Primeiro foi no Ceilão (atual Sri Lanka). Quando Sirimavo Bandaranaike tornou-se chefe de governo de seu país em 1960, ainda não se passara um ano do assassinato de seu marido, o primeiro-ministro Solomon Bandaranaike. Em 1986 os filipinos derrubaram o ditador Ferdinand Marcos para garantir a eleição de uma mulher para a Presidência. Era Corazón Aquino, viúva do líder oposicionista Benigno Aquino, morto a tiros três anos antes. Benazir Bhutto virou premiê do Paquistão em 1988, transformando-se na primeira mulher a liderar um país muçulmano. Seu pai, o presidente Zulfikar Ali Bhutto, fora deposto em 1977 e executado em 1979. E Begum Khaleda Zia ganhou as eleições em Bangladesh exatamente dez anos depois do assassinato do marido, o presidente Zia Rahman, durante um golpe militar em 1981. A roda da fortuna agora está prestes a vingar o pai da independência da Indonésia, o presidente Achmed Sukarno, afastado em 1968, três anos depois do sangrento golpe militar que instalou a ditadura do general Suharto. O instrumento do destino de Sukarno é sua filha e herdeira política Megawati Sukarnoputri.

No domingo 6 ela deu o primeiro passo para presidir o maior país muçulmano do mundo. Nas primeiras eleições livres desde 1955, quase 130 milhões de eleitores indonésios foram às urnas para escolher 462 deputados ao Parlamento nacional. Até a sexta-feira 11, com apenas 20% dos votos apurados, o Partido Democrático Independente-Luta (PDI-L), de Megawati, liderava com 34,9%. O Golkar, que governou o país como virtual partido único durante 32 anos, oscilava entre o segundo e o terceiro lugar com a organização muçulmana moderada Partido do Despertar Nacional. Ambos obtinham entre 16% e 20%. A exasperante lentidão das apurações provocou temores de fraude e protestos de estudantes na sexta-feira 11. "Devemos curvar a cabeça em agradecimento e humildade, evitando todas as formas de arrogância", contemporizou Megawati.

A eleição do novo presidente, contudo, está apenas no início. Pelas regras do intrincado sistema eleitoral indonésio, os 462 deputados nacionais deverão juntar-se a 38 militares apontados pelo governo, mais 200 representantes indicados – 135 pelas 27 assembléias provinciais e 65 por associações de minorias religiosas e étnicas, acadêmicos e artistas. Esses 700 delegados constituirão a chamada Assembléia Consultiva do Povo, que em novembro elegerá o novo presidente indonésio. Além de Megawati, cobiçam o posto ocupado por três décadas por Suharto o atual presidente, B. J. Habibie, e os líderes muçulmanos moderados Amien Rais e Abdurrhaman Wahid.

Seja quem for o novo presidente, ele vai ter pela frente o desafio de descascar um imenso abacaxi. A crise financeira que atingiu a Ásia em 1997 bateu em cheio na Indonésia, acabou derrubando a ditadura, mas também mergulhou o país numa devastadora turbulência. O PIB, de US$ 200 bilhões, caiu 13% no ano passado, a rúpia (moeda local) chegou a despencar 70% em relação ao dólar e a inflação bateu em 80% ao ano. Embora o governo do presidente Habibie tenha conseguido estabilizar a moeda e avançar na democratização, o país ainda está longe de conquistar a estabilidade. No plano político, a situação também é nebulosa. Como notou o The New York Times, "não existe ainda fundamento legal para a recente liberdade de imprensa nem garantias de que os prisioneiros políticos libertados não sejam substituídos por outros e nenhuma segurança de que os partidos permanecerão livres". Se Megawati chegar ao trono que foi do pai, certamente precisará de mais sorte que Benazir Bhutto ou Corazón Aquino, que despertaram grande expectativa, mas acabaram frustrando seus compatriotas.