O delegado da Polícia Federal Gilberto Aparecido Américo, 49 anos, é um homem que em seus 23 anos de serviço fez muitos inimigos. Entre as polêmicas estão os pedidos de prisão temporária do prefeito Celso Pitta e de seu padrinho Paulo Maluf. O delegado também enfrentou a máfia chinesa que domina o contrabando em São Paulo e desmontou esquemas de corrupção quando chefiava a Delegacia de Combate ao Crime Organizado e Inquéritos Especiais (Delecoie). "Ele contrariou interesses na Polícia Federal e poderia ter o mesmo fim do delegado Alcioni Santana, assassinado por ordem de um colega no ano passado", disse um delegado. Mas um episódio mudaria a vida de Gilberto.

 

Falência Ele foi preso no dia 27 de abril por ordem do juiz Ali Masloun, da 7ª Vara Criminal Federal de São Paulo, acusado de adulterar informações de um notebook do doleiro Renato Esteves de Alencar Arraes. Em poder do golpista, preso por Gilberto há oito meses, foi apreendido um notebook, onde constavam os nomes de 1.600 pessoas e empresas, incluídos aí os nomes de Masloun e de Cristine Santini Muriel, juíza da área de falências. Coincidências: a juíza havia decretado a falência da empresa de Arraes e Masloun condenou o doleiro a um ano e meio de prisão.

O juiz acredita que seu nome e o da colega foram inseridos na memória após a apreensão do computador, com o objetivo de constrangê-lo. Arraes jurou ao juiz que não foi ele. Aproveitou para dizer que estava sendo vítima de extorsão por federais, mas não acusou diretamente o delegado Gilberto. A trama ganhou força quando Masloun convocou o doleiro e agente de turismo Antônio Claramunt, dono da agência Barcelona Tour, para depor. É que o nome Claramunt, conhecido como "Toninho da Barcelona", aparece nos canhotos dos cheques de Arraes. Na presença do juiz, o doleiro acusou Gilberto e outro delegado federal da Interpol de lhe haverem extorquido cerca de US$ 150 mil. Claramunt não apresentou provas e sua denúncia levantou suspeitas, já que havia sido indiciado por Gilberto, em janeiro de 1998, por evasão de divisas.

Mesmo assim o juiz decretou a prisão do delegado. Juristas ouvidos por ISTOÉ consideram a decisão polêmica, já que o magistrado, passando à condição de vítima, deveria ter se declarado incompetente para continuar julgando a causa. O juiz refuta este argumento, afirmando que em momento algum se sentiu vítima. O delegado acabou sendo libertado três dias depois por um habeas-corpus. Apesar da vaga acusação de extorsão por parte de Claramunt, Masloun convenceu-se de que houve adulteração dos arquivos do notebook porque Gilberto levara o aparelho para sua casa. O delegado se defende, dizendo que levou o computador com o conhecimento de seus superiores.

 

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Arquivos As perícias efetuadas por especialistas do Instituto Nacional de Criminalística e da Universidade de São Paulo atestaram que os nomes dos juízes haviam de fato sido inseridos no notebook antes da sua apreensão pela PF. Um dos laudos, elaborado por peritos da USP, confirma, no entanto, que houve alteração dos dados do notebook em data posterior a sua apreensão. Esse fato também teria levado o juiz a decretar a prisão do delegado, mas a questão foi dirimida pelos próprios especialistas do INC. Segundo eles, para terem acesso aos arquivos de Arraes foi necessário criar outros arquivos na memória da máquina. Cada um desses novos arquivos recebeu o nome dos peritos que efetuaram a manipulação. Os próprios peritos da USP concordaram que nada de importante foi alterado. O delegado ainda corre o risco de ser preso de novo, pois em breve a Justiça Federal deverá julgar o mérito do habeas-corpus. De qualquer forma, Gilberto não volta mais à PF. Desgostoso, ele decidiu pedir a sua aposentadoria prematuramente.


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