A chegada de dois veículos de baixo custo com muita tecnologia agregada mudou, nos últimos 12 meses, a balança da competição entre as montadoras brasileiras no varejo. Ao lançar seu primeiro carro local, a Hyundai passou a ser uma força importante. Já a GM, com o Onix, conseguiu não só driblar a chegada da nova competição como também deixar para trás a Fiat e a Volkswagen na venda em concessionárias.
Em agosto do ano passado, a Hyundai não aparecia sequer no ranking que considera os emplacamentos de carros vendidos no varejo da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave). Hoje, é a quinta montadora brasileira e chegou a passar a Ford durante dois meses. Já a GM, tradicionalmente a terceira colocada, passou a liderar a lista.
Especialistas do setor dizem que a tecnologia foi o fator que pesou para mudar a balança da competição na disputa pelos clientes nas concessionárias. É um raciocínio simples: cresceu mais quem foi mais inovador. A GM empreendeu uma iniciativa ousada: tirou de circulação modelos tradicionais – entre eles Corsa, Zafira e Meriva – e lançou seis novidades só no ano passado. Segundo fontes da montadora, o grande responsável pela "virada" foi mesmo o Onix – hoje o carro líder em vendas da fabricante.
No entanto, todas as montadoras estão atentas à necessidade de inovar. A Volkswagen, a que mais perdeu mercado no varejo nos últimos 12 meses, diz estar prestes a fazer a maior renovação de sua linha. Entre os veículos esperados pelo mercado estão o novo Santana e o novo compacto Up!. Preocupadas em prever o que se passa na cabeça dos consumidores, as montadoras vão muito além das simples pesquisas de mercado. A Fiat já tem até um time de antropólogos para tentar antever as novas aspirações dos clientes.
A Ford também teve de fazer a lição de casa e renovar a linha para sair de uma de suas piores fases nos últimos anos. O antídoto à perda de mercado foi o "rejuvenescimento" do Novo Fiesta, que passou a ser fabricado no Brasil e sofreu um corte considerável de preço. "Acertar no preço é fundamental. O seu carro pode ser ótimo, mas, se o custo-benefício não for atraente, o consumidor não vai comprá-lo", explica o vice-presidente da Ford para a América Latina, Rogelio Goldfarb.
Segundo o executivo, a montadora entendeu que um carro precisa refletir um estilo de vida. A proposta do Fiesta é atrair o público jovem que valoriza tecnologia. O veículo – hoje o líder de vendas da montadora – ajudou a empresa a voltar para o patamar histórico de 10% do mercado brasileiro. Em 2012 e 2013, a participação da empresa nas vendas em concessionárias chegou a ficar na casa de 7% durante alguns meses.
Atender a uma demanda específica do consumidor é essencial para o sucesso de um carro, de acordo com o consultor Paulo Roberto Garbossa, da ADK. Ele diz que o cliente que troca de carro precisa perceber um diferencial claro, que pode estar no design, na tecnologia ou no poder de marca. "A pessoa compra um carro novo para provocar reações. Se o modelo não deixar o vizinho com inveja, de nada adianta trocar o carro."
Rotação
Apesar de a "dança das cadeiras" do mercado ter mostrado a emergência da GM no varejo, é comum que certos lançamentos alterem o ranking de vendas. É por isso que especialistas afirmam que um sucesso só não é suficiente para garantir a posição de uma empresa no longo prazo. Até porque, com o mercado ávido por novidades, todas as montadoras sabem que a janela entre um lançamento e outro precisa ser menor.
Neste sentido, o diretor do Centro de Estudos Automotivos (CEA) e ex-presidente da Ford, Luiz Carlos Mello, afirma que a posição da Hyundai é mais frágil do que a da GM, por exemplo. "A Hyundai tem um só modelo nacional, enquanto a GM renovou a linha toda. Então, se o interesse pelo Onix diminuir, ela pode trabalhar outros veículos", explica o especialista. "A Volks perdeu mercado, mas isso pode mudar com a chegada de novos carros."
A aceleração dos lançamentos é inevitável, segundo o Marcelo Cioffi, sócio da consultoria PwC responsável pelo setor automotivo. Para o consultor, o consumidor está muito mais atento aos movimentos de mercado e especialmente à tecnologia embarcada nos veículos. "Acho que a escolha de um carro vai se assemelhar à da compra de um smartphone: ao poder pagar um pouco mais, o cliente certamente vai exigir cada vez mais diferenciais." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.