A nomeação, nos próximos dias, do novo presidente da Eletronuclear está gerando inquietações tanto na área civil quanto na militar. As especulações agitam a comunidade científica e órgãos de inteligência do governo. O grande temor é que o setor, até hoje imune aos escândalos, venha a se transformar numa nova área de influência política, já que o País se encontra à beira de um racionamento de energia elétrica. As usinas nucleares Angra 1 e Angra 2 têm sido fundamentais para minimizar os riscos de desabastecimento. Angra 1 tem gerado 450 megawatts (MW), em média, nos últimos 12 meses. Angra 2 já produziu em testes mais do que Angra 1, neste mesmo período: 1.300 MW em seis meses.

A disputa acirrada pelo controle da Eletronuclear se deve à possibilidade de o governo resolver incrementar o uso de energia nuclear para pôr fim à crise energética. A Eletronuclear é a estatal responsável pela conclusão de Angra 3. A empresa encontra-se acéfala desde meados do ano passado, quando foi demitido seu presidente, o engenheiro Ronaldo Fabrício. Ele foi tirado do cargo pelo então ministro das Minas e Energia Rodolfo Tourinho. O ex-ministro era integrante do grupo político do senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA). Foi ele que incumbiu o então presidente da Eletrobrás, Firmino Sampaio Neto, de acumular também a presidência da Eletronuclear. A decisão de Tourinho teve como objetivo controlar a crescente importância da geração nuclear e, ao mesmo tempo, negociar o pacote financeiro de conclusão de Angra 3. Este pacote – um contrato sem licitação no valor de US$ 1,7 bilhão – envolveria necessariamente a Construtora Andrade Gutierrez e a empresa franco-germânica Framatome/ANP. Com 60% de capital francês e 40% de capital alemão, a ANP adquiriu no ano passado a empresa KWU, a ex-divisão nuclear da multinacional Siemens, que detém a tecnologia da usina Angra 3, irmã gêmea de Angra 2. Todo o negócio, segundo especialistas, adquire uma dimensão especial pelo fato de Angra 2 estar sinalizando, com seu desempenho espetacular (1.300 MW), que a saída para a crise energética pode ser nuclear.

Com as demissões de Tourinho e Sampaio Neto, motivadas pela crise política entre ACM e FHC, encontra-se vaga a presidência da Eletronuclear e, por consequência, o controle sobre o modelo e a negociação de Angra 3. Os principais candidatos ao cargo são os engenheiros Aniello Puziello e Flávio Deccachi de Moura e o físico Luiz Hiroshi Sakamoto. Puziello foi diretor de Furnas durante o governo Collor. Ele trabalhou na antiga Nuclebrás e é conhecido por suas estreitas ligações com a empreiteira Andrade Gutierrez. Sua indicação à diretoria de Furnas, em 1990, foi obra do então secretário de Transportes do Ministério da Infra-estrutura Marcelo Ribeiro. Ribeiro foi demitido ainda no governo Collor por propor um megacontrato de US$ 500 milhões para recuperação das rodovias, sem licitação. Flávio Moura é engenheiro da área de operação de Furnas, com passagem pela Eletrosul. Sakamoto, considerado o mais qualificado, é um técnico oriundo da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e ocupa hoje uma das principais assessorias do ministro do Planejamento, Martus Tavares.