"Quero brincar no comportador”, exige a pequena Larissa, de três anos, quando se cansa de assistir aos desenhos animados na televisão. O “comportador” ao qual a menina se refere não é nenhum PC, mas um aparelho que permite conectar-se à internet usando a televisão e a linha telefônica. Com ajuda de um teclado sem fio, a criança visita sites de personagens infantis e, com auxílio dos pais, troca mensagens com o avô, que mora no bairro vizinho, na zona leste de São Paulo.
Seu pai, o bancário Amauri Paulo de Souza, controla confortavelmente a conta corrente sentado no sofá da sala, em frente à tevê de 20 polegadas. Síndico do prédio onde mora, ele recebe por e-mail as reclamações e sugestões dos outros moradores. A professora Simone, mãe da menina Larissa, é craque em garimpar receitas culinárias na rede. “O maior benefício de um computador para mim seria o acesso à internet. Só”, afirma Souza. Por isso, em vez de torrar R$ 1,8 mil num bom computador, ele pagou R$ 400 por um aparelho My Web. “Estou bastante satisfeito”, conta, aparentemente sem se importar com o fato de o aparelho não ter disco rígido para armazenar documentos e a qualidade da imagem ser pior do que num monitor de computador.
Assim como a família Souza, outros milhões de brasileiros – 70% da população, segundo o Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope) – não possuem computador em casa, nem no trabalho. Entre outros motivos, pelo alto custo dos equipamentos de informática. Algumas pessoas já descobriram rotas alternativas para entrar no mundo virtual. Além dos cibercafés, bares que cobram uma taxa para permitir que os clientes usem seus computadores ligados à internet, há saídas mais econômicas, como os quiosques gratuitos das agências dos Correios.

“Nossa meta é popularizar a internet”, diz o presidente da My Web, o venezuelano Fernando Mendez, que atende aos moradores de São Paulo e do Rio e espera vender 350 mil aparelhos até o final do ano. Em outubro, a empresa deve ampliar seu leque para Belo Horizonte, Campinas, Salvador e Brasília. Moradores de outras cidades podem optar pelo Easybox, aparelho semelhante da Daewoo, que custa R$ 500. Basta conectá-lo à tevê e ao telefone e contratar um provedor de acesso à rede, de preferência, um gratuito.

Com 12 lojas espalhadas por São Paulo, Sorocaba, Campinas, Manaus e Maringá, a empresa Net Corner oferece acesso à internet em alta velocidade. Os primeiros 15 minutos são gratuitos. Depois, paga-se R$ 2 para os 15 minutos excedentes, com direito a orientação de especialistas, que além de dar dicas, também incentivam os internautas a comprar nas empresas parceiras da rede de lojas. “Nosso público é a pessoa que não tem PC, mas pode comprar livros, CDs, perfumes e outras coisas pela internet”, diz Raphael Ades, dono da Net Corner. Até o final de 2001, ele pretende abrir 200 lojas no Brasil todo. “Queremos atingir a base da pirâmide social”, diz Ades.

Peregrinação – O vendedor de autopeças Hélio de Carvalho Oliveira perdeu o emprego em sua área há um ano e meio e atualmente trabalha na área de telemarketing para sustentar os três filhos. Todos os dias ele cumpre uma peregrinação por várias agências dos Correios para usar a internet de graça. Cada pessoa pode ficar plugada durante 15 minutos. Depois, deve voltar ao fim da fila. Quando a espera é grande, Oliveira anda até a agência mais próxima. Ele já enviou diversos currículos a empresas de autopeças e acompanha a oferta de empregos em nove agências virtuais. “Computador no Brasil ainda é inacessível”, reclama Oliveira. Há 100 agências dos Correios no Rio e em São Paulo que oferecem esse serviço, que deverá ser cobrado a partir de outubro.

“A tendência é expandir o uso da tecnologia entre as classes sociais mais baixas”, diz Antonio Ricardo Alves Ferreira, diretor do Ibope. De acordo com Ferreira, a classe média baixa, ou classe C, representa 33% da população, mas apenas 6% são internautas. Esse potencial de crescimento faz brotar novidades. O provedor de acesso Terra, por exemplo, deve lançar até o final do ano um serviço pelo qual o usuário liga para uma central telefônica e pede ao operador para ler seus e-mails ou ditar mensagens que serão enviadas em seguida. Paga-se R$ 0,44 por minuto, mas o serviço ainda está em testes e funciona apenas em Campinas, no interior de São Paulo. É questão de tempo até que outros serviços como esse estejam acessíveis aos brasileiros internautas que, por razões diversas, não possuem um computador.

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