Quando fui escalada para sentir na pele como é “viver verde”, achei que fosse tirar de letra. Afinal, aprendi desde criança a evitar o desperdício, não sou consumista e me preocupo com a preservação do meio ambiente – do desmatamento da Amazônia ao bem-estar das capivaras que habitam as margens dos rios Tietê e Pinheiros, na capital paulista. Durante uma semana, eu deveria seguir à risca a orientação de ambientalistas para que a minha presença causasse o menor impacto possível no planeta. Nos primeiros minutos de reflexão, percebi que sete dias numa espécie de ecolaboratório seriam insuficientes e que os leitores de ISTOÉ poderiam ter a impressão de que desembarquei na Terra para uma experiência bizarra. Que diferença algumas horas fariam numa vida inteira? Adiantaria tomar banho de canequinha só até esta edição chegar às bancas?

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Eu não me perdoaria se, em vez de estimular ações permanentes e cotidianas, transmitisse a ideia de que só os radicais podem fazer a diferença. Convicta de que minha mãe tem razão ao repetir o antigo ditado “de grão em grão, a galinha enche o papo”, saí à caça dos grãos. Li bastante sobre o assunto e entrevistei especialistas. Ao reavaliar os meus hábitos, notei que muitos deles poderiam ser modificados sem traumas. Comecei fechando o chuveiro enquanto me ensaboo e passo xampu. Parece uma mudança trivial, mas não é. Passei anos me demorando no banho. E não foi por falta de informação. Aprendi tempos atrás que os recursos naturais são finitos e que excessos tornam necessária a construção de novas hidrelétricas. Eu precisava de foco. Pensava na vida debaixo do chuveiro, a água era minha terapia. Lavava o corpo e a alma. Mas, em nome da consciência ambiental, resolvi comprar um divã… de couro sintético.

Depois de reduzir o banho em uns dez minutos – e economizar de 30 a 60 litros de água por dia e vários reais na conta de luz –, inspecionei as torneiras. Não encontrei nenhuma pingando. Também comecei a policiar o meu marido. Ele tinha mania de fazer a barba, escovar os dentes e lavar a louça com a torneira escancarada. Ouvia minhas reclamações desde sempre e ficava bravo. Agora, por causa desta reportagem, aceita minhas sugestões de forma amigável. E está me ajudando a adequar nossa casa. “O que está aprontando desta vez?”, perguntou outro dia. Eu tentava botar uma garrafa PET de dois litros dentro da caixa da descarga para diminuir o volume de água lançada no vaso sanitário. Mas era muito grande. Parti para o plano B: um frasco de xampu de 300 ml e um de sabão líquido 500 ml. Deu certo.

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DESAFIO É possível se tornar mais verde em qualquer lugar, mesmo numa metrópole como São Paulo

Reflexão Fiquei incomodada ao constatar que parte das mudanças na minha rotina não ocorreu antes porque eu agia no piloto automático. Por que o ser humano tem dificuldade de parar para refletir e adia decisões importantes? Há anos sei que lâmpadas fluorescentes compactas são, em média, 60% mais econômicas que incandescentes (amarelas), mas só agora tomei a iniciativa de testá-las. Instalei uma no corredor de entrada e outra no escritório, exatamente as que ficam mais tempo acesas. Gostei. A luminosidade é boa e a luz branca deixa o ambiente mais bonito. Decidi substituir todas as amarelas remanescentes.

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Algumas pessoas podem achar que fiquei mais chata: às vezes, me pego explorando letrinhas miúdas de rótulos ou questionando minhas próprias escolhas. Eu acredito ter me tornado mais consciente. Há três semanas, comprei uma mesa de jantar. Fiquei feliz porque estava difícil encontrar uma do tamanho que queria e consegui um bom desconto. Ao deixar a loja, meu marido lembrou que não perguntei se a madeira usada na base era certificada (de área explorada legalmente). Primeiro senti culpa. Só então entendi que o mais importante não foi o erro, mas a reflexão que veio depois. Quando fui comprar uma sandália de presente de Natal para a minha mãe, questionei a vendedora sobre a procedência do couro. Ela fez cara de espanto e disse que não sabia. Saí sem levar nada. “Muitos consumidores não percebem o poder que têm”, diz Heloísa Mello, gerente de operações do Instituto Akatu – uma ONG cuja missão é difundir a importância do consumo sustentável. “Ser consciente não significa abrir mão do conforto, mas saber escolher.”

Perigo “O modelo atual está nos levando ao colapso. Se não tomarmos providências, não é o planeta que vai deixar de existir, é o homem”, afirma Irineu Tamaio, coordenador do Programa de Educação para Sociedades Sustentáveis do WWF-Brasil. Uma das responsáveis pelo desmatamento na Amazônia, por exemplo, é a pecuária. Se cada cidadão diminuir um pouquinho a ingestão de carne vermelha estará ajudando a salvar a floresta e diminuindo a emissão de gases do efeito estufa. Eu botei mais frango na geladeira. “Qualquer pessoa pode ter atitudes verdes”, diz Leandra Gonçalves, do Greenpeace. Há uma porção de dicas interessantes na internet. Fuçando na rede, descobri que um litro de óleo jogado no ralo pode contaminar um milhão de litros de água. Comecei, imediatamente, a juntar o óleo usado para reciclagem.

Tenho certeza de que a minha contribuição não é insignificante para o planeta. E que há pessoas que podem fazer mais do que eu. Outras, menos. Mas todo mundo pode fazer um pouco. Recentemente, me mudei para perto do trabalho e vi que não fazia sentido manter um carro. Ele ficou empoeirando na garagem, enquanto eu chegava à redação de carona ou de ônibus – e foi vendido justamente na tarde em que termino de escrever este texto. Não vou defender que todos abandonem seus automóveis e corram para o transporte coletivo, cada um sabe da própria vida e o que pode ser adaptado. Eu pretendo fazer mais. O meu compromisso verde não acaba com o fim desta reportagem. E o seu?

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