A afirmação “não é racismo quando um negro se insurge contra um branco”, feita pela ministra Matilde Ribeiro, da Secretaria Especial de Política e Promoção da Igualdade Racial, não é das mais felizes, especialmente por partir de alguém que tem por mandato promover a igualdade. É importante ressaltar, no entanto, que a ministra disse que estava apenas constatando um fato, e não incitando uma prática.

Ela não está errada ao constatar que o passado da escravidão deixou graves seqüelas na relação entre negros e brancos no Brasil. Eu iria mais longe: o Brasil não apenas tem um passado racista, mas um presente em que a comunidade negra está submetida cotidianamente às mais variadas formas de humilhação, preconceito e discriminação. O processo de reconhecimento de nosso racismo não se dá sem tensão; daí a reação histérica de muitos em relação às políticas de ação afirmativa e outras medidas de construção de igualdade.

Dizer, no entanto, que o racismo tem apenas uma mão, ou seja, de que apenas a maioria pode ser racista em relação a grupos minoritários não me parece muito sensato, além de pouco producente para pavimentar a construção de uma sociedade pluralista. De acordo com a Convenção da ONU Contra a Discriminação Racial, de 1965, discriminar significa toda e qualquer distinção, exclusão ou restrição baseada na raça, cor, ou origem que tenha por objetivo ou resultado anular ou restringir o pleno gozo dos direitos humanos. Nesse sentido, a discriminação racial não tem cor. Tanto um branco pode discriminar um negro quanto um negro pode discriminar um branco. Basta que o ato preconceituoso redunde numa restrição de direitos.

Devemos tomar cuidado para não cair na tentação de jogar para baixo do tapete nossos reais desafios em face de uma frase desastrada da ministra.

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