Assista a uma entrevista com a autora Lily Koppel:

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Da noite para o dia, as mulheres dos astronautas que viveram o auge do programa espacial americano, entre 1958 e 1972, viram suas vidas mudarem drasticamente. Dormiram no anonimato e acordaram como celebridades que ditavam tendências de moda e decoração, frequentavam as festas mais glamorosas da época e eram convidadas para o chá da tarde na Casa Branca com a primeira-dama Jacqueline Kennedy. Por mais de uma década, essas mulheres de vestidos Pucci, lábios vermelhos e sorriso de aeromoça representaram a imagem da perfeição e do ideal feminino da época. Semana após semana, estampavam a capa da revista “Life”, mas pouco se sabia o que se passava nos bastidores. O livro “The Astronauts Wives Club” (“O Clube das Mulheres dos Astronautas”, Grand Central Publishing), recém-lançado nos Estados Unidos, mergulha nesse universo pouco explorado. A autora Lily Koppel revela os momentos de medo, pressão e solidão que essas mulheres tiveram de suportar. “A história dos astronautas e seus feitos já foi contada milhares de vezes. Eu sempre quis contar a história dessas mulheres fortes que o tempo todo deram apoio aos seus maridos. Sem elas, talvez o homem nunca tivesse chegado à lua”, disse Lily à ISTOÉ.

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CLUBE MERCURY
As sete na capa da revista americana -Life-, em 1959. Elas eram retratadas
como as esposas perfeitas, mas o livro "The Astronaut Wives Club",
de Lily Koppel (abaixo), conta como essa imagem era irreal

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As personagens centrais da obra são as sete esposas dos astronautas do Projeto Mercury, que deu início ao programa espacial americano. Enquanto eles embarcaram no sonho de chegar à lua e se tornar heróis, mulheres e filhos ficaram em casa. Sem apoio do governo ou da Nasa (a agência espacial americana), nutriam o medo de que o pior acontecesse aos seus maridos e conviviam com a presença massacrante da imprensa. Para suportar essa situação, decidiram se apoiar umas nas outras. Foi assim que criaram o clube Mercury, em um subúrbio de Houston, onde viviam todas as famílias dos astronautas. A reunião representava um dos raros momentos em que elas podiam conversar a sós e dividir as suas angústias, mas também era um espaço de muita inveja, competitividade e segredos. A começar pela própria fundadora do clube, Marge Slayton, mulher de Deke Slayton, que, enquanto coordenava as atividades do grupo, fazia um tremendo esforço para esconder de todos um casamento anterior que colocaria a perder sua imagem de esposa perfeita.

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Segundo a autora, lidar com a imprensa era um dos maiores desafios. Os repórteres da “Life” ficavam 24 horas por dia colados nelas, ansiosos por notícias. A publicação ainda contava com um ghostwriter que escrevia artigos como se fossem as próprias. “Elas eram obrigadas pelo governo e pelos maridos, que recebiam uma quantia generosa da publicação, a expor as suas vidas”, conta a autora Lily. “Além de viverem de aparência, elas começaram a ter problemas para encarar a realidade. A vida que aparecia nas revistas era muito mais interessante, então elas passaram a desejar, a todo custo, que a ilusão se tornasse realidade.”

Era difícil passar incólume pelas mudanças radicais que ocorreram. Betty Grisson, mulher de Gus Grissom, é quem melhor ilustra isso. Antes da fama, ela trabalhava 18 horas por dia como telefonista. Depois que o marido foi enviado para o espaço, tornou-se a primeira do grupo a frequentar a Casa Branca. Quanto mais famosa ficava, mais comprava. Quando o marido morreu em uma das missões, ela viu seu sonho desmoronar e se entregou ao alcoolismo. Pior destino teve Pat White, esposa de Ed White. Ela também ficou viúva, mas não suportou a dor e cometeu suicídio.

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FIM DO SONHO
Rene Carpenter (acima) pediu o divórcio e tornou-se feminista.
Já Betty Grissom (à dir.,) virou alcoólatra depois da morte do marido

Heróis nacionais, os maridos desfrutavam de carros, casa nova e até das mulheres conquistadas com a fama e começaram a tratar as esposas com descaso. Muitos foram os rumores de traições, mas elas aceitavam tudo caladas. Cada ato delas era cuidadosamente planejado. Tinham de se exercitar para se manterem magras, os cortes de cabelo e as roupas eram escolhidos pelos editores da revista. “Era uma pressão insuportável para manter o modelo de mulher perfeita e de casamento exemplar”, conta a autora. Tanto que a loira platinada de olhos verdes Rene Carpenter, a preferida do presidente Kennedy e apontada como símbolo de esposa ideal, mal esperou o programa espacial chegar ao fim para pedir o divórcio do marido Scott Carpenter. Ela chegou a ter um programa na tevê americana no qual discutia exatamente o papel da mulher na sociedade, alegando ter vergonha daquela época em que aceitava tudo sem questionar. Poucas famílias resistiram. “Dos 30 casais envolvidos no programa, apenas sete continuaram casados. Mas a amizade entre elas permanece até hoje”, diz Lily.

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