fernando Fontão, da Network Associates (NAI), que faz o McAfee. "Faz danos que sobressaiam. Busca o reconhecimento da turma. É o pichador eletrônico de muro", diz Valle, da Trend.

 

Bill Gates – Essa é a razão pela preferência pela Microsoft. O objetivo não é alvejar o homem mais rico do mundo, mas atingir o máximo de usuários possível. "Pra que fazer um vírus para Linux ou Unix?", argumenta o executivo da NAI, referindo-se aos programas concorrentes do Windows, dono de 90% do mercado. Os números comprovam. Dos 41,9 mil vírus, 64 são para Unix e dois para Linux. O resto é Windows. Então como se proteger? Os especialistas são céticos. Para eles o problema só tende a crescer à medida que mais usuários entrem na rede e seja possível acessá-la do celular ou do carro. "Assustar a molecada não resolve. Quanto mais proibido, mais vírus criarão", pondera Valle, da Trend. Imersos nessa selva virtual, nossa única proteção é ter um antivírus com as vacinas mais recentes. E rezar para não sermos infectados por um novo agente nas poucas horas antes de surgir seu antídoto.