Dois anos depois da "síndrome da vaca louca", um novo espectro vem rondando os produtos agrícolas da Europa: a contaminação de alimentos de origem animal. Há duas semanas, o governo da Bélgica suspendeu temporariamente a venda de frangos e ovos, além de carnes de porco e de vaca porque descobriu que parte desses produtos está contaminada com dioxina, uma substância altamente cancerígena encontrada na gordura utilizada para produção de ração animal. O pânico se instalou feito rastilho de pólvora. Os países da União Européia (UE), EUA e Japão cancelaram a compra de produtos belgas de origem animal, o que incluiu os famosos chocolates. O Brasil também anunciou o embargo aos produtos alimentícios da Bélgica e da Holanda, como lácteos, carnes e derivados e ovos. A Nestlé suspendeu temporariamente a produção de suas fábricas na Bélgica.

Mas o que deixou os europeus mais irritados foi o fato de o governo da Bélgica somente ter comunicado a anomalia à Comissão Européia (CE) em 27 de maio, um mês depois de ter sido diagnosticada. Bruxelas também é acusada de não ter dado informações precisas à CE. Apesar de ter proibido, na segunda-feira 7, a venda de manteiga e produtos com alto teor de gordura animal, a Bélgica resiste em atender às exigências de seus parceiros europeus de manter o veto à venda de carne bovina, suína, lácteos e derivados até que o problema seja resolvido. A CE, que raramente critica decisões de seus membros, já ameaça levar os belgas às barras de um tribunal internacional. "Estamos estarrecidos como a Bélgica vem tratando o problema", afirmou o porta-voz da CE para Agricultura, Gerry Kiely. O escândalo pode provocar a queda do premiê Jean-Luc Dehaene na eleição deste domingo 13.

Até agora, ninguém sabe medir a profundidade da contaminação e suspeita-se que ela possa não estar restrita à Bélgica. O problema começou a ser detectado em fevereiro, quando um criador de Roulers, Norte do país, ficou intrigado com a falta de apetite de seus frangos e com a diminuição da produção de ovos. Os veterinários levantaram a hipótese de uma contaminação provocada por um produto misturado à ração dos frangos, justamente a dioxina. Hoje, o governo estima que 80 mil toneladas de ração potencialmente contaminada foram fornecidas a 1.400 fazendas. Isso significa que metade das granjas, 40% da produção suína e 17% da pecuária foram atingidas. "Mas as autoridades belgas não sabem se a contaminação teve origem numa fábrica de Ghent ou se a dioxina veio de material vendido à fábrica por fornecedores que reaproveitam azeite e gorduras usados em restaurantes", diz o International Herald Tribune.

Já o Brasil, que anda às turras com os países da União Européia justamente por problemas agrícolas, pode se consolar com o fato de que o famoso e fino chocolate belga Godiva vendido no País é produzido numa fábrica americana na Pensilvânia.