17/07/2013 - 15:43
O papa Francisco começa na próxima semana sua primeira viagem internacional como pontífice à América Latina, uma região esquecida nos últimos anos pela hierarquia da Igreja Católica e que agora enfrenta o desafio histórico de mudar a face do Vaticano e oxigenar seu governo central, a Cúria Romana.
A eleição de um Papa latino-americano, austero e muito próximo dos pobres e excluídos, não apenas gerou muita expectativa nas comunidades católicas da América Latina, ao satisfazer um desejo da maioria dos católicos do mundo (a região representa mais de 40% dos fiéis), como também é considerada um momento único para reformar as estruturas internas da Igreja, marcada por escândalos de corrupção, disputas de poder e falta de transparência.
Para dar um novo rosto à Igreja, Francisco nomeou um grupo de oito cardeais, coordenados pelo hondurenho Oscar Andrés Rodríguez.
"Com o passar do tempo, foi se formando um reino na Cúria e tudo isto que não se fala no mundo de hoje", reconheceu o cardeal, em uma entrevista à imprensa em que admite que há muita burocracia e diz que Francisco "não vai ceder às pressões e à falta de transparência" dentro da controversa estrutura do Vaticano.
"Se há coisas que não estão bem, vamos corrigi-las", assegurou Rodríguez Maradiaga, que iniciará em outubro a coordenação das primeiras reuniões sobre a reforma. A eleição em março do papa argentino, uma inédita abertura do Vaticano para a igreja do outro lado do mundo, conseguida com o surpreendente apoio da maioria dos cardeais europeus, foi o primeiro passo para tentar mudar as estruturas e a mentalidade da Cúria.
"Há algo que não funciona na Cúria. O cargo de secretário de Estado já não faz sentido", defende o cardeal alemão Walter Kasper, encarregado por anos pela promoção da unidade dos cristãos do Vaticano, que pediu a Francisco para realizar, sobretudo, uma "mudança de mentalidade", com mais comunicação interna e menos formalismo.
Embora seja verdade que Francisco tenha mudado a forma de ser papa, ele não mexerá nas questões mais polêmicas para a sociedade: nem vai liberar os sacerdotes do celibato, nem autorizará a ordenação das mulheres, nem acatará tudo o que os progressistas pedem", afirmou Kasper em uma longa entrevista ao jornal italiano Il Foglio.
Deixar uma marca latino-americana, inclusive nas estruturas internas, será uma tarefa delicada e difícil.
O teólogo brasileiro Leonardo Boff, representante da Teologia da Libertação, combatida pelo Vaticano na década de 80, também se disse otimista em várias ocasiões, diante dos primeiros gestos de humildade de Francisco, assim como por sua sensibilidade para com os pobres.
"A opção preferencial pelos pobres é uma das características que marcam a fisionomia da Igreja latino-americana e caribenha", sustenta o documento de Aparecida de 2007, cujo redator foi justamente o cardeal Jorge Bergoglio, o atual pontífice.
Tudo parece indicar que Francisco respeitará esse compromisso, já que renunciou aos luxos do palácio apostólico, abriu mão dos valores mundanos e da imprensa, conduzindo uma vida austera e simples.
Nos próximos meses, o novo pontífice deverá "primeiro reformar a estrutura para depois passar para a doutrina", esclarece Rodríguez Maradiaga, que considera que o controverso Banco do Vaticano deve atuar como uma fundação, e não como uma instituição na qual se escondem capitais, outro assunto espinhoso para o atual pontificado.