A natureza domada pela civilização, e substituída pelo artifício, sempre esteve no espectro de visão da artista paulista Lia Chaia. Em seus trabalhos de escultura, instalação, vídeo, fotografia ou performance, ela frequentemente se refere a elementos naturais que perdem sua organicidade ou a corpos biológicos em desequilíbrio ou mutação. A artista se refere a esse estado de incerteza entre natureza e artifício como um “Contratempo”, termo que intitula sua nova individual na Galeria Vermelho, em São Paulo.

Com a ideia de mutação da matéria, a artista realizou, dez anos atrás, a foto-performance “Folhíngua” (2003), em que sua língua era convertida em folha verde de árvore. Nesta exposição, Lia volta ao tema na série de fotografias “Quadrada” (2013), em que as folhas perdem seus contornos naturais ovalados e ganham formas angulares, quadradas e retangulares. “A natureza continua viva, mas sob nova formatação, indicando o distanciamento da natureza original e a presença de uma outra natureza, bem mais próxima da forma gerada pela crescente racionalização”, sugere Miguel Chaia em texto crítico. 

ARTES-04-IE-2281.jpg
SEGUNDA NATUREZA
"Mulher Seiva" e "Quadrada" são trabalhos
que simulam mutações genéticas

ARTES-03-IE-2281.jpg

Ainda sob a ótica da mutação genética, em “Mulher Seiva” (2013) a artista desenha a silhueta de um corpo feminino a partir de fitas verdes recortadas em forma do arabesco do símbolo do infinito. O resultado é uma imagem que remete tanto à cadeia de moléculas de DNA quanto a uma trepadeira de plantas. Com essa imagem híbrida entre vegetal e humano, Lia nos transporta às Lianas, aos mitos e aos monstros das pesquisas da artista modernista Maria Martins, atualmente em retrospectiva no MAM SP.

Diferentemente de sua precursora, no entanto, Lia guarda com a natureza uma relação de ordem biopolítica. Vivendo em uma cidade como
São Paulo em pleno terceiro milênio, a jovem artista vivencia e transporta para seu trabalho uma natureza que está longe de seu estado “original”, como aquele encontrado por Maria Martins na Amazônia e em seus mitos ancestrais. Assim, ainda segundo Miguel Chaia, Lia tem como matéria de trabalho uma “segunda natureza”, já impactada pela civilização urbana.

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

Nesta exposição, isso se traduz em trabalhos fortes e impactantes como “Alambrado” (2013), escultura feita de carpete recortado naforma das telas protetoras de arame, ou “A Queda”, em que folhas secas ganham a cor cinza do asfalto, ao serem esculpidas em carpete. 


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias