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Depois de invadir letras de música, programas de tevê e até livros didáticos, o palavrão rompeu a última fronteira e foi parar no meio do discurso presidencial. Definido por muito tempo como palavra de baixo calão, esse tipo de vocábulo parece estar com seu status em transição. A “merda” dita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva causou polêmica, mas no ambiente familiar as repreensões pelos termos chulos são cada vez mais raras e os termos vão se incorporando à conversa cotidiana. “A sociedade mudou e com o tempo o palavrão perdeu seu efeito, o tabu linguístico está muito enfraquecido”, admite o linguista Mário Alberto Perini, da Universidade Federal de Minas Gerais. É preciso, no entanto, cuidado com essas expressões: o palavrão não é totalmente repelido, mas está longe de ser completamente aceito. “O ideal é não usar, mas em alguns poucos casos admite-se a exceção”, diz Maria Aparecida Araújo, especialista em etiqueta.

Em que momento, então, se pode encaixar uma palavra assim no meio da conversa? Quando o uso é desaconselhado? As regras estão sendo criadas no dia a dia. Para a especialista em boas maneiras, as ocasiões em que há licença para soltar o verbo são muito poucas. “Pode ser admitido em situações íntimas de um casal ou numa roda de conversa em que haja apenas velhos amigos”, explica Maria Aparecida. Ela destaca também o ambiente onde nunca se deve usar linguagem pesada: o trabalho. O linguista tem um ponto de vista mais liberal. “Os palavrões de conotação sexual ou escatológica são aceitos. O problema é o uso como ofensa”, diz Perini. Autor do livro “Dicionarinho do Palavrão e Correlatos”, Glauco Mattoso concorda que muitos termos cabeludos perderam a característica de pornografia. “Isso tem acontecido através dos tempos. Ninguém mais lembra que a palavra ‘coitado’ tem a ver com coito,ou que ‘enfezado’ é relativo a fezes”, diz ele. Mattoso, no entanto, não acredita que chegará o dia em que o conceito de palavrão vai sumir completamente.
Mas alguns artistas testam esses limites. Com letras repletas de palavrões, a banda punk paulista Trovadores de Bordel se dedica a questionar a “hipocrisia verbal”, como classifica o líder, Cezar “Geleia” Vaz: “Nosso objetivo é sermos presos, mas não estamos conseguindo.” Sinal dos tempos.


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