Confira, em vídeo, imagens fortíssimas que mostram adultos e crianças mortos ou agonizando:

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Para os Estados Unidos, não resta dúvida: o ditador Bashar al-Assad usou armas químicas no massacre que, há duas semanas, matou centenas de civis – muitos deles mulheres e crianças – no subúrbio de Damasco, na Síria. “Nós concluímos que o governo sírio de fato os executou”, disse o presidente americano Barack Obama numa entrevista à rede de tevê PBS, referindo-se aos ataques. “Se é assim, é preciso haver consequências internacionais.” Essa pode ter sido a ação de armas químicas mais letal desde 1988, quando milhares de curdos foram mortos pelo efeito de gases lançados pelas forças de Saddam Hussein no Iraque. Nas palavras do vice-presidente Joe Biden, o primeiro a revelar que a posição de cautela dos EUA havia mudado graças a informações vindas do serviço de inteligência, o que se deu na Síria foi nada menos do que um crime “hediondo.”

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O apoio imediato dos tradicionais aliados dos americanos comprovou que o cenário de guerra se aproxima. França e Turquia se uniram a uma possível coalizão depois que China e Rússia bloquearam, no Conselho de Segurança da ONU, uma resolução proposta pelo Reino Unido que autorizaria o uso da força. David Cameron, primeiro-ministro britânico, interrompeu o recesso de verão do Parlamento para convocar apoio à intervenção, argumentando que era do interesse de todos manter o “tabu internacional” contra o uso de gases venenosos no campo de batalha. Como lembrou o jornal “Guardian”, foram oito intervenções ocidentais em países árabes ou muçulmanos nos últimos 15 anos e cujos resultados são duvidosos. Falando aos deputados, Cameron fez questão de dizer que, dessa vez, a situação é diferente da Guerra do Iraque, de 2003. “Não estamos invadindo um país à procura de armas químicas ou biológicas”, afirmou. O argumento não foi suficiente e o Parlamento votou contra a ofensiva na quinta-feira 29. Sem seu mais fiel aliado, a Casa Branca sinalizou que estaria disposta a uma ação unilateral.

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DIPLOMACIA
Ban Ki-moon, da ONU (acima), e David Cameron,
premiê britânico, não chegaram a um acordo

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O foco, nesse caso, estaria em centros militares e bases aéreas. A estratégia esperada pelos analistas envolve lançamentos de mísseis Tomahawk por navios de guerra e submarinos localizados no Mar Mediterrâneo. Como um “ataque punitivo” a Assad, não deverá durar mais do que três dias. Antes disso, porém, os EUA e seus aliados precisam justificar legalmente a ação. Para muitos especialistas, os argumentos pró-intervenção são baseados em suposições e não em evidências inequívocas e informações públicas. Para os governos ocidentais, o motivo é “humanitário” e tem como objetivo “deter e dissuadir” o uso de armas químicas. Superada essa etapa, há outros riscos envolvidos. “O primeiro é de o ataque não alcançar nem os objetivos militares de curto prazo nem os objetivos políticos de longo prazo”, disse à ISTOÉ Robin Wright, pesquisadora do U.S. Institute of Peace e do Woodrow Wilson Center, de Washington. Segundo ela, ataques militares são infrutíferos a não ser que venham acompanhados por ações diplomáticas que ofereçam propostas para encerrar o conflito sírio. “Outro risco é ampliar a guerra ao legitimar ou aprofundar o envolvimento de forças estrangeiras, principalmente o apoio iraniano e russo a Damasco”, afirmou Robin.

Há não muito tempo a maior dor de cabeça de Obama na política externa, o Irã, aliado de Assad, tem poder para ampliar a crise na região. Isso porque os parlamentares mais inflamados já estão pressionando o novo presidente Hassan Rohani, um moderado perto de seu antecessor, a avançar sobre Israel como tática de retaliação. As consequências desse cenário são imprevisíveis. Segundo a Agência Internacional de Energia Atômica, o país acelerou, nos últimos três meses, a expansão de sua capacidade para enriquecer urânio, o que alimenta os temores internacionais de que Teerã produza uma bomba atômica. Israel avisou que, se for atingido, responderá militarmente. Por outro lado, embora os americanos tenham deixado claro que o objetivo de uma intervenção não seja derrubar o governo de Assad – muito provavelmente porque não há uma força política suficientemente unificadora e pacífica para substituí-lo –, o enfraquecimento do ditador com o ataque pode beneficiar radicais islâmicos da oposição, o que inclui membros da Al Qaeda e do Hezbollah.

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ZONA DE COMBATE
Acima, à esquerda, soldados leais a Assad mostram suas armas em Aleppo.
Navio de guerra americano chega ao Mar Mediterrâneo

Além da sombra da invasão ao Iraque há dez anos, cujos argumentos de que Saddam Hussein possuía armas de destruição em massa foram amparados em informações falsas, pesa sobre as potências ocidentais o futuro dos sírios para além das armas químicas. “Dos 100 mil sírios que morreram no conflito, é muito maior o número dos que foram atingidos por balas e ataques de artilharia do que por sarin ou outros produtos químicos letais”, disse, em relatório, Daniel Byman, diretor de pesquisas do Saban Center for Middle East Policy do Instituto Brookings, de Washington. “Então, mesmo que os EUA sejam capazes de fazer a Síria parar de usar armas químicas, por si só isso salvará poucas vidas.” Richard Haass, presidente do Council on Foreign Relations, segue a mesma linha de raciocínio. Em conversa com jornalistas, ele questionou: “Se fizermos esses ataques, para mandar uma mensagem sobre as armas químicas, mas o regime continuar a matança de sírios por meios convencionais, ainda poderíamos considerá-los úteis ou até bem-sucedidos?”

Na espera pelo pior, os moradores de Damasco intensificaram nos últimos dias o ritual que seguem desde o início da guerra civil e correram aos supermercados, bancos e caixas eletrônicos. Pão, água, comida enlatada, baterias e alimentos não perecíveis estavam no topo das listas dos consumidores, de acordo com relato da agência Reuters. Ao mesmo tempo, os russos aceleraram a retirada de seus cidadãos de território sírio. Desde janeiro, 730 deles deixaram o país em aviões oficiais que levam à Síria ajuda humanitária e saem de lá carregados de pessoas para quem essa guerra já foi longe demais. O problema é que ela pode estar apenas começando.

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IMPOPULAR
Para Joe Biden, vice-presidente dos EUA (acima), o ataque com armas químicas a
Damasco há duas semanas foi -hediondo-. Mas, para muitos britânicos que foram
às ruas protestar (abaixo), a intervenção militar não é a melhor resposta

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