O câncer de mama não está só no alvo da moda. Mas na mira da ciência mundial também. Essa é a conclusão que se tira do 35º encontro anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (Asco), o mais importante evento da oncologia clínica mundial, realizado nos Estados Unidos na semana passada. Quase 2,5 mil trabalhos foram apresentados. Mais de 600 eram dedicados ao câncer de mama. Tanto interesse deve-se à incidência deste tipo de tumor. Nos EUA são cerca de 180 mil diagnósticos por ano. No Brasil, ele é o campeão entre as mulheres. A estimativa de novos casos para 1999 é de 31,2 mil.

O grande destaque do congresso foram cinco trabalhos (dois americanos, um da África do Sul, um da França e outro da Suécia) que apresentaram comparações entre a estratégia de ministrar altas doses de quimioterapia, associada aos transplantes de medula óssea (estrutura responsável pela produção das células de defesa do sangue), e a tática de usar doses convencionais de quimioterapia no tratamento do câncer de mama. O transplante é uma maneira de se dar altas doses de quimioterapia (drogas que matam o tumor) ao paciente. Antes do bombardeio químico, as células da medula são retiradas e ficam como uma reserva estratégica, que será usada depois do tratamento para produzir novas células de defesa. "Nossas esperanças eram de que o tratamento mais agressivo provasse ser melhor do que o convencional", diz Richard Klausner, diretor do Instituto Nacional do Câncer dos EUA.

No entanto, os resultados não comprovaram de forma categórica essas esperanças. Dos cinco estudos, apenas um, realizado na Universidade de Witwatersrand, na África do Sul, demonstrou a superioridade das altas doses de quimioterapia. Depois de cinco anos de acompanhamento das 154 pacientes que participaram da pesquisa, a taxa de mortalidade entre as 75 tratadas com altas doses ficou em 17%. Entre as 79 que receberam quantidades normais, a taxa foi de 35%. O estudo francês, feito com 61 mulheres no Hospital Tenon, em Paris, comprovou que o tumor demora mais para reincidir no ataque mais agressivo. Passados três anos do tratamento, a taxa de reincidência nesta modalidade ficou em 50,8%, contrastando com 79,3% nas doses convencionais. Mas, depois de cinco anos de tratamento, os números de reincidência foram quase idênticos: 90,7% para as altas doses e 90,8% para as normais. Já os outros três trabalhos concluíram que, em termos de sobrevivência, os dois tipos de tratamento são equivalentes.

São muitos, no entanto, os esforços para descobrir novas saídas para o problema. Uma delas, por exemplo, parece ser o remédio Taxotere, fabricado pela Rhodia Farma. A droga acaba de ter sua eficácia comprovada numa pesquisa desenvolvida no Cross Cancer Institute, no Canadá, por Jean-Marc Nabholtz. Em seu estudo, feito com 429 mulheres, Nabholtz comparou o uso do Taxotere associado a dois remédios do grupo das chamadas antraciclinas, tidas como padrão nos tratamentos de câncer de mama. O objetivo era verificar se a troca de uma delas por Taxotere traria melhores resultados nos casos nos quais o tumor se espalhou para outros órgãos. E trouxe. A taxa de resposta (redução parcial ou eliminação do tumor) foi de 60%. No tratamento feito só com as antraciclinas, o índice foi de 47%.

Outro medicamento bem-sucedido, quando associado a drogas quimioterápicas, é a Herceptina, um tipo de anticorpo que bloqueia o gene HER-2, responsável por 30% dos casos de câncer de mama. Novos estudos realizados por Larry Norton, do Sloan-Kettering Cancer Center, indicam que a associação da Herceptina com a quimioterapia reduz em 24% a taxa de mortalidade por câncer de mama disseminado para outros órgãos. Como se vê, ainda não há uma única e milagrosa solução para combater o câncer de mama. Mas os avanços da medicina, combinados com a prevenção e a detecção precoce, contribuem muito para que se acerte o tiro de misericórdia direto no alvo.

 

Homens na mira

Três estudos apresentados no encontro da Asco poderão ser úteis no combate ao câncer de próstata, mal que atinge 15 mil brasileiros anualmente. Um deles ajudará na detecção precoce do problema. Trata-se de um teste capaz de identificar na próstata lesões pré-cancerígenas conhecidas por PIN (neoplasia intra-epitelial da próstata). Uma alta concentração de PIN significa ter mais chances de desenvolver a doença. Quanto antes as lesões forem detectadas, maiores serão as chances de cura.

Outras pesquisas vão direto ao material genético. Uma, realizada na Inglaterra, usa a imunoterapia para atacar o gene HER-2, envolvido nos tumores de próstata. Foi ministrado aos pacientes um anticorpo inibidor do HER-2 e uma droga que estimula a produção de células de defesa. Os resultados são animadores: em sete, de 20 pacientes, o câncer desapareceu. Em outros seis, o nível de PSA – um indicador da força do tumor – caiu entre 25% e 50%. A outra técnica, criada no M.D. Anderson Cancer Center, é engenhosa. Por meio de um vírus modificado, é reposto o gene p53 na próstata. Uma das funções do p53 é induzir células danificadas à morte. Ao introduzir genes p53 normais no DNA da célula tumoral, o experimento fez com que, entre os 26 pacientes estudados, três tivessem o tumor reduzido em mais de 25%.