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Queridos leitores, a partir de hoje este blog muda seu enfoque: sai o futebol, entra o automóvel. Uma mudança radical, mas natural, considerando que assumi novas funções na Editora Três, trocando o aplicativo Istoé Na Copa pela revista Motor Show. Vou tentar trazer aqui histórias de bastidores e novidades do mundo dos automóveis.

Faz uns 22 anos que frequento os grandes lançamentos nacionais e mundiais da indústria automobilística, bem como os principais salões do setor, que acontecem em Frankfurt, Paris e Genebra. Por causa desse estreito contato com as novidades do mundo dos carros, muita gente enxerga o jornalista especializado em automóveis como um privilegiado, que tem a chance de dirigir os melhores modelos, viaja bastante e ainda recebe um salário por isso. É tudo verdade, mas em 90% dos casos é bate-e-volta, com apresentações e test drives junto com fuso horário. Essa atividade também reserva algumas surpresas e momentos de medo ou risco.

No começo de junho estive representando a Motor Show no lançamento mundial do novíssimo Range Rover Sport, da divisão de alto luxo da Land Rover. O evento aconteceu na região de Chelterham, uma cidadezinha que fica a duas horas de carro de Londres e está na divisa com o País de Gales. Eu já havia participado de um evento da Land Rover no Reino Unido e sabia que uma das maiores dificuldades seria dirigir na mão inglesa. Parece fácil, mas só quando você senta do lado direito do carro, tendo a alavanca de câmbio em sua mão esquerda, e passa a dirigir do lado esquerdo da pista é que você tem a noção do perigo. Como da outra vez, a Land Rover preparou um roteiro passando pelas estradas mais estreitas do Reino Unido. Durante o briefing, eles repetiram umas quatro vezes: “Keep left!” (mantenha-se à esquerda!).

Mesmo para quem já passou por essa experiência, nunca é fácil manter-se do lado esquerdo da pista, estando do lado direito de um carro com mais de 4 metros de comprimento, alto e com uns 2 metros de largura (contando os espelhos). A situação piora muito nas conversões. Ao virar para a esquerda, você tem a nítida sensação de ter entrado na contramão. Pior ainda é virar para a direita, pois a curva deve ser bem aberta e muitos motoristas simplesmente passam a dirigir do lado direito da pista. Isso aconteceu comigo no lançamento do Range Rover Evoque, em 2011, até que percebi o erro, levei um susto e corrigi. Felizmente não vinha nenhum carro em direção contrária à minha. A coisa é tão tensa que nos primeiros minutos você nem pensa em avaliar qualquer coisa do carro — sua única preocupação é ficar do lado esquerdo (“keep left!”) e se manter vivo.

Mas desta vez a Land Rover foi muito além. Se a estradas estreitas (em alguns trechos mal cabiam dois carros), sem acostamento e com muros de pedras prontos para ralar a pintura do carrão já não fossem suficientes, o roteiro ainda incluiu descer morros fora da estrada em inclinação assustadora, dirigir dentro do leito de um rio (não era só atravessá-lo) e subir e descer duas vezes em um Boeing 747 cargueiro com seus mais de 20 metros de altura num aeroporto. Tudo isso porque a Land Rover queria mostrar que o sistema Terrain Response 2, que equipa o novo Rang Rover Sport, é capaz de superar os mais difíceis obstáculos. 

Dentro do rio, o carro aceita até 85 cm de profundidade e tem um sensor instalado nos retrovisores para indicar a profundidade das rodas dianteiras, como se fosse um barco. Até aí tudo bem, mesmo com água quase na altura do vidro. Já a descida de montanha num bosque, com árvores ameaçadoras a cada 3 ou 4 metros de distância, teve de ser feita sem pisar no freio! Isso mesmo: você tem que acelerar, depois tirar o pé dos pedais e simplesmente esquecer que o feio existe para despencar lá de cima — então um sistema controla a tração e velocidade do carro para que ele faça tudo sozinho, devagar e de forma segura. “Nunca dirigi no leito de um rio, dessa vez os caras foram longe”, pensei comigo.

Mas havia mais. Num determinado momento, passamos dentro de uma área de treinamento do glorioso English Army. “Não saiam da pista sinalizada de maneira nenhuma e não parem para tirar fotos, pois o Exército está em treinamento”, disse um funcionário da Land Rover. Diante de minha cara de espanto, ele disse, britanicamente, que não havia motivo para preocupação porque “os pneus são à prova de bala”. Deu tudo certo. Mas medo mesmo eu passei quando nos colocaram para subir uma rampa estreita e inclinadíssima para dentro de um Jumbo cargueiro estacionado no aeroporto de Kemble. Confesso que tive de ligar uma tomadinha antipânico para fazer essa prova. Se a subida foi perigosa (não dava para ver nada, a não ser o chão lá embaixo e o dedo de um inglês orientando a direção que as rodas deveriam seguir), ainda houve um off-road dentro do avião, uma subida à corcova do Jumbo, uma visita de carro à cabine de comando e uma descida pelo nariz. Depois, mais uma vez tive de subir dentro do avião de 20 metros de altura, atravessá-lo e, aí sim, muito assustador, descer numa rampa inclinada a 45 graus, sem pisar no freio, claro.

Esse carro que faz tudo e mais um pouco chega ao Brasil em novembro. Agora, quer tomar um susto de verdade? A versão mais potente, equipada com um motorzão V8 de 5,0 litros e 510 cavalos, deve custar uns R$ 480.000. A reportagem completinha e as fotos de tudo isso estão nas páginas de Motor Show deste mês.